Aos leitores deste humilde diário, àqueles que o acessam de perto ou de longe, aos que nos enviam e-mails, àqueles que permanecem silentes, espalhados por tantos lugares mundo afora, aos colaboradores e a todos que compartilham conosco alguns momentos da vida e da arte, nossos votos de um ano de 2015 de muita saúde, paz, felicidade, solidariedade, sabedoria e amor!
quarta-feira, 31 de dezembro de 2014
UMA IMAGEM DO ANO
Cumbe, Aracati/CE. Resistência Popular. Padre Júlio, Ronaldo Gonzaga, João do Cumbe, Jocélia Ribeiro, Eliton Meneses, Irmã Alcilene e Irmã Anacleide, além de criança da comunidade. 13.12.2014.
terça-feira, 30 de dezembro de 2014
segunda-feira, 29 de dezembro de 2014
NARDO
Sinto o nardo de esperança
Se achegar em teu jardim,
Despedir atroz lembrança,
Pra zona do mar sem fim.
Céu co' nuvem de bonança
Trovejar qual bandolim;
Veio cheio de mudança
E orquestra de passarim.
Tempo novo, nova dança;
Ninho sobre o benjamim;
Na relva, corre a criança;
Verte o rio a água, enfim.
Com Deus se faz aliança;
Do barro nasce o capim;
Vai-se a era d'esquivança;
Chega o aroma de jasmim.
Eliton Meneses
Despedir atroz lembrança,
Pra zona do mar sem fim.
Trovejar qual bandolim;
Veio cheio de mudança
E orquestra de passarim.
Tempo novo, nova dança;
Ninho sobre o benjamim;
Na relva, corre a criança;
Verte o rio a água, enfim.
Com Deus se faz aliança;
Do barro nasce o capim;
Vai-se a era d'esquivança;
Chega o aroma de jasmim.
Eliton Meneses
quinta-feira, 25 de dezembro de 2014
O ISLÃ PELO ISLÃ
O Islã é uma religião que emancipa a alma humana do culto de qualquer outro deus que não seja Alá;
O Islã é a religião da moderação, que não faz questão de monasticismo ou de celibato, nem de reprimir as paixões;
No Islã não há discriminação, nem distorções na aplicação de suas leis. Todos são iguais;
O Islã aceita o progresso da ciência, para além das crenças e dos cultos. Isso o torna adaptável a todas as épocas e a todos os lugares;
O Islã considera todas as pessoas iguais quanto à origem da criação, seja homem ou mulher, seja branco ou negro;
No Islã, o fiel estabelece uma relação direta com Alá, sem intermediários nem autoridades espirituais humanas. O muçulmano está ligado a seu Senhor por todas as coisas, em quaisquer situações e a todo momento;
O Islã é a religião da clareza. Não há coisas ambíguas nas quais se deve obrigatoriamente ter fé ou as quais não se pode questionar;
O Islã é uma religião que respeita a razão e o pensamento, incentivando a sua utilização em prol do bem da humanidade;
O Islã é uma religião na qual os pecados dos arrependidos são expiados por meio de boas ações, desde que sejam sinceras, qualquer que seja seu número ou sua gravidade;
O Islã respeita as religiões celestes precedentes, recomenda que se tenha fé nelas e que se ame seus mensageiros, sendo considerada como seu prolongamento. Os judeus, por exemplo, não reconhecem Jesus Cristo, e os cristãos não reconhecem o profeta Maomé, enquanto os muçulmanos reconhecem tanto Moisés quanto Jesus;
O Islã é religião de solidariedade social, que encaminha o muçulmano para a compaixão, a sensibilidade e a benevolência para com o outro, da mesma forma que o exorta a oferecer sua ajuda ao próximo;
O Islã estabeleceu o sistema de partilha sucessorial, determinando que cada um dos herdeiros recebessem igualmente o seu quinhão, tanto a criança quanto o adulto, tanto o homem quanto a mulher (...);
(La Clef Pour Comprendre l'Islam, Abdul-Rahman Al-Sheha, pp. 96/97) (Livre tradução)
No Islã, o fiel estabelece uma relação direta com Alá, sem intermediários nem autoridades espirituais humanas. O muçulmano está ligado a seu Senhor por todas as coisas, em quaisquer situações e a todo momento;
O Islã é a religião da clareza. Não há coisas ambíguas nas quais se deve obrigatoriamente ter fé ou as quais não se pode questionar;
O Islã é uma religião que respeita a razão e o pensamento, incentivando a sua utilização em prol do bem da humanidade;
O Islã é uma religião na qual os pecados dos arrependidos são expiados por meio de boas ações, desde que sejam sinceras, qualquer que seja seu número ou sua gravidade;
O Islã respeita as religiões celestes precedentes, recomenda que se tenha fé nelas e que se ame seus mensageiros, sendo considerada como seu prolongamento. Os judeus, por exemplo, não reconhecem Jesus Cristo, e os cristãos não reconhecem o profeta Maomé, enquanto os muçulmanos reconhecem tanto Moisés quanto Jesus;
O Islã é religião de solidariedade social, que encaminha o muçulmano para a compaixão, a sensibilidade e a benevolência para com o outro, da mesma forma que o exorta a oferecer sua ajuda ao próximo;
O Islã estabeleceu o sistema de partilha sucessorial, determinando que cada um dos herdeiros recebessem igualmente o seu quinhão, tanto a criança quanto o adulto, tanto o homem quanto a mulher (...);
(La Clef Pour Comprendre l'Islam, Abdul-Rahman Al-Sheha, pp. 96/97) (Livre tradução)
terça-feira, 23 de dezembro de 2014
ALTOS E BAIXOS
EM ALTA
A exuberância das Cataratas do Iguaçu, uma das maravilhas naturais do planeta. Beleza que faz marejar até as retinas mais fatigadas...
EM BAIXA
A pobreza que desfila a olho nu do outro lado da fronteira. Do lado brasileiro, Foz do Iguaçu não deixa nada a desejar a qualquer cidade do primeiro mundo. Em Ciudad del Leste (Paraguai) e Puerto Iguazú (Argentina), há muita desigualdade social, muito vendedor ambulante e muitas crianças numa luta insistente pela sobrevivência.
EM ALTA
O imenso potencial turístico da tríplice fronteira. As Cataratas do Iguaçu já pagariam a viagem, mas, no mesmo pacote, ainda se pode conhecer a Usina de Itaipu, fazer compras em Ciudad del Leste, comer um bife de chorizo regado a uma Quilmes em Puerto Iguazú, visitar o Parque das Aves, o Vale dos Dinossauros, uma Mesquita Muçulmana, um Templo Budista...
EM BAIXA
A irritante burocracia da Alfândega na fronteira, responsável por filas quilométricas a qualquer hora do dia ou da noite, tanto na Ponte da Amizade (entre o Brasil e o Paraguai), quanto na Ponte da Fraternidade (entre o Brasil e a Argentina).
quinta-feira, 18 de dezembro de 2014
FIM DA GUERRA FRIA
Depois de mais de cinco décadas de embargo, Cuba e Estados Unidos reatam relações diplomáticas, com a colaboração do primeiro presidente americano de origem negra e do primeiro papa latino-americano!
Eis o fim da Guerra Fria, com a vitória do oprimido! Viva la revolución!
Eis o fim da Guerra Fria, com a vitória do oprimido! Viva la revolución!
sexta-feira, 12 de dezembro de 2014
segunda-feira, 8 de dezembro de 2014
CORRIDA
Mudinho, Nonato e Neném saíram cedo de casa para a corrida. Os doze quilômetros da saída de Moraújo para a Matriz de Coreaú não seriam fáceis para atletas amadores, inexperientes e sem treinamento algum. O dia acabara de raiar quando os três amigos se acomodaram no caminhão que carregaria a turma da Palma para as Pedrinhas. Mudinho e Nonato estavam despertos e confiantes; Neném, ainda sonolento e taciturno. O jantar do dia anterior não lhe havia saciado a fome e o café-da-manhã... O café-da-manhã, Neném afirmara que não teve tempo de tomá-lo...
Mudinho, surdo-mudo de nascença, não compreendeu os conselhos dos amigos e, dada a largada, saiu em desabalada carreira, na esperança de que manteria o ritmo no decorrer de todo o percurso. Neném imprimiu um ritmo forte no início da prova e Nonato, menos inexperiente, adotou um trote regular e cauteloso.
A disparada de Mudinho foi tão impressionante que nem os curiosos de bicicleta que seguiam os corredores conseguiram acompanhá-lo. Muitos que o viram ao largar já o deram como vencedor da corrida. Mal sabiam que, antes mesmo de deixar Moraújo, Mudinho seria acometido por uma lancinante dor-de-veado que o obrigou a desistir precocemente da prova. Quando os curiosos o alcançaram, contorcendo-se num banco de praça, não conseguiram conter o riso. Mudinho não aguentara mais do que os primeiros 1.800 metros, mesmo com uma folha de mofumbo no cós do calção...
Neném diminuiu o ritmo, já cansado, depois do primeiro quilômetro e, muito antes da metade da prova, mal conseguia andar. Quando a vista ficou embaçada e as pernas trêmulas, resolveu acocorar-se numa moita na beira da pista e, depois de algum tempo de persistente agonia, quase inconsciente, gritou por socorro:
– Mudinho?!
Neném estava tão fraco que alguns corredores nem escutaram os seus apelos. Somente Nonato, ao passar, deu fé do chamado débil do amigo e correu para acudi-lo.
– O que foi, Neném?!
– É a pilora! Hum...
Depois de uma leve convalescença, Neném seguiu para casa na garupa de uma motocicleta. Nonato também seguiu de carona, mas somente até certa altura do percurso. Com a organização precária do evento, Nonato, na penúltima curva, ultrapassados sem nenhum esforço quase todos os concorrentes, desceu da moto à sorrelfa e, com desembaraço, retomou seu trote confiante, que o conduziu para um festejado e não contestado terceiro lugar no pódio...
domingo, 30 de novembro de 2014
FRASE DO MÊS
"Uma coisa deve ficar clara e ninguém deve se enganar sobre isso. Fui eleita por forças progressistas, não para qualquer processo equivocado, mas para continuar mudando o Brasil." Dilma Rousseff
DESGRAÇA ALHEIA
"Quando cair o teu inimigo, não te alegres, e quando tropeçar, não se regozije o teu coração;" (Provérbios 24:17)
De alguns anos para cá, o maior prazer de muitos torcedores do Ceará é assistir à miséria do Fortaleza e vice-versa. Os alvinegros se conformam com a permanência do Fortaleza na Série C. Os tricolores soltam fogos eufóricos e aliviados pela permanência do Ceará na Série B. A desgraça do outro se tornou o maior prazer de todos, algo mais importante até do que as próprias conquistas, sinal de que as coisas andam muito mal não apenas com o futebol cearense, mas também com o seu torcedor.
Sou Ceará, mas não consigo torcer contra o Fortaleza, sobretudo diante de times de fora. Não quero ver o Leão do Pici amesquinhado, aviltado, desdenhado, rastejando em divisões menores, acostumado a fracassos, cheio de traumas, tratado como time sem história. Ora, além de torcedor do glorioso Vozão, sou cearense e, como torcedor do futebol cearense, quero nossos times como protagonistas no cenário nacional e não como meros figurantes. Quero que nos nivelemos por cima e não por baixo. Não quero ver o Ceará e o Fortaleza sempre sofrendo para permanecer nas Séries B e C. Quero ambos na Série A.
O prazer da desgraça alheia, traduzido no alemão como Schadenfreude, revela aspecto torpe da natureza humana que desde o Velho Testamento se busca reparar, mas que, entre nós, torcedores do futebol cearense, está cada vez mais na moda, lamentavelmente.
Sou Ceará, mas não consigo torcer contra o Fortaleza, sobretudo diante de times de fora. Não quero ver o Leão do Pici amesquinhado, aviltado, desdenhado, rastejando em divisões menores, acostumado a fracassos, cheio de traumas, tratado como time sem história. Ora, além de torcedor do glorioso Vozão, sou cearense e, como torcedor do futebol cearense, quero nossos times como protagonistas no cenário nacional e não como meros figurantes. Quero que nos nivelemos por cima e não por baixo. Não quero ver o Ceará e o Fortaleza sempre sofrendo para permanecer nas Séries B e C. Quero ambos na Série A.
O prazer da desgraça alheia, traduzido no alemão como Schadenfreude, revela aspecto torpe da natureza humana que desde o Velho Testamento se busca reparar, mas que, entre nós, torcedores do futebol cearense, está cada vez mais na moda, lamentavelmente.
quarta-feira, 26 de novembro de 2014
AÇÃO DIRETA CONTRA SERVIDOR PÚBLICO
Quando o cidadão sofre um dano, seja material, moral ou à imagem, praticado por agente público, é muito comum o ajuizamento de ação de indenização fundada na responsabilidade civil objetiva do Estado, que independe da demonstração de dolo ou culpa do agente público, nos termos do art. 37, § 6.º, da Constituição Federal. Nesse caso, a ação é movida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios ou as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços público e basta a demonstração do dano e do nexo causal entre ele e uma ação ou omissão do agente público para se conseguir a indenização.
Depois de condenados, os entes públicos e as empresas prestadoras de serviço público, caso consigam provar o dolo ou a culpa do responsável, podem entrar com ação de regresso contra o responsável pelo dano, o que, na prática, é bastante incomum.
Os danos provocados por ações e omissões de agentes públicos são uma prática infelizmente ainda muito frequente no cotidiano das repartições públicas, em decorrência de prepotências, arbitrariedades, humilhações e constrangimentos, contra o cidadão e contra os agentes subordinados, algo quase sempre encarado com resignação pela nossa cultura pouco afeita a confrontar qualquer "autoridade".
As ações de indenização pelos danos causados por agentes públicos costumam ser propostas somente contra o ente público, o que acaba poupando o agente público e fazendo a indenização perder o seu caráter punitivo. No entanto, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que, no caso de ato ilícito praticado por agente público, é faculdade do autor promover a ação contra o ente público, contra o servidor público ou contra ambos, no livre exercício do direito de ação (REsp 731.746/SE, 4.ª Turma, rel, Min. Luis Felipe Salomão, DJe 04.05.2009).
Caso o elemento subjetivo necessário para a responsabilização do agente público seja facilmente demonstrável (dolo ou culpa), nada obsta, antes se recomenda, que a ação seja movida contra o agente público e contra o Estado, conjuntamente. Talvez assim, depois de responderem a algumas ações judiciais, certos agentes públicos prepotentes recordariam que são mais servidores públicos do que "autoridades".
Caso o elemento subjetivo necessário para a responsabilização do agente público seja facilmente demonstrável (dolo ou culpa), nada obsta, antes se recomenda, que a ação seja movida contra o agente público e contra o Estado, conjuntamente. Talvez assim, depois de responderem a algumas ações judiciais, certos agentes públicos prepotentes recordariam que são mais servidores públicos do que "autoridades".
domingo, 23 de novembro de 2014
quarta-feira, 19 de novembro de 2014
POESIA
A poesia nunca morre.
Ela está em toda parte.
É rio que sempre corre;
A mais fina flor da arte.
É visão que nos acorre;
A mais fina flor da arte.
É visão que nos acorre;
Da cultura, um baluarte;
Uma verve que percorre
Os rincões até de Marte.
É cantador que discorre
Uma estória sem aparte;
É um sopro que socorre
O combalido estandarte.
É aguardente sem porre,
Uma flor no bacamarte;
O remédio a que recorre
Quem se furta do infarte.
Uma verve que percorre
Os rincões até de Marte.
É cantador que discorre
Uma estória sem aparte;
É um sopro que socorre
O combalido estandarte.
É aguardente sem porre,
Uma flor no bacamarte;
O remédio a que recorre
Quem se furta do infarte.
segunda-feira, 17 de novembro de 2014
ALTOS E BAIXOS
EM ALTA
A beleza singular do sertão coreauense, revelada nas lentes sensíveis do poeta e fotógrafo, filho da terra, Mardone França.
EM BAIXA
Nos tempos da velha barragem, a água represada na altura da cidade de Coreaú resistia durante os longos meses de estiagem, assegurando a sobrevivência de um interessante ecossistema ribeirinho e a umidade que amenizava o clima seco do verão. Por que não pensar num sistema de contenção da água que corre efêmera durante a estação chuvosa pela artéria aberta do Coreaú?!
EM ALTA
O ingresso dos 04 (quatro) primeiros membros-honorários da Academia Palmense de Letras: Prof. Aguiar, Mardone França, João Alberto Teles e Rantzal Frota. O sócio-honorário é "aquele agraciado com o título, por decisão da maioria dos sócios efetivos, por ter prestado relevantes serviços à Entidade, contribuindo para o desenvolvimento da cultura e das letras do Município e do Estado." (art. 5.º, inciso III, Estatuto APL)
Administrar é definir prioridades. Ora, quando se anuncia em Coreaú a reforma do Mercado, da Praça do Mercado e da Rua do Mercado, parece que esqueceram de reformar algo mais prioritário: o Matadouro Público, ferramenta de primeira necessidade para a saúde pública local...
sábado, 15 de novembro de 2014
sexta-feira, 14 de novembro de 2014
HISTÓRIA DO BRASIL
"Nesta dança, orquestrada pelo estamento, não entra o povo: quem seleciona, remove e consolida as chefias é a comunidade de domínio, num ensaio maquiavélico de captação do assentimento popular. A soberania popular funciona às avessas, numa obscura e impenetrável maquinação de bastidores, sem o efetivo concurso da maioria, reduzida a espectador que cala ou aplaude. (…)
O poder – a soberania nominalmente popular – tem donos que não emanam da nação, da sociedade, da plebe ignara e pobre. O chefe não é um delegado, mas um gestor de negócios, gestor de negócios e não mandatário." (Raymundo Faoro. Os Donos do Poder. 1958)
O poder – a soberania nominalmente popular – tem donos que não emanam da nação, da sociedade, da plebe ignara e pobre. O chefe não é um delegado, mas um gestor de negócios, gestor de negócios e não mandatário." (Raymundo Faoro. Os Donos do Poder. 1958)
terça-feira, 11 de novembro de 2014
ESTADO SOCIAL X ESTADO SOCIALISTA
O socialismo há muitas décadas saiu do centro do debate político nacional. Mesmo no mundo já virou praticamente uma peça de museu. O problema é que, depois da conquista e da consolidação da liberdade (primeira das pautas da Revolução Francesa), haverá sempre a luta pela conquista da igualdade (segunda pauta da mesma revolução); igualdade não apenas formal, mas também material. Nesse processo histórico, o socialismo, com todos os seus defeitos, foi um grandioso aliado da luta por direitos sociais. Foi graças a ele, e por receio de sua implantação, que quase todos os Estados capitalistas modernos tiveram que se dobrar às conquistas sociais, no que resultou no Estado social, que mantém o sistema capitalista de produção, mas também se compromete com a redução das desigualdades sociais (algo, aliás, já praticado em todos os países desenvolvidos, há muitas décadas, através da política do Welfare State), ou seja, uma tentativa de conciliação entre o Estado liberal e o Estado socialista. O cerne da questão política brasileira atual, portanto, está entre manter o Estado social (no nosso caso ainda muito acanhado, mesmo depois da era Lula/Dilma) – nosso Welfare State retardatário – ou retornar para o liberalismo apregoado pela nossa direita, muito mais preocupado com o equilíbrio do mercado do que com as dificuldades das pessoas.
sexta-feira, 7 de novembro de 2014
VIDA DE REPÚBLICA IV
– Todos os dias quando acordo, não tenho mais o tempo que passou...
Dimitri não aguentava mais ouvir todo início de manhã a voz desafinada do colega de quarto cantando sempre a mesma música do Renato Russo.
– Cala a boca, porra!
– Vai-se lascar, Dimitri!
Juan García, o simpático peruano da vizinha 1651, avisava no pátio que alguém chamava Dimitri no telefone público.
– Teléfono!Dimitri não aguentava mais ouvir todo início de manhã a voz desafinada do colega de quarto cantando sempre a mesma música do Renato Russo.
– Cala a boca, porra!
– Vai-se lascar, Dimitri!
Juan García, o simpático peruano da vizinha 1651, avisava no pátio que alguém chamava Dimitri no telefone público.
Era ela. Não teve dúvida. A moça de voz suave que conhecera no Disque Amizade ligava para confirmar o encontro. Às cinco da tarde, na Praça do Ferreira, em frente ao Cine São Luiz. Estava ansioso para conhecê-la pessoalmente. A partir das características descritas no telefone, Dimitri construiu uma imagem bastante animadora da moça, sobretudo pela voz melodiosa e sensual.
Às quatro, Dimitri vestiu uma camisa branca e uma calça jeans, calçou o tênis, borrifou pelo corpo o que restara do frasco de Azzaro e se dirigiu a pé para a Praça do Ferreira. Havia prometido à moça que iria de short e camisa azul, mas preferiu adotar a precaução, apesar da confiança que o encontro lhe inspirava.
Quando chegou na praça, olhou de longe o Cine São Luiz e não avistou ninguém que se assemelhasse à moça do telefone. Passou em frente do cinema, uma, duas, três vezes... A moça devia ter atrasado ou desistido do encontro. Depois de algumas idas e vindas, Dimitri notou que alguém sentado no banco em frente ao cinema lhe acompanhava os passos. Era uma senhora de uns quarenta anos, bem diferente da moça do telefone, talvez desconfiada do movimento suspeito do ansioso transeunte.
Não podia ser a mesma pessoa. A moça do telefone assegurou que tinha vinte e oito anos, um metro e sessenta de altura, sessenta quilos e que era simpática e atraente. A figura da senhora sentada no banco destoava completamente da descrição prometida. A discrepância ficou ainda mais evidente quando ela se pôs em pé... Não podia ser, nem por demasiado exagero. A suspeita de Dimitri somente remanesceu porque, cada vez que ele passava, a senhora mais lhe observava, dos pés à cabeça. Pensou em perguntar-lhe as horas, para sentir a sua voz, mas desistiu quando, bem perto, os olhares se cruzaram.
A senhora do banco da praça estava de vestido vermelho curto. A moça do telefone garantiu que iria de saia azul e camiseta branca. Não podia ser a mesma pessoa. Ainda assim, Dimitri resolveu passar mais uma vez pela senhora curiosa. Ambos se entreolharam com desinibida detença, estamparam no rosto uma expressão de convicta incredulidade e deram as costas, seguindo cada um o seu caminho.
Às quatro, Dimitri vestiu uma camisa branca e uma calça jeans, calçou o tênis, borrifou pelo corpo o que restara do frasco de Azzaro e se dirigiu a pé para a Praça do Ferreira. Havia prometido à moça que iria de short e camisa azul, mas preferiu adotar a precaução, apesar da confiança que o encontro lhe inspirava.
Quando chegou na praça, olhou de longe o Cine São Luiz e não avistou ninguém que se assemelhasse à moça do telefone. Passou em frente do cinema, uma, duas, três vezes... A moça devia ter atrasado ou desistido do encontro. Depois de algumas idas e vindas, Dimitri notou que alguém sentado no banco em frente ao cinema lhe acompanhava os passos. Era uma senhora de uns quarenta anos, bem diferente da moça do telefone, talvez desconfiada do movimento suspeito do ansioso transeunte.
Não podia ser a mesma pessoa. A moça do telefone assegurou que tinha vinte e oito anos, um metro e sessenta de altura, sessenta quilos e que era simpática e atraente. A figura da senhora sentada no banco destoava completamente da descrição prometida. A discrepância ficou ainda mais evidente quando ela se pôs em pé... Não podia ser, nem por demasiado exagero. A suspeita de Dimitri somente remanesceu porque, cada vez que ele passava, a senhora mais lhe observava, dos pés à cabeça. Pensou em perguntar-lhe as horas, para sentir a sua voz, mas desistiu quando, bem perto, os olhares se cruzaram.
A senhora do banco da praça estava de vestido vermelho curto. A moça do telefone garantiu que iria de saia azul e camiseta branca. Não podia ser a mesma pessoa. Ainda assim, Dimitri resolveu passar mais uma vez pela senhora curiosa. Ambos se entreolharam com desinibida detença, estamparam no rosto uma expressão de convicta incredulidade e deram as costas, seguindo cada um o seu caminho.
sexta-feira, 31 de outubro de 2014
quinta-feira, 30 de outubro de 2014
REFÚGIO
Percorreu a rua do Peão no silêncio do meio-dia, fez a curva no oitão da Maria Preta, evitando o monturo vizinho e alcançou, depois de alguns passos, a água fresca do rio. Sentou-se na beira, avistou à distância duas lavadeiras nas pedras e mais perto um menino pescando piaba com uma garrafa furada.
Molhou os pés e o rosto, ergueu-se novamente e resolveu atravessar o rio. Não precisou nadar. A água não lhe chegou a cobrir os ombros. Na estreita praia de areia formada do outro lado, contemplou a cidade sob uma perspectiva diferente. As cercas dos quintais à esquerda, as moitas copiosas que acompanhavam o leito até o campo Beira-rio e um extenso cercado que dava nas ruínas da Ponte Velha.
Esgueirou-se na curva da vazante e seguiu no estreito caminho ainda não submerso até alcançar o imponente juazeiro. Sentou sob a sombra da árvore, provou dois juás maduros, apreciando a silhueta distante da Meruoca e, depois de um salto da ribanceira para um mergulho no rio, embrenhou pelo caminho da Raposa, quase todo coberto pelo mato que crescia no inverno.
Passou pelo primeiro cajueiro, deteve-se um pouco no segundo, sentado num galho para ouvir um sabiá que cantava próximo, e seguiu adiante, espiando o legume que crescia vigoroso em cada cercado, embalado pelo aboio distante do vaqueiro e pelo mugido de esperança de uma rês...
quarta-feira, 29 de outubro de 2014
REELEIÇÃO
A inclusão com a ascensão social de milhões de famílias da classe E para D e da classe D para a C (classe média), expressamente reconhecida pelo Banco Mundial e FAO (ONU), órgão das Nações Unidas e outros organismos internacionais, aliada ao direito social de moradia ("Minha Casa, Minha Vida"), o "Mais Médicos" e o acesso fácil dos jovens ao ensino técnico profissionalizante e às universidades e faculdades particulares (ENEM, COTAS, PROUNI, FIES, etc.) e milhões de empregos gerados, sem dúvida alguma foram os motores que alavancaram a reeleição da presidente Dilma Rousseff em 2014. Melhoria sempre requer mais avanços e mais melhoria, além de controle para afastar a corrupção, daí as cobranças das ruas ocorridas em junho e julho de 2013.
Não há dúvidas que a vida do brasileiro melhorou nesses 12 anos de inclusão social dos governos petistas de Lula e Dilma (ainda precisa melhorar a saúde, a educação e a segurança), e, se os desavisados ou desinformados leem e atentarem para os sete primeiros artigos da Constituição Federal (CRFB/1988, arts. 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 6.º e 7.º), é isso que o Partido dos Trabalhadores através dos seus gestores eleitos para o Planalto tem colocado em prática, coisa que passou ao largo do PSDB nos anos de 1995 a 2002, que privilegia as elites e não prima pela inclusão social.
As discriminações e ataques contra o povo nordestino em face da reeleição de Dilma Rousseff é coisa de gente recalcada e antidemocrática e que não sabe o que é democracia participativa, que não viveu os anos tenebrosos e muito menos o que é Estado Democrático de Direito. A quem essas pessoas querem convencer de que a maioria está errada e eles (a minoria) é que estão certos? Saber perder também faz parte do jogo político democrático.
Nós saímos de uma ditadura e entramos e escolhemos o processo democrático (eleições diretas pelo sufrágio universal – rico ou pobre, sulista, nortista ou nordestino, cada cidadão um tem 1 voto), em que a minoria deve aceitar e acatar a decisão por meio do voto da maioria, independente de serem nordestino, nortistas ou não. Todos nós somos brasileiros.
O que eles mesmos (da minoria derrotada) dirão sobre o querido povo mineiro e carioca, que, pela ampla maioria de votos no dia 26.10.2014, viabilizou a reeleição da 1.ª mulher para continuar dirigindo o nosso querido Brasil?!
Cosmo Carvalho
Membro da APL
domingo, 26 de outubro de 2014
DILMA REELEITA!
Momento histórico: O povo reelege, contra tudo e contra todos, Dilma Rousseff para a Presidência do Brasil! A esperança venceu o ódio!
terça-feira, 21 de outubro de 2014
SOCIAL X LIBERAL
A pesquisa Datafolha da intenção de voto por renda confirma: o ódio da maior parte da elite econômica não decorre dos erros do atual governo, mas exatamente dos seus acertos.
domingo, 19 de outubro de 2014
FANTASMAS DO PASSADO
Todo o discurso reacionário, que vocifera raivosamente preconceito e ignorância, no propósito de eleger para a Presidência da República um projeto mais alinhado com os interesses da elite, pode ser desmontado a partir da leitura dos sete primeiros (apenas dos sete primeiros) artigos da Constituição Federal. Eis alguns exemplos:
1) A nossa elite, como dizia Celso Furtado, vive com um pé no Brasil, mas com o coração na Europa e nos Estados Unidos, e, por esse sentimento, se insurge contra qualquer aproximação com os países da América Latina, num desejo inconsciente de que o Brasil continue na condição de mera colônia das economias hegemônicas; no entanto, o parágrafo único do art. 4.º da Constituição Federal dispõe que: "A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações." Ou seja, a Constituição Federal orienta que a integração prioritária ocorra com os povos da América Latina e não com os europeus e norte-americanos, como deseja a elite;
2) A nossa elite tem ojeriza ao modelo político adotado em Cuba, na Venezuela e na Bolívia e, por essa razão, deseja que o Brasil lhes vire as costas; no entanto, o art. 4.º da Constituição dispõe que a República Federativa do Brasil rege-se, nas suas relações internacionais, dentre outros princípios, pelo da autodeterminação dos povos e pelo da não-intervenção (incisos III e IV), o que impede que o Brasil se imiscua na política interna de Cuba, Venezuela e Bolívia, bem como que desista da integração com esses povos por razão de política interna;
3) O ódio elitista contra os programas sociais do Governo Federal, alimentado por preconceitos, especialmente contra pobres, negros, nordestinos e comunidade LGBT, não sabe que o art. 3.º da Constituição Federal encarta como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil a construção de uma sociedade livre, justa e solidária (inciso I), a erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais (inciso III), além da promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (inciso IV);
4) A nossa elite empregadora, herdeira de uma tradição escravagista, não é muito chegada a direitos trabalhistas, mas é o art. 7.º da Constituição Federal que atribui, justa e merecidamente, um considerável rol de direitos aos trabalhadores urbanos e rurais, muitos dos quais também assegurados aos trabalhadores domésticos (parágrafo único);
5) O discurso autoritário e prepotente da elite prega o uso da força e da intolerância como solução imediatista para muitos dos nossos males, a partir sobretudo do endurecimento da legislação penal, cujo alvo quase exclusivo seria a população vulnerável social e economicamente, mas felizmente esse discurso horrendo esbarra em muitas garantias constitucionais; com efeito, o art. 1.º da Constituição Federal dispõe como fundamento da República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana (inciso III), o art. 4.º da mesma Constituição Federal adota o princípio da prevalência dos direitos humanos e o art. 5.º elenca uma série de direitos e garantias fundamentais do cidadão e da cidadã, absolutamente incompatíveis com qualquer discurso autoritário...
Enfim, parafraseando Renato Russo, a onda reacionária não respeita a Constituição, mas diz que acredita no futuro da nação...
quarta-feira, 15 de outubro de 2014
HORA DA PARTIDA
Depois de quase três anos, com o coração partido, eis que chegou a hora da partida. Saio de Aracati com uma mala carregada de saudade. Saio às pressas, sem tempo de me despedir. Melhor assim. Não sou afeito a despedidas. Devo muito a essa terra. Muitos amigos, a melhor fase da minha vida profissional, alguns lampejos (raros) de inspiração, o encontro com a luta social, o reencontro com a igreja de Cristo... Devo muito a Aracati. Não vou listar os amigos, seria injusto não mencionar todos. Sentirei falta do futebol da quarta na praça, do bate-papo do café entre uma audiência e outra, das muitas e muitas pessoas que tive o prazer de atender, com as quais mais aprendi do que ajudei, dos companheiros de trabalho, daqueles que tive a honra de visitar na prisão, daquela senhora que lacrimejou quando eu disse que era meu último dia na terra dos bons ventos... Em Aracati aprendi muito com a luta dos pescadores do Cumbe pela preservação do seu modo tradicional de vida contra as forças poderosas do capital, uma resistência heroica que transcende a força humana, aprendi que ainda existe uma igreja de Cristo comprometida com a causa do oprimido, aprendi que é só lutando, na luta organizada do povo, que se constrói um mundo novo, aprendi também que uma Defensoria Pública estruturada é uma poderosa ferramenta de transformação social. Ainda tinha muito a aprender, mas a vida é feita de mudanças e é chegada a hora de mais uma. É hora de voltar para perto de casa, depois de alguns anos dormindo solitário num quarto de hotel. É hora de voltar para perto da família, de vê-la todo dia e não mais só nos finais de semana. Meu filho está crescendo e não quero ficar muito tempo longe dele. Estou partindo, com o coração partido, mas ciente de que ficará em Aracati um pedaço de mim. Estou partindo para perto de casa, trocando 150 km por não mais que 25 km, para a região metropolitana de Fortaleza, para Pacatuba, podendo na prática dizer que voltei para casa. A saudade da partida só está sendo compensada pela alegria da chegada.
segunda-feira, 13 de outubro de 2014
O CAÇADOR DE CORRUPTOS?!
O sujeito apresenta cinquenta motivos, baseados em dados concretos, para se votar na Dilma e pede cinco (só cinco) para se votar em Aécio. E em resposta o que escuta?
– Petralhas! Corruptos! Petrolão! Fora Dilma! etc.
Ora, até onde se sabe, não pesa nenhuma denúncia (formal ou informal) contra a pessoa da Dilma! Partido por partido, no ranking da corrupção, o PT é o 9.º, enquanto o PSDB e o DEM ocupam, respectivamente, a 3.ª e 1.ª colocação. Isso mesmo, no dantesco pódio da corrupção partidária, ganharam a medalha de ouro e a medalha de bronze!
Então, o mérito do Aécio é só esse: a corrupção do PT?! Não tem uma só qualidade pessoal para se por numa balança comparativa entre ele e a Dilma? Estão querendo ganhar por W.O., é?
Acho que essa estória, mutatis mutandis, já contaram antes, no não tão longínquo ano de 1989, quando elegeram no embalo eufórico um sujeito "caçador de marajás", sem que a população, em geral, nem ao menos soubesse o que era um marajá! E tudo com o apoio de poderosos meios de comunicação, preocupados em exorcizar um fantasma "comunista" chamado Lula, que viria a ser, anos depois, o melhor presidente da história do Brasil...
sexta-feira, 10 de outubro de 2014
DILMA x AÉCIO
Na primeira pesquisa para o segundo turno, tanto o Ibope quanto o Datafolha apontaram Aécio com 51% e Dilma com 49%. A situação é de empate técnico. A Revista Época, pertencente à Rede Globo, até que tentou forjar às pressas uma pesquisa fajuta em que um instituto desconhecido vinculado ao PSDB paranaense apontava uma diferença maior entre Aécio e Dilma, mas nem os próprios eleitores do tucano caíram nessa ardilosa "pegadinha"... Marina chegou a aparecer nas pesquisas com 34% das intenções de voto no primeiro turno. Depois de algumas semanas de debate eleitoral, em que o seu programa socialmente acanhado e o seu discurso contraditório foram devidamente descortinados, findou somente com 21% dos votos. No primeiro turno, Aécio foi poupado. Porém, com pouco mais de duas semanas para se evidenciar o seu projeto neoliberal e elitista, bem como para se fazer uma comparação entre o governo pífio de FHC e a era Lula/Dilma de muitos avanços sociais e econômicos, apostaria numa diferença final pró-Dilma entre 5% e 10%.
segunda-feira, 6 de outubro de 2014
PT X PSDB
Quem quiser criticar o PT pelo aspecto da corrupção, pode até criticá-lo, mas, por favor, por dever de coerência, vote, no 2.º turno, branco ou nulo, porque, no "ranking" da corrupção partidária, o PT ocupa apenas a 9.ª posição, ao passo que o PSDB é o 3.º partido com mais corruptos do Brasil!
Em verdade, o que diferencia basicamente PT e PSDB é um certo viés ideológico, mais à esquerda de um, e mais à direita de outro. Dilma é adepta do Estado social, intervencionista, altivo nas relações externas e protagonista na promoção da justiça social. Aécio Neves é produto do recrudescimento do neoliberalismo, reedição da doutrina do Estado mínimo, não-intervencionista, subserviente nas relações internacionais e coadjuvante na promoção da justiça social.
A elite, sobretudo a paulistana, está ansiosa pelo retorno do liberalismo, bem mais simpático aos seus interesses de classe. Os mais humildes, sobretudo do Norte e Nordeste, estão, de modo geral, satisfeitos com os programas sociais do Governo.
Haverá, enfim, neste segundo turno, mais um "round" da velha luta entre ricos e pobres no Brasil, vencida entre 1500 e 2002 por um lado e entre 2002 e 2014 por outro.
Cabe a cada um decidir – livremente – de que lado estará.
terça-feira, 30 de setembro de 2014
DICA DE LEITURA
Acabo de ler com entusiasmo o livro "Um oásis dos menos favorecidos da sorte: a experiência do Serviço de Promoção Humana, Camocim/CE. 1962-1979", das coreauenses Vera Lúcia Silva e Ana Selma Silva de Aguiar, ambas graduadas em História pela Universidade Estadual Vale do Acaraú.
O livro conta parte da trajetória do Serviço de Promoção Humana em Camocim, entre os anos 1962 e 1979, período de criação, auge e declínio dessa grande experiência nascida a partir da prática religiosa libertadora e ecumênica, cujo objetivo principal era o desenvolvimento integral do ser humano, através de ações sociais de caráter comunitário, na sede e na zona rural de Camocim. Nas palavras das autoras:
"O Serviço de Promoção Humana (SPH), em Camocim, surge dentro do contexto dos anos 1960, momento em que o mundo passava por grandes transformações políticas, sociais e econômicas. Período também em que a Igreja Católica repensava sua ação junto ao leigo e à sociedade. No Brasil a fundação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em 1952, abriu caminho para a inserção da Igreja Católica do Brasil no campo social de forma mais intensa e fertilizou o campo para receber as discussões que viriam com o Concílio Vaticano II (1962-1965) e com as conferências episcopais latino-americanas de Medellín (1962) e Puebla (1979).
Construído e constituidor de seu tempo, o SPH nasce com o objetivo de promover o desenvolvimento integral das populações pobres da cidade de Camocim, criando os serviços de: Educação e Cultura, Saúde e Higiene, Recreativos, Trabalho (Produção, Alimentação e Habitação), Jurídicos, Póstumos, Comunicação Social e Transporte. De todos os serviços desenvolvidos, o mais importante foi a educação." (Ed. EGUS, Sobral. 2014. p. 147).
P.S.: Um dos organizadores do livro foi o padre e professor, coreauense, Benedito Genésio Ferreira, cofundador, atual presidente e uma das maiores expressões e referências do Serviço de Promoção Humana.
domingo, 28 de setembro de 2014
OTÍLIA
Quando viu Gonçalo triste e envergonhado, sentado na cadeira de rodas, com a mão estendida pedindo esmola na feira de domingo, Otília sorriu com sarcasmo e pensou consigo:
– Vai, bicho ruim, humilhar um padecente de Deus!
Gonçalo vivia próspero e saudável. Seu bar era bem frequentado e ele, aos sessenta anos, se gabava de nunca ter precisado ir a médico. Até que certa noite, ao tirar a calça depois de mais um dia de trabalho, percebeu uma ferida estranha na perda esquerda. Confiante, esperou que, com o tempo, a coisa sarasse, mas à medida que o tempo passava a ferida só crescia. Nem mesmo os medicamentos prescritos pelo dono da farmácia conseguiram conter o avanço da pereba. Finalmente, Gonçalo teve que ir a Sobral procurar ajuda médica. Depois de quatro meses de sofrimento, ele retornou à Palma, sem uma das pernas, prostrado numa cadeira de rodas e ainda sem nenhuma perspectiva financeira. Todo o dinheiro que economizara ao longo da vida despendera no tratamento; para agravar a situação, o bar não resistiu à sua ausência e os filhos tinham ganhado o mundo atrás de emprego. Dona Zilda ainda pediu que ele não fosse, mas, como a ajuda dos amigos era pouca, engoliu o orgulho e se dirigiu, empurrado por um pixote, para a entrada principal do Mercado Público, numa manhã de domingo.
Pouco antes da doença de Gonçalo, Otília estivera em seu bar pedindo esmola aos fregueses. O dono do bar, irritado com a presença incômoda, mas sem coragem de expulsá-la, apenas soltou-lhe uma indireta:
– Boa essa sua profissão, não é, Otília?! Enquanto a gente trabalha, você fica só nessa vadiagem!
Otília ficou possessa com a piada de Gonçalo, imediatamente recolheu a mão com que pedia os trocados e se retirou do estabelecimento, não sem antes responder à provocação:
– Pois tome cuidado, Seu Gonçalo, para você não morrer exercendo essa minha mesma profissão!
Gonçalo realmente morreu pedindo esmola e essa praga era somente mais uma das tantas de que Otília se vangloriava de ter botado durante a sua vida.
quarta-feira, 24 de setembro de 2014
BENEDICTUS EST
Eis a posse do novo psicólogo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), campus Tianguá: o camarada Benedito Gomes Rodrigues. Ele ainda estava no 7.º (sétimo) semestre do curso de Psicologia da UFC-Sobral, fez o concurso de maneira despretensiosa, chegou para a prova na iminência do fechamento dos portões, mas, aprovado em 2.º lugar, no seu primeiro concurso, antecipou, num único semestre, todo o restante do curso, colou grau um ano e meio antes do previsto, inscreveu-se no conselho profissional e obteve o diploma no último dia da entrega da documentação para a posse... Uma odisseia que findou numa sorridente assinatura de um termo de posse em um cargo público federal de nível superior. "Deus ao mar o perigo e o abismo deu, mas nele é que espelhou o céu." (Pessoa)
domingo, 21 de setembro de 2014
DILMA 13
O PT adotou o pragmatismo político, não priorizou as reformas estruturais, se distanciou das bases populares..., cometeu, enfim, muitos erros, mas, apesar dos atropelos, o PT ainda traz consigo um projeto bem definido para o Brasil, traduzido como desenvolvimento econômico com redução das desigualdades sociais. O desenvolvimento econômico tem sido acanhado, possivelmente devido à crise internacional, mas o êxito da política de redução das desigualdades é algo público e notório, que incomoda a nossa velha elite conservadora e reacionária – e seus asseclas –, por representar, depois de quinhentos anos de estagnação, o começo do fim do nosso modelo tradicional de casa-grande e senzala. É, sobretudo, por esse compromisso com a igualdade que voto Dilma!
quinta-feira, 18 de setembro de 2014
POETA ANDARILHO
Teu palco é a rua,
És ébrio andante,
Percorres a noite
Na ponta dos pés.
Balanças inquieto,
Quase não bebeste
És ébrio andante,
Percorres a noite
Na ponta dos pés.
Balanças inquieto,
Quase não bebeste
A fina aguardente;
Não sei onde estás.
Pediste um cigarro;
O corpo envergado
É duro, uma pedra,
Quase não suporta
Teu fardo de amor.
Nuvem de fumaça;
Hesitas canhestro,
Não moras na rua,
Mas dentro de ti.
Entraste na vida,
Deveras, fecunda,
Detrás da certeza
Da luz da manhã.
És tido por louco;
Mas sei que tu és:
Poesia que corre,
Com água serena,
Um sopro de vida,
Que rega e alumia
O imenso deserto
Do escuro existir.
Eliton Meneses
Não sei onde estás.
Pediste um cigarro;
O corpo envergado
É duro, uma pedra,
Quase não suporta
Teu fardo de amor.
Nuvem de fumaça;
Hesitas canhestro,
Não moras na rua,
Mas dentro de ti.
Entraste na vida,
Deveras, fecunda,
Detrás da certeza
Da luz da manhã.
És tido por louco;
Mas sei que tu és:
Poesia que corre,
Com água serena,
Um sopro de vida,
Que rega e alumia
O imenso deserto
Do escuro existir.
Eliton Meneses
segunda-feira, 15 de setembro de 2014
SEMANA APL DE DEBATES
Finalmente, um evento cultural (discreto, mas bastante simbólico) foi realizado paralelamente à Festa de Setembro de Coreaú. A Academia Palmense de Letras (APL), em parceria com a Rádio Princesa do Vale FM, realizou a 1.ª Semana APL de Debates, entre os dias 08 e 12 de setembro de 2014.
No dia 08, o tema foi formação social, com participação de Leonardo Pildas, Prof. Aguiar, Raimundo Marques e Manuel de Jesus. No dia 09, o tema foi economia local, com participação de Manuel de Jesus, João Alberto Teles e Mário Portela. No dia 10, o tema foi educação, com participação de Prof. José Mário, Manuel de Jesus e João Alberto Teles. No dia 11, o tema foi religiosidade, com participação de Leonardo Pildas, Prof. Aguiar e Fernando Deda. No dia 12, o tema foi juventude, com participação de Manuel de Jesus, Rantzal Frota, Benedito Rodrigues e Eliton Meneses.
quarta-feira, 10 de setembro de 2014
ANEL DE TUCUM
"O anel de tucum é um anel feito da semente de tucum, uma espécie de palmeira nativa da Amazônia. (...)
O anel tem sua origem no Império do Brasil, quando jóias feitas de ouro e outros metais nobres eram utilizados em larga escala por membros da elite dominante para ostentarem sua riqueza e poder. Os negros e índios, não tendo acesso a tais metais, criaram o anel de tucum como um símbolo de pacto matrimonial, de amizade entre si e também de resistência na luta por libertação. Era um símbolo clandestino cuja linguagem somente eles compreendiam.
Mais recentemente, a utilização do anel de tucum foi resgatada por fiéis cristãos, especialmente adeptos da teologia da libertação, com o objetivo de simbolizar a 'opção preferencial pelos pobres', especialmente por fiéis católicos após as Conferências Episcopais de Medellín e de Puebla.
(...) Dom Pedro Casaldáliga (...) explica da seguinte maneira a utilização do anel:
'Este anel é feito a partir de uma palmeira da Amazônia. É sinal da aliança com a causa indígena e com as causas populares. Quem carrega esse anel significa que assumiu essas causas. E, as suas conseqüências. Você toparia usar o anel? Olha, isso compromete, viu? Muitos, por causa deste compromisso foram até a morte'."
Fonte: Wikipédia
segunda-feira, 8 de setembro de 2014
A LUTA PELO DIREITO
A Luta pelo Direito (no alemão: "Der Kampf ums Recht"), de Rodolf von Ihering, um dos maiores clássicos da literatura jurídica, defende a ideia de que o direito deve ser conquistado pela luta. Para Ihering, o Direito não é uma pura teoria, mas uma força viva, porquanto todos os direitos da humanidade foram conquistados na luta; uma luta permanente pelo direito, protagonizada por classes, instituições, indivíduos, etc.
A paz, segundo o jurista alemão, é o objetivo do Direito e a luta é o meio de atingi-lo. Como nas outras lutas, na luta pelo direito, não é o peso das razões, mas o poder relativo das forças postas que faz pender a balança.
Assim, é preciso saber que a conquista de direitos exige luta; luta que se faz com coragem e altivez, pois quem rasteja como um verme não pode se queixar de ser pisoteado (Ihering).
quinta-feira, 4 de setembro de 2014
FESTA DE SETEMBRO
Vou andar légua tirana,
Gastar chinelo no chão,
No meio da caravana;
Irei para o meu rincão.
Minha terra pequenina,
No meio da caravana;
Irei para o meu rincão.
Minha terra pequenina,
Tu tens cara de menina,
Palma do meu coração.
Vale d'água cristalina,
No teu leito eu escorro,
Morena do pé-do-morro,
De feição tão feminina;
Na festa da padroeira,
Da virgem da Piedade,
Quero matar a saudade,
Dos parentes e da feira;
Nobre Coluna da Hora,
Bem diante da Matriz,
Tanto mais se fica fora,
Mais invade a cicatriz.
Minha velha cajarana,
Onde jaz o meu cordão,
No dulçor da tua cana,
Eu forjei meu coração.
Eliton Meneses
*****
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domingo, 31 de agosto de 2014
FRASE DO MÊS
"Como não ter Deus?! Com Deus existindo, tudo dá esperança: sempre um milagre é possível, o mundo se resolve. Mas, se não tem Deus, há-de a gente perdidos no vai-vem, e a vida é burra. É o aberto perigo das grandes e pequenas horas, não se podendo facilitar - é todos contra os acasos. Tendo Deus, é menos grave se descuidar um pouquinho, pois no fim dá certo. (...) Deus existe mesmo quando não há. (...) Mas a gente quer Céu é porque quer um fim: mas um fim com depois dele a gente tudo vendo." (Grande Sertão: Veredas. Guimarães Rosa)
sábado, 30 de agosto de 2014
GILMAR PAIVA NO CONFRARIA DE LEITURA
Gilmar Paiva é um anjo torto que resolveu ser gauche na vida. Amigo que tive a fortuna de conhecer há mais de quinze anos numa república de estudantes, Gilmar Paiva é um paradigma de intelectual orgânico, poeta de refinada sensibilidade, economista de inteligência privilegiada, militante da causa dos oprimidos, pensador autodidata, grande leitor... São incontáveis os predicados desse amigo dileto!
Gilmar Paiva foi ao Projeto Confraria de Leitura, do poeta e educador João Teles, ministrar uma palestra sobre a leitura. Com maestria, expôs para os jovens confrades o itinerário fascinante que começa no espanto, passa pela busca e finda com o encontro com a literatura.
No vídeo, Gilmar declama o Poema de Sete Faces, de Carlos Drummond de Andrade, o seu primeiro espanto em face da arte literária!
Gilmar Paiva foi ao Projeto Confraria de Leitura, do poeta e educador João Teles, ministrar uma palestra sobre a leitura. Com maestria, expôs para os jovens confrades o itinerário fascinante que começa no espanto, passa pela busca e finda com o encontro com a literatura.
No vídeo, Gilmar declama o Poema de Sete Faces, de Carlos Drummond de Andrade, o seu primeiro espanto em face da arte literária!
quarta-feira, 27 de agosto de 2014
IMAGENS DO CEARÁ - BICA DO IPU
"Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte, nasceu Iracema.
Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna, e mais longos que seu talhe de palmeira.
O favo da jati não era doce como seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado.
Mais rápida que a corça selvagem, a morena virgem corria o sertão e as matas do Ipu, onde campeava sua guerreira tribo, da grande nação tabajara. O pé grácil e nu, mal roçando, alisava apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as primeiras águas.
Um dia, ao pino do Sol, ela repousava em um claro da floresta. Banhava-lhe o corpo a sombra da oiticica, mais fresca do que o orvalho da noite. Os ramos da acácia silvestre esparziam flores sobre os úmidos cabelos. Escondidos na folhagem os pássaros ameigavam o canto.
Iracema saiu do banho: o aljôfar d’água ainda a roreja, como à doce mangaba que corou em manhã de chuva. Enquanto repousa, empluma das penas do gará as flechas de seu arco, e concerta com o sabiá da mata, pousado no galho próximo, o canto agreste.
A graciosa ará, sua companheira e amiga, brinca junto dela. Às vezes sobe aos ramos da árvore e de lá chama a virgem pelo nome; outras remexe o uru de palha matizada, onde traz a selvagem seus perfumes, os alvos fios do crautá, as agulhas da juçara com que tece a renda, e as tintas de que matiza o algodão.
Rumor suspeito quebra a doce harmonia da sesta. Ergue a virgem os olhos, que o sol não deslumbra; sua vista perturba-se.
Diante dela e todo a contemplá-la está um guerreiro estranho, se é guerreiro e não algum mau espírito da floresta. Tem nas faces o branco das areias que bordam o mar; nos olhos o azul triste das águas profundas. Ignotas armas e tecidos ignotos cobrem-lhe o corpo.
Foi rápido, como o olhar, o gesto de Iracema. A flecha embebida no arco partiu. Gotas de sangue borbulham na face do desconhecido.
De primeiro ímpeto, a mão lesta caiu sobre a cruz da espada; mas logo sorriu. O moço guerreiro aprendeu na religião de sua mãe, onde a mulher é símbolo de ternura e amor. Sofreu mais d’alma que da ferida.
O sentimento que ele pôs nos olhos e no rosto, não o sei eu. Porém a virgem lançou de si o arco e a uiraçaba, e correu para o guerreiro, sentida da mágoa que causara.
A mão que rápida ferira, estancou mais rápida e compassiva o sangue que gotejava. Depois Iracema quebrou a flecha homicida: deu a haste ao desconhecido, guardando consigo a ponta farpada.
O guerreiro falou:
— Quebras comigo a flecha da paz?
— Quem te ensinou, guerreiro branco, a linguagem de meus irmãos? Donde vieste a estas matas, que nunca viram outro guerreiro como tu?
— Venho de bem longe, filha das florestas. Venho das terras que teus irmãos já possuíram, e hoje têm os meus.
— Bem-vindo seja o estrangeiro aos campos dos tabajaras, senhores das aldeias, e à cabana de Araquém, pai de Iracema."
José de Alencar (Iracema)
domingo, 24 de agosto de 2014
CAMINHO DA PRAIA
O dia ainda nem havia raiado quando Edmundo deu a partida da tropa. O comboio de oito burros e dois homens começava cedo sua jornada com destino à praia. Nos fardos e caçuás levavam rapadura, beiju e bolo manzape. Zé Bezerra estava com a saúde frágil. Depois de muitos anos de estrada, pensava em largar a lida do comboio. O terceiro ano seguido de seca castigava o sertão. Não fosse o verde da Ibiapaba, tudo estaria perdido. A mercadoria que descia da Serra Grande tinha um preço alto.
O caminho era longo. Dois dias de caminhada lenta. Da Palma seguiam pela Volta, Padre Linhares, Massapê, Santana do Acaraú, Marco, Bela Cruz, Cruz, até chegar no Acaraú. Era o caminho da praia.
No começo da jornada passaram por uma frente de emergência perto do Breguedof, mais à frente avistaram a pouca água do Açude da Volta, almoçaram sob a copa frondosa de um pé de umbu em Padre Linhares e, depois de um rápido cochilo, seguiram no sol a pino da tarde pela vereda estreita, escutando o canto estridente da cigarra.
Com a noite escura, arrancharam na fazenda de Seu Romualdo, entre Santana e o Marco. Seu Romualdo mantinha a hospitalidade, embora, desde a morte de Dona Maria e a ida dos filhos para Sobral, andasse meio desgostoso da vida. Na fazenda do velho amigo, os comboieiros ainda desfrutavam do jantar farto, cujo arremate era sempre um prato de coalhada com um pouco de farinha e açúcar. Não havia pagamento. Edmundo deixava umas rapaduras e uns beijus só como agrado.
Os comboieiros dormiam no alpendre até o cantar dos galos. Tomavam, então, um café quente e seguiam pela estrada silenciosa. No final do dia alcançariam a praia. No Acaraú, o comércio minguado só adquiria a mercadoria depois de muita negociação. O lucro era pouco. Levariam uns peixes na viagem de volta. Dariam uns quilos para Seu Romualdo.
Os comboieiros não sabiam que Seu Romualdo tinha falecido na noite seguinte àquela em que eles dormiram na fazenda. Eles não sabiam ainda que as pernas de Zé Bezerra não lhe permitiriam realizar uma nova jornada pela estrada da praia. Não sabiam também que aquele retorno para a Palma seria a derradeira jornada da tropa de Edmundo. Não sabiam que aqueles seriam os últimos passos do ciclo do comboio da região.
O caminho era longo. Dois dias de caminhada lenta. Da Palma seguiam pela Volta, Padre Linhares, Massapê, Santana do Acaraú, Marco, Bela Cruz, Cruz, até chegar no Acaraú. Era o caminho da praia.
No começo da jornada passaram por uma frente de emergência perto do Breguedof, mais à frente avistaram a pouca água do Açude da Volta, almoçaram sob a copa frondosa de um pé de umbu em Padre Linhares e, depois de um rápido cochilo, seguiram no sol a pino da tarde pela vereda estreita, escutando o canto estridente da cigarra.
Com a noite escura, arrancharam na fazenda de Seu Romualdo, entre Santana e o Marco. Seu Romualdo mantinha a hospitalidade, embora, desde a morte de Dona Maria e a ida dos filhos para Sobral, andasse meio desgostoso da vida. Na fazenda do velho amigo, os comboieiros ainda desfrutavam do jantar farto, cujo arremate era sempre um prato de coalhada com um pouco de farinha e açúcar. Não havia pagamento. Edmundo deixava umas rapaduras e uns beijus só como agrado.
Os comboieiros dormiam no alpendre até o cantar dos galos. Tomavam, então, um café quente e seguiam pela estrada silenciosa. No final do dia alcançariam a praia. No Acaraú, o comércio minguado só adquiria a mercadoria depois de muita negociação. O lucro era pouco. Levariam uns peixes na viagem de volta. Dariam uns quilos para Seu Romualdo.
Os comboieiros não sabiam que Seu Romualdo tinha falecido na noite seguinte àquela em que eles dormiram na fazenda. Eles não sabiam ainda que as pernas de Zé Bezerra não lhe permitiriam realizar uma nova jornada pela estrada da praia. Não sabiam também que aquele retorno para a Palma seria a derradeira jornada da tropa de Edmundo. Não sabiam que aqueles seriam os últimos passos do ciclo do comboio da região.
sexta-feira, 22 de agosto de 2014
ALTOS E BAIXOS
EM ALTA
A força que move o ser humano a arriscar sua própria vida para salvar o outro. Na África, nem o ebola afasta os médicos sem fronteira da luta contra a doença.
EM BAIXA
A barbárie que ainda insiste em perseguir o ser humano. Os vídeos que circulam na internet, de execuções sumárias e decapitações a sangue frio, revelam que o homem, com sua centelha de maldade, precisa cada vez mais alimentar o amor ao próximo...
EM ALTA
A nova cultura de comemorar ou ao menos lembrar o aniversário alheio. Num passado próximo, pouca gente, em regra, lembrava do aniversário do outro, às vezes nem o próprio aniversariante.
EM BAIXA
E eis que, em Coreaú, do final de 2012 para cá, toda uma interessante efervescência sociocultural sofreu um repentino eclipse total... Por que parou? Parou por quê?
segunda-feira, 18 de agosto de 2014
MEA-CULPA
Ela entrou compenetrada na sala. Os olhos tremiam lacrimosos. Na mão segurava a certidão de óbito do filho. Não pensava em vingança. Não se importava com a justiça dos homens. Desejava somente voltar no tempo para abraçar mais uma vez o seu filho. O seu filho de vida tão adoidada, viciado em droga, autor de alguns delitos, mas seu filho, tão jovem, tão bonito, tão amado... Quanta saudade!
Seu filho morto aos vinte anos. Três tiros à queima-roupa. O tráfico não perdoa delator. Ela não se perdoa por não ter atendido ao último pedido do filho. O dinheiro, a droga do dinheiro, ainda continua na gaveta do quarto. Não serve mais para nada. Nada trará o filho de volta. Devia ter tido a coragem. O arrependimento dói tanto quanto a perda do filho. Toda noite sonha com seus olhos suplicantes pedindo os trezentos reais. Seu filho precisava do dinheiro. Ele precisava realmente comprar uma arma para se defender...
sexta-feira, 15 de agosto de 2014
NOSSA ERA PÓS-MODERNA
"Enquanto para a sociedade de classes, da 'antiga' modernidade, o proletariado precisava ser mantido com um mínimo de condições de subsistência (daí o Welfare State), para a sociedade eficientista, da globalização pós-moderna, o pobre é responsabilizado e estigmatizado pela própria pobreza. Longe de produzir sentimentos de solidariedade, é associado ideologicamente ao que há de mais visivelmente negativo nas esferas nacionais, em escala planetária: superpopulação, epidemias, destruição ambiental, vícios, tráfico de drogas, exploração do trabalho infantil, fanatismo, terrorismo, violência urbana e criminalidade. As classes abastadas se isolam em sistemas de segurança privada. A classe média (que hoje abarca os operários empregados), num contexto de insegurança generalizada, cobra dos legisladores penas aumentadas para o criminoso comum." (Lindgren Alves, A Declaração dos Direitos Humanos na Pós-Modernidade)
terça-feira, 12 de agosto de 2014
EDUCAÇÃO JURÍDICA POPULAR
Dentre outras funções institucionais, incumbe à Defensoria Pública a difusão e a conscientização dos direitos humanos, da cidadania e do ordenamento jurídico (Art. 4.º, III, da LC 80/94). Trata-se da tarefa conhecida como educação em direitos, uma relevante perspectiva do acesso à justiça atribuída à Defensoria Pública.
Ao contrário da orientação jurídica, que é casuística e possui a tríplice função de prevenir conflitos, solucioná-los pacificamente ou encorajar o litígio por intermédio da jurisdição, a educação em direitos é atribuição de caráter genérico, que consiste em informar, conscientizar e motivar a população necessitada, inclusive pelos diversos meios de comunicação, a respeito de seus direitos e garantias fundamentais.
A educação em direitos, num país de tamanhas desigualdades como o nosso, deve não apenas conscientizar a população de seus direitos, mas também ensiná-la a assumir postura crítica diante das distorções do sistema jurídico e incentivá-la a lutar por novos direitos, pois a justiça social, entre nós, depende muito da participação popular, sem a qual não há qualquer esperança de efetiva transformação social.
sábado, 9 de agosto de 2014
A EDUCAÇÃO PELA PEDRA
Uma educação pela pedra: por lições;
para aprender da pedra, frequentá-la;
captar sua voz inenfática, impessoal
(pela de dicção ela começa as aulas).
A lição de moral, sua resistência fria
ao que flui e a fluir, a ser maleada;
a de poética, sua carnadura concreta;
a de economia, seu andensar-se compacta:
lições da pedra (de fora para dentro,
cartilha muda), para quem soletrá-la.
Outra educação pela pedra: no Sertão
(de dentro para fora, e pré-didática).
No Sertão a pedra não sabe lecionar,
e se lecionasse não ensinaria nada;
lá não se aprende a pedra: lá a pedra,
uma pedra de nascença, entranha a alma.
João Cabral de Melo Neto
segunda-feira, 4 de agosto de 2014
JUSTA
Justa todo dia acordava bem cedo, tomava banho de água morna, bebia o café com leite acompanhado de uma tapioca e, depois de se despedir da esposa e dos filhos, seguia de carro para o seu trabalho no banco.
Além da simpatia e do senso de humor, Justa era também reconhecido pela eficiência profissional e pela refinada cultura. Às vezes, relacionava uma contrariedade corriqueira da agência com algum episódio bíblico:
– Cafarnaum! Cafarnaum! E você, Cafarnaum: será elevada até o céu? Não, você descerá até ao Hades!
Em momentos de aborrecimento, para impressionar colegas e clientes incautos, proferia o introito das Catilinárias:
Em momentos de aborrecimento, para impressionar colegas e clientes incautos, proferia o introito das Catilinárias:
– Quousque tandem abutere Catilina patientia nostra!
Ninguém entendia nada, mas supunha naquele sujeito baixinho, gordo e careca, um fosso de erudição. Com conhecimentos que não passavam dos rudimentos do inglês, do francês, do italiano e do espanhol, Justa adquiriu a fama de poliglota, a partir do suposto domínio de cinco idiomas e, pelas suas competências reais e imaginárias, foi galgando espaços na agência e majorando seu salário com gratificações cada vez mais generosas.
