quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Soneto LXII


Quantas vezes deixamos fenecer
As flores que achamos no caminho;
Pensamos desvendar o pergaminho,
Depois de indecorosos nos perder.

Sonhamos com o sol do amanhecer,
Ainda quando o sono foi mesquinho;
Um se vai e o outro, tão sozinho,
Repara todo o quadro emudecer.

Pressentimos o fim do labirinto,
Quando os raios furtivos da aurora
Aquecem a inesperada solidão.

Às vezes nos guiamos por instinto,
Incautos nos lançamos mundo afora,
Ferindo sem querer um coração...

Eliton Meneses

domingo, 28 de outubro de 2018

EXPECTATIVA DO 2.º TURNO



Para um país que lê muito pouco, uma parcela considerável da população votar com um livro na mão já é uma vitória desse 2.º turno! 

***

Pensei que fosse apenas força de expressão quando os eleitores do Bolsonaro dizem: Fora PT!
Mas, não, eles realmente acreditam que o PT continua no poder, mesmo sendo o PT oposição ao Governo Temer e o PSL do Bolsonaro da base de apoio do Governo, tendo votado a favor de tudo que o Temer envia!
É um caso mesmo de paranoia coletiva...

***

Joaquim Barbosa (STF) e Rodrigo Janot (PGR), protagonistas da cruzada anti-corrupção, votam em Haddad! Por que será que os antipetistas não votam...?

***

"Me alivia saber que ninguém que admiro intelectualmente votará em Bolsonaro." (autor desconhecido)

***

Bella Ciao! Hino da resistência antifascista!

"Uma manhã, eu acordei
Querida, adeus! Querida, adeus! (...)
Uma manhã, eu acordei
E encontrei um invasor..."


quarta-feira, 24 de outubro de 2018

CIVILIZAÇÃO x BARBÁRIE


Acompanhei todas as eleições presidenciais desde a redemocratização. Em nenhuma delas o eleitorado foi tão bizarro, para dizer o mínimo, quanto o do Bolsonaro. O eleitorado do Collor, apesar de tudo, em nenhum momento fugiu da razoabilidade ou descambou para o fanatismo inconsequente. Em todas elas, o candidato que falasse alguma impropriedade sofria automaticamente uma queda na intenção de votos. Essa é a primeira em que um candidato, quanto mais absurdos fala, mais aumenta a sua chance de ganhar a eleição. Se isso é o novo, sinceramente, prefiro ficar com o velho...


*****************************************************************************

Assim como Trump não é cria do Obama, Bolsonaro não é cria do PT; Bolsonaro é cria do nosso tempo cheio de tanto ódio...


*****************************************************************************

Pelo que prega e pelo que faz, acho estranho que um anti-humano como o Bolsonaro não esteja preso;
Pelo que prega e pelo que faz, acho espantoso um sujeito desse estar há 28 anos se reelegendo como deputado federal para não fazer outra coisa que não disseminar o ódio;
Pelo que prega e pelo que faz, ainda acho inacreditável que um sujeito desse tenha a pretensão de se lançar candidato a Presidente da República;
Pelo que prega e pelo que faz, causa-me perplexidade um sujeito desse ter tirado mais de 46% dos votos válidos do primeiro turno, tendo os eleitores outras 12 opções de voto;
Mas, pelo que prega e pelo que faz, considero o cúmulo do absurdo (não tenho mesmo vocação para naturalizar o mal) um sujeito desse estar na iminência de se tornar Presidente da República, com o voto da maioria dos brasileiros...

quarta-feira, 17 de outubro de 2018

CURTAS


Há mil e uma razões para eu não votar em Bolsonaro. Cada uma suficiente per se para eu não votar nele. Uma delas é a homenagem que ele fez, no dia da votação do impeachment, ao maior torturador da ditadura militar, Carlos Alberto Brilhante Ustra. Quem faz apologia à tortura não tem meu voto, em nenhuma circunstância.

*****************************************************************************

– Por que o PT ainda tem tanto voto, mesmo depois de tanto desgaste?
– Porque o PT, ao menos num aspecto, nos dá uma garantia: o PT não vota contra o trabalhador...

*****************************************************************************

Na eleição de 1989, vovó Ritinha já dizia que Lula ia implantar a ditadura comunista no país. Se em 2018 ainda tem eleitor com esse papo furado, fica difícil culpar os políticos pelos problemas do Brasil...

*****************************************************************************

Saiam do delírio! Todos os Presidentes eleitos da Nova República, de Collor a Dilma, participaram de debate de 2.° turno. Quem foge ao debate mostra quem é: anti-democrático, arrogante e mal-intencionado.

*****************************************************************************

Esperando os Bolsominions protestarem contra o Caixa 2...


domingo, 14 de outubro de 2018

ANTI-CANDIDATO


A maior dificuldade de ataque ao Bolsonaro é que ele não é um candidato; ele é um anti-candidato. Nessa condição, ele tem uma certa imunidade. Qualquer problema que se revele a seu respeito (vida parlamentar inexpressiva, discurso de intolerância, desempenho pífio em debate, etc.), que seria naturalmente considerado pelo eleitor em relação a qualquer outro candidato, parece não afetá-lo.
Collor em 1989 suou a camisa para ganhar do Lula. Alguns atribuem a sua vitória (apertada) ao desempenho no último debate na Globo...
Mas o que fazer diante de um anti-candidato? O que fazer diante de um candidato que, por pior que fosse o seu desempenho num debate, possivelmente mais expressiva seria sua votação? O que fazer diante da tendência, motivada pelo ódio, do quanto pior melhor? O que fazer diante da naturalização do absurdo? O que fazer diante da aparente ânsia de se agarrar numa alternativa qualquer por uma exaustão da experiência da alternativa anterior oposta?
Ninguém ainda achou a resposta, sobretudo porque o anti-candidato veio a reboque de novidades – como as fake news – contra as quais o sistema ainda não tem defesa, e só tem mais 15 (quinze) dias para encontrá-la...
O tempo é curto, mas a dialética, de Heráclito a Hegel, traz sempre como resposta o tempo. Afinal, ora se caminha mais à direita, ora se caminha mais à esquerda, numa alternância que ocorre no tempo, às vezes um tempo longo, às vezes um tempo breve. Dia 28 de outubro, saberemos dimensionar o tempo...

segunda-feira, 8 de outubro de 2018

2.º TURNO



Não há duvida de que Bolsonaro continua favorito! A onda patrocinada pela mineração, pela bancada da bala e pela bancada da Bíblia não vai arrefecer da noite pro dia, com sua rede viral de 'fake news' na internet! Bolsonaro hoje não é o mesmo Bolsonaro de uma semana e meia atrás, que seria derrotado por qualquer um. Bolsonaro surpreendeu na última semana e transcendeu seus próprios limites. Esse Bolsonaro de hoje, cuja maldade, de certa forma, tem sido naturalizada, como diria Hannah Arendt, é um Bolsonaro apto a vencer qualquer candidato no segundo turno. Se houvesse mais três dias de campanha de primeiro turno, acredito que Bolsonaro liquidaria logo a fatura. Eles mergulharam na última semana para ganhar no primeiro turno. Daí a decepção de ontem. Apesar da votação muito expressiva, havia entre eles um toque de desânimo, ninguém soltou fogos na cidade, os grupos de Whatsapp em que os Bolsominions pululavam eufóricos à noite silenciaram. Noblat chegou a anunciar que a boca de urna do Ibope anunciaria a vitória no primeiro turno. Eles sentiram na boca o gosto de vitória. No entanto, logo em seguida, foi anunciada a verdadeira pesquisa boca de urna, e depois ainda vieram as urnas confirmando o segundo turno, com um candidato do PT com quase 30% dos votos válidos. Um tanto mais forte do que se esperava. Haverá segundo turno. Para quem sentiu o gosto da vitória, operando no máximo de suas forças na reta final da campanha do primeiro turno já para liquidar logo a fatura, isso não deixa de ser um tanto desolador. Reorganizar todas essas forças não é fácil num segundo turno que é longo. Não é fácil, com um candidato cheio de contradições e debilidades como Bolsonaro, ter que entrar na campanha, participar do debate, manter o nível de empolgação que antecedeu o primeiro turno, tendo curtido a sensação de vitória no primeiro turno, algo que seria humilhante para todos os partidos, mas que seria especialmente uma vitória cabal e incontestável em cima do Lulopetismo. Haverá segundo turno e o adversário continua vivo. É o PT, de novo, o adversário do segundo turno. Um adversário que está combalido, não há dúvida, mas que é um adversário que esteve presente no segundo turno das últimas 5 (cinco) eleições presidenciais (incluindo a atual) e ganhou as 4 (quatro) últimas... Não houve nenhum entusiasmo da campanha do Bolsonaro depois da votação do primeiro turno; afinal, houve uma notória frustração. Depois daquela sensação do nirvana anunciada pelo Noblat, apareceu a dura realidade, na forma de uma mensagem que ecoou das urnas: – Queremos lhe conhecer melhor! Disse a voz das urnas. Queremos lhe conhecer melhor no segundo turno! Para um candidato que se escondeu no primeiro turno e achou que assim venceria por W.O., essa mensagem não deixa de causar um certo espanto... A faixa presidencial de repente fugiu dos dedos do sonho e, já desperto, Bolsonaro olhou para frente e viu a necessidade de percorrer um nebuloso segundo turno, e olhou para trás e viu o PT, de novo ele, chegando como quem não quer nada... Um PT que foi quase a nocaute sob a máquina de desconstrução oriunda da própria política, da mídia e do judiciário. Mas um PT que também sabe muito bem, quando precisa, desconstruir adversários. Um PT, enfim, que na arte da guerra político-eleitoral, é um adversário experimentado. Um PT que, diante desse novo Bolsonaro que despontou na última semana como uma ideia que havia encontrado o seu tempo, é o único capaz de impor não apenas respeito, mas medo...

HERÁCLITO


"Ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois quando nele se entra novamente, não se encontram as mesmas águas, e o próprio ser já se modificou. Assim, tudo é regido pela dialética, a tensão e o revezamento dos opostos. