terça-feira, 30 de junho de 2015

TOLERÂNCIA



Num momento de avanço da onda de intolerância no Brasil, a cadeia de solidariedade deflagrada simbolicamente com a adoção de um filtro de arco-íris na foto de perfil do Facebook, a partir de uma decisão libertária da Suprema Corte dos Estados Unidos da América, país que é o grande farol dos nossos reacionários, ao contrário de retratar um mero modismo ou um complexo de vira-latas colonial (como alguns vêm defendendo), é uma manifestação oportuna, de tolerância e igualmente libertária.
É preciso termos cuidado com os maniqueísmos; nem tudo que vem dos Estados Unidos é imperialismo, como nem tudo que ganha repercussão é modismo. Na luta pela construção de um mundo melhor, há aliados em todos os cantos do mundo. E não há nada melhor do que um arco-íris de amor logo depois de uma tempestade de ódio.

sábado, 27 de junho de 2015

ALTOS E BAIXOS


EM ALTA

A aprovação do casamento entre pessoas do mesmo sexo pela Suprema Corte dos Estados Unidos da América e a onda de solidariedade que foi deflagrada no Facebook com a adoção de um filtro de arco-íris na foto de perfil, que, longe de ser um modismo imperialista, carrega um forte simbolismo no tocante à tolerância da diversidade sexual, especialmente no Brasil, onde uma onda homofóbica começava a ganhar força.   

EM BAIXA

O silêncio da mídia sensacionalista local quando o alvo da ação policial envolve os "donos do poder". Na seletividade midiática: "Do pescoço pra baixo é canela!" Mas nem sempre... 

EM ALTA

A mobilização das forças progressistas contra a redução da maioridade penal no Brasil. Fascistas, racistas, não passarão! 

EM BAIXA

A imagem de um povo tolerante que o Brasil outrora possuía. Conta-se que os soldados alemães que combatiam em Monte Castelo e Montese, pressentindo a inevitável derrota nazista na 2.ª Guerra Mundial, mesmo em vantagem técnica em relação aos pracinhas da FEB, resolveram se entregar aos brasileiros, por acreditarem que, nas mãos deles, seriam bem tratados. E efetivamente o foram. Talvez seja esse um dos legados que o povo brasileiro teria a dar para o mundo, muito embora essa nossa imagem de povo tolerante ultimamente tenha sido bastante ofuscada.   

segunda-feira, 22 de junho de 2015

CLÁUSULA PÉTREA


Em se tratando de cláusula pétrea, o princípio da maioria não vale, porque, nessa matéria, mesmo havendo maioria, a Constituição Federal não pode ser emendada (art. 60, § 4.º, CF/88).
Ainda que 87% dos brasileiros aprovem atualmente a redução da maioridade penal, como sugere recente pesquisa do Datafolha, não há como alterar a garantia constitucional da inimputabilidade penal dos menores de dezoito anos, que se submetem à legislação especial (art. 228, CF/88). Nesse aspecto, aliás, as pesquisas de opinião pouco provam, já que estão sujeitas às mudanças de humor das pessoas, que reagem emotivamente diante dos fatos de que são expectadoras. Ora, com a proliferação dos programas policiais, movidos pelo senso comum e pelo desejo de vingança, não surpreende que a maioria atual seja favorável à redução da maioridade penal, mas, em matéria de cláusula pétrea, não é a maioria episódica de uma geração suficiente para legitimar uma emenda ao texto original da Constituição Federal de 1988.
Assim, a redução da maioridade penal, como a pena de morte, a prisão perpétua, a pena de trabalhos forçados, dentre outras matérias dessa natureza, só poderiam ser aprovadas por uma nova Constituição Federal.

IGUALDADE SUBSTANCIAL



"Devemos tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades." (Aristóteles)
Esse conceito de igualdade substancial, que vem do século IV a.C. e está por trás das ações afirmativas no Brasil, ainda parece muito avançado para muita gente da nossa sociedade estamental e patrimonialista, herdeira do modelo casa-grande e senzala.

quarta-feira, 17 de junho de 2015

RICOS x POBRES


"Em essência, o socialismo não é mais nem menos do que uma crítica à ideia de propriedade sob a luz do interesse público. Podemos analisar, muito brevemente, a história dessa ideia através das eras. (...) O conceito de propriedade surge dos instintos combativos da espécie. Muito antes que os homens fossem homens, o macaco ancestral já era um proprietário. Propriedade privada é o que faz uma besta lutar. O cachorro e seu osso, a tigresa e seu covil, o macho rugindo e seu rebanho, tudo isso é propriedade em seu estado puro. (...) Por fim temos o ensinamento do grande revolucionário Jesus de Nazaré, que atacou a propriedade com uma força nunca vista antes. Mais fácil era, ele disse, um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um proprietário de grandes posses entrar no reino dos céus. Uma crítica constante e contínua do alcance admissível da propriedade vem ocorrendo no mundo, ao que parece, nos últimos 25 ou 30 séculos. Mil e novecentos anos depois de Jesus de Nazaré, constatamos que todo o mundo que vive de acordo com o ensinamento cristão está certo de que não pode existir propriedade sobre seres humanos. E a ideia de que 'um homem pode fazer o que quiser com o que possui' ficou muito abalada em relação a outros tipos de propriedade." (H. G. Wells. Uma Breve História do Mundo)

segunda-feira, 8 de junho de 2015

SISTEMA DE COTAS



Devido às disparidades no campo econômico e simultaneamente no campo social, o Governo Federal passou, desde agosto de 2012, com a Lei nº 12.711, a amparar o sistema de cotas no Ensino Superior; agora é lei, todas as universidades e institutos federais terão que reservar 25%, ou seja, 1/4 das suas vagas para alunos das escolas públicas. Destas vagas reservadas para a escola pública, metade será destinada para estudantes com renda mensal familiar até um salario mínimo e meio. O preenchimento das vagas deve levar em conta ainda critérios de cor ou raça, seguindo dados estatísticos do IBGE (Portal MEC).
No Brasil, desde a colonização, vimos um país em que a diversidade sobressaiu, inúmeros grupos, de origens, raças e etnias diferentes, fizeram parte da nossa história, ou seja, há um alto grau de miscigenação na sociedade brasileira e atualmente são perceptível as inúmeras desigualdades ainda existentes. Sendo assim, medidas devem ser tomadas para que os níveis de disparidade caiam e, visando isso, o art. 3.º da Constituição Federal prevê a garantia da igualdade de oportunidade.
Atualmente, graças à reserva de vagas, o mito de que o acesso a faculdades era apenas para indivíduos com renda elevada, hoje vem ganhando rumores diferentes e sendo desconstruído, pois a possibilidade de ingresso de classes desfavorecidas já não é considerada mais tão impossível.
Ademais, a medida é considerada paliativa, uma vez que não resolve a educação no Brasil, pois o que precisamos mesmo é de uma melhora na qualidade de ensino como um todo, para que a reserva de vagas não seja necessária e que todos possam concorrer de maneira igualitária; entretanto, enquanto isso ainda for um problema com maior dimensão devido à falta de uma política educacional por parte do Estado brasileiro, a reserva de vagas será benéfica em relação à exclusão.
O sistema é considerado, para os que precisam, uma luz. Todavia, como quase todo assunto polêmico, ele tem seus prós e contras e as cotas são consideradas por boa parte da população uma medida negativa, com o argumento de que se está ferindo o princípio de igualdade; porém, além da igualdade formal (perante a lei), prevista no art. 5.º, caput, a Constituição Federal também prevê a igualdade de fato (material), no art. 3.º, incisos I, III e IV! Além disso, há ainda mitos como a queda no nível acadêmico das universidades; entretanto, pesquisas provam o contrário!
Visto isto, vale ressaltar que o Sistema de Cotas não resolve todo o problema, ele é apenas uma ferramenta eficaz na democratização das oportunidades de acesso ao ensino superior para um amplo setor da sociedade excluído historicamente e que, enquanto não houver um melhoria na política educacional como um todo, a reserva de vagas será a melhor alternativa.

Marinara Rodrigues
Estudante de Direito-UERJ

domingo, 7 de junho de 2015

HIPOSSUFICIÊNCIA SOCIAL


É função institucional da Defensoria Pública exercer a defesa dos interesses individuais e coletivos da criança e do adolescente, do idoso, da pessoa portadora de necessidades especiais, da mulher vítima de violência doméstica e familiar e de outros grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção especial do Estado (art. 4.º, inciso XI, LC 80/94, com redação dada pela LC 132/2009). Nessa hipossuficiência social (acho preferível o termo social ao termo organizacional), a lei não atrelou a atuação da Defensoria Pública à insuficiência de recursos financeiros para pagar um advogado. Havendo a vulnerabilidade referida na lei e, claro, a pertinência da causa com essa vulnerabilidade, a Defensoria Pública está autorizada a atuar. Se uma pessoa com deficiência física, por exemplo, pretende ingressar com uma revisional do financiamento de sua Hilux, não há, de fato, como o defensor público deixar de aferir a sua insuficiência de recursos financeiros; no entanto, se essa mesma pessoa com deficiência pretender ingressar com uma ação decorrente de violação ou ameaça vinculada à sua especial condição física (como no caso de indenização por preconceito e de ação para assegurar o direito de acesso), ela não precisa ser pobre na forma da lei para ter acesso ao serviço da Defensoria Pública.

BRASIL x ALEMANHA


Na Alemanha, o programa Arbeitslosengeld II assegura à pessoa pobre, como auxílio alimentação, o valor de 347 euros; como auxílio moradia, 245 euros e, como seguro de saúde, 150 euros... Assim, um alemão pobre recebe do Estado, como benefício social, 742 euros mensais, que, convertidos em real, dá R$ 2.600,00 (dois mil e seiscentos reais)...
Será que o nosso Bolsa Família, cujo valor médio pago às famílias é R$ 155,00, não deveria ser encarado com mais naturalidade? Será que a Alemanha é uma república bolivariana? Será que até em consciência social nossa derrota para a Alemanha é de 7 a 1?

sábado, 6 de junho de 2015

SEU LÁZARO


Dona Antônia recolhia suas galinhas soltas na rua quando começava a escurecer em Coreaú. Todas atendiam prontamente ao chamado, até os pintos e o galo. 
 Til, til, til...
Naquele dia, seu filho Lázaro estava particularmente triste. Contemplou com o olhar vago da janela a entrada das galinhas e me chamou com um leve aceno. Pediu que lhe comprasse na farmácia três ampolas de Epocler. Achei estranho uma pessoa que havia largado a cachaça há tantos anos ter necessidade de remédio para o fígado. Papai costumava tomar Epocler somente depois de um porre excepcional.     
Seu Lázaro era um moreno claro, alto, de meia idade, vistoso, sereno e de uma elegância incomum. Eu, menino de sete anos de idade, admirava demais aquele vizinho que me tratava como amigo, de igual para igual, a despeito da diferença de idade de mais de trinta anos. A partir daquele dia, porém, meu amigo começou a definhar. Ainda lhe fiz alguns favores na farmácia, mas nenhum remédio surtia efeito. A magreza ficava a cada dia mais evidente. Não tive coragem de perguntar-lhe se estava doente. Soube depois por mamãe que era câncer no fígado. Aquela cachaça com coca-cola e limão que Seu Lázaro havia tomado sem limite tempos atrás, dez anos depois, sorrateiramente, lhe cobrava um alto preço.
Quando Seu Lázaro ficou prostrado na rede, eu costumava sentar do lado para tentar numa prosa reanimá-lo. A gente mais se entreolhava do que conversava. Ele sabia que estava a caminho da morte iminente e eu não sabia o que lhe dizer. Não conseguia entender como uma pessoa que estava viva de repente morresse e fosse enterrada no cemitério. Disse-lhe que ele não iria morrer, que, se continuasse tomando o chá de boldo com Xantinon, em menos de um mês, estaria novinho em folha. Seu Lázaro sorriu e me disse que eu ainda iria ver muita coisa nesta vida.  
Em menos de um mês, o choro de Dona Antônia nos avisou da morte do seu filho querido. Quando vi meu amigo no caixão, por um instante, pensei que tivesse poderes para despertá-lo. Balbuciei umas palavras mágicas e pedi baixinho que ele abrisse os olhos. Não adiantou. Toquei seu braço, rígido e frio, e só então me dei conta de que a alma do amigo havia abandonado o seu corpo. Senti uma coisa ruim no peito e os olhos cheios de lágrima. 
Permaneci a noite quase toda no velório. Somente às quatro mamãe veio me chamar. Sonhei com Dona Antônia chamando as galinhas, com Seu Lázaro forte e sorridente na janela, dizendo-me que eu estivera certo, que ele não tinha morrido, que o chá de boldo com Xantinon o tinha deixado novinho em folha. Fiquei bastante contente. No sonho, tinha a certeza de que o velório não passara de um pesadelo, que felizmente estava tudo bem com meu amigo, que a vida continuava como sempre fora. 
 Til, til, til...
Ao meio dia fui despertado pelo sino da igreja; perguntei assustado por seu Seu Lázaro e mamãe me respondeu que o enterro tinha acontecido às dez horas.

terça-feira, 2 de junho de 2015

CORRUPÇÃO


Sempre fui revoltado com a corrupção no Brasil; esse mal crônico que assola o país desde 22 de abril de 1500. Tenho acompanhado com júbilo há tempos o sistema de Justiça combatê-la, muitas vezes discretamente, sem necessidade de tornar o combate à corrupção uma vistosa bandeira político-partidária.
De uns tempos pra cá, especificamente de 2003 pra cá, quando o combate à corrupção (e não a corrupção em si) ficou mais intenso, vem-se formando paradoxalmente uma onda de revoltados (online ou não) contra a corrupção, que tem um sério problema. Esses revoltados, até um dia desses, pouco se importavam com a corrupção. Além disso, esses revoltados não se revoltam (nem nunca escreveram uma única frase de protesto) contra a corrupção que há nos mais de 5000 municípios do Brasil, nas 27 Unidades da Federação, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, não; toda a revolta tem tempo e endereço certo, são os últimos doze anos do Governo Federal, que inegavelmente teve muita corrupção, mas uma corrupção que (felizmente) tem sido combatida. A corrupção que é alvo de combate também me revolta, mas me revolta mais a corrupção que permanece impune. Essa, não tenho dúvida, não está no Governo Federal dos últimos doze anos.
Sobre essa onda "puritana" anti-corrupção, que, em São Paulo, por exemplo, deseja a morte do Lula (porque "corrupto"), mas sempre votou em Paulo Maluf, o maior pensador do Século XX, Norberto Bobbio, já havia alertado: "O fascista fala o tempo todo em corrupção. Fez isso em 1922, na Itália; em 1933, na Alemanha; no Brasil em 1964. Ele acusa, insulta, agride, como se fosse puro e honesto. Mas o fascista é apenas um criminoso comum ou um sociopata que está fazendo carreira política. No poder, essa direita não hesita em torturar, estuprar e roubar sua carteira, sua liberdade e seus direitos. Mais do que corrupção, o fascista pratica a maldade."