– O Captain! my Captain! our fearful trip is done! Chacun pour soi et Dieu pour tous! Se non è vero, è ben trovato! Hay que endurecer, pero sin perder la ternura jamás! (...)
– O Captain! my Captain! our fearful trip is done! Chacun pour soi et Dieu pour tous! Se non è vero, è ben trovato! Hay que endurecer, pero sin perder la ternura jamás! (...)
Quando alguém, em expressão de concordância, soltava um justamente, Justa logo atalhava:
– Justa não mente!
Justa era conhecido como o "papa-filas", tamanha a sua eficiência no atendimento do caixa. Enquanto os demais colegas, por preguiça, má-vontade ou inexperiência, realizavam um atendimento arrastado, para o desespero dos clientes, Justa desfazia uma fila de quarenta pessoas em pouco mais de uma hora.
Normalmente, Justa se empolgava com a própria celeridade e, entre um cliente e outro, bradava, com ironia e contentamento:
– Mais um atendimento ao molho pardo!
Os colegas de caixa, decerto, mais do que os clientes, se incomodavam com a presteza e a ironia do Justa. Um deles fez chegar ao gerente-geral uma reclamação anônima dando conta da forma incomum de um caixa chamar o cliente da fila.
Num final de expediente, Justa foi chamado à gerência-geral para uma conversa reservada, concluída com uma recomendação para não mais tratar os clientes daquela forma...
No expediente do dia seguinte, todas as atenções voltaram-se para o início do atendimento do Justa. Nos três primeiros atendimentos, Justa demorou um pouco mais do que o convencional, mantendo-se até então em total silêncio, o que levou os colegas à conclusão de que ele teria se inibido com a chamada de atenção; porém, depois de um rápido quarto atendimento, Justa finalmente quebrou o seu silêncio:
– Mais um atendimento ao molho branco! porque ao molho pardo deu problema...!
quinta-feira, 31 de julho de 2014
quarta-feira, 30 de julho de 2014
SERTÃO
Nessa terra ressequida,
Tantas vezes esquecida,
Pouca água cai no chão;
De um povo resistente,
Desde muito padecente
Das agruras da estação.
Gente pobre oprimida,
Generosa e destemida,
De Luiz, rei do Baião;
Do forró, da simpatia;
De prece e de valentia:
Padim Ciço e Lampião.
Pouca água cai no chão;
De um povo resistente,
Desde muito padecente
Das agruras da estação.
Gente pobre oprimida,
Generosa e destemida,
De Luiz, rei do Baião;
Do forró, da simpatia;
De prece e de valentia:
Padim Ciço e Lampião.
Terra do roceiro bravo,
Da peleja qual escravo,
Do vaqueiro de gibão.
Terra de tanta poesia,
De viola e cantoria,
Da festa de apartação.
Terra do caboco pardo,
Agarrado em duro fardo
Nas lidas da plantação;
De um povo inteligente,
E de mulherio decente;
De Lunga e Frei Damião.
Berço da mãe heroína,
E da doce cajuína,
De Alencar e de Tristão.
Terra de bastante glória,
A mais fértil da história,
Conhecida por Sertão.
Eliton Meneses
sábado, 26 de julho de 2014
SEU LUNGA
No Centro de Juazeiro do Norte/CE, é fácil encontrar Seu Lunga. Todos sabem informar onde fica a sucata daquele que carrega a má fama de "homem mais ignorante do mundo", de qualquer sorte uma lenda viva da cultura popular nordestina.
Avistei Seu Lunga sentado, solitário e compenetrado, na entrada de sua venda. Aproximei-me cauteloso. Um casal acabara de cumprimentá-lo e Seu Lunga, com indiferença, recusara-se a posar para uma fotografia.
Tomei coragem e o saudei.
– Olá, Seu Lunga! É um prazer conhecê-lo!
– Oba! Mais ou menos! Respondeu Seu Lunga.
– Tem tudo no mundo na sua loja, não é, Seu Lunga?
– Não! Não tem elefante, nem trem, nem onça, nem avião...! Não tem tudo no mundo na loja, não!
– Tudo bem, Seu Lunga! Mas o que o senhor recomendaria para a gente levar de lembrança do Juazeiro?
Seu Lunga pensou, coçou a cabeça, olhou para o interior da sua sucata e disse:
– Escolha você mesmo!
Percorri por alguns minutos o corredor estreito, em meio à enormidade caótica de bregueços, mas sinceramente não encontrei nada em especial que me despertasse o interesse. Por sorte, no retorno Seu Lunga mostrou um saco de anéis. Escolhi dois e paguei sete reais. Antes de me despedir, olhei no fundo dos olhos de Seu Lunga e vi um homem de alguma forma destroçado pela amargura e pela tristeza, muito diferente do folclórico sujeito impaciente tão cantado em verso e prosa no anedotário popular. Uma aura negra parecia envolvê-lo. Também me acabrunhei. Não tive ânimo para seguir a conversa, apenas perguntei se ele estaria disposto a tirar uma foto.
– Pode ser! Respondeu Seu Lunga, para minha surpresa.
Logo depois de sair da sucata de Seu Lunga, algumas quadras depois, soube que ele, há dois dias, havia enterrado seu filho caçula e que o seu outro filho homem também havia morrido há apenas dez meses.
Seu Lunga realmente estava tomado pela amargura e pela tristeza. Não conheci Seu Lunga, o lendário cabra impaciente do anedotário popular, mas o homem Joaquim dos Santos Rodrigues, um pai enlutado com a perda de dois filhos.
segunda-feira, 21 de julho de 2014
ELUCUBRAÇÕES CEREBRINAS
João Santos da Rocha era um poço de desilusão. Julgava-se um fracasso em tudo na vida. Tinha trabalho, dois diplomas, amigos, casa própria, carro novo na garagem, contas pagas, mas tudo no mundo o entediava. Dividia a casa com Calçado, seu confidente cachorro vira-latas. Depois que flagrou a namorada de infância aos beijos com o desafeto da escola, resolveu nunca mais confiar nas mulheres. Quando a insônia e a falta de apetite se lhe apresentaram no rosto encarquilhado refletido no espelho, procurou finalmente se aconselhar com um colega de trabalho.
– O que você acha que eu devo fazer, Cardoso?
– Tá na hora de tu arranjar uma mulher, homem!
João julgava que uma mulher seria mais um agravo do que uma solução para os seus problemas. Teve contrariado que se socorrer de um médico, que, com o resultado dos exames, lhe prescreveu um calmante natural, a mudança de hábitos e uma dieta macrobiótica.
Depois de uma leve melhora, as inquietações medonhas recrudesceram. Quando soube que Calçado fora acometido pela hidrofobia e que devia ser sacrificado, começou a nutrir a ideia de seguir o mesmo destino do seu sorumbático animal de estimação.
Com a licença médica no emprego, pôs-se a caminhar dia e noite detido em devaneios e elucubrações cerebrinas. Seu mundo era um labirinto indecifrável, cinzento, sem cheiro e sem sabor. Desejava dar cabo àquele sofrimento sem fim.
Certo dia tomou coragem e armou uma corda na goiabeira do quintal. Foi ao banheiro, encarou seu rosto sofrido no espelho, respirou fundo e, antes de cruzar a soleira, abandonou o plano suicida, ao avistar Calçado solto no quintal, debatendo-se num acesso furioso da hidrofobia, e ficar com medo de levar uma mordida do animal...
João Santos da Rocha procurava respostas para suas muitas perguntas e, como não as encontrasse, cada vez mais se considerava no fundo de um poço sombrio. Num passeio pela beira-mar, porém, ficou surpreso com um sujeito na areia da praia que, sem nenhum dos braços, parecia ensaiar os requebros de uma dança inaudível. João, cuja sanidade física sempre fora impecável, foi ao encontro do sujeito para tentar desvendar a razão de tamanha felicidade.
– Ó, moço, diga-me o que lhe faz tão feliz, mesmo lhe faltando ambos os braços?
– Feliz? Mas que feliz nada, moço! Eu só estou é querendo coçar o ás e não posso!
Três meses mais tarde, sem Calçado, mas com Sovela, sua nova cadela, João, em franca convalescença, resolveu pedir a veterinária em noivado.
sábado, 19 de julho de 2014
ALTOS E BAIXOS
EM ALTA
A criação do banco de fomento do BRICS para fazer frente à hegemonia financeira do FMI. Com capital inicial de apenas 50 bilhões de dólares, o banco nasce como uma mosca na sopa do imperialismo americano, mas que anuncia um início de rearranjo da geopolítica global.
EM BAIXA
Em Coreaú, o Matadouro Público continua interditado e em ruínas. A carne que as pessoas consomem vem dos chiqueiros dos quintais ou das moitas da beira do rio, sem qualquer controle sanitário. Enquanto isso, já iniciaram a reforma geral da Praça do Mercado, a mais nova e bem conservada da cidade...
EM ALTA
A comemoração da conquista da Copa do Mundo pela seleção alemã com uma dança pataxó em pleno Maracanã. Será que fosse o Brasil o campeão alguém recordaria das nossas raízes culturais?! Enfim, a taça está bem entregue!
EM BAIXA
Em Coreaú, o calcadão da cidade – uma das poucas opções de lazer – não tem um único banco sequer para as pessoas sentarem. Quanto custa instalar dez bancos de ferro e madeira ou mesmo de cimento? Por que tanta indiferença no enfrentamento de questão tão simples?
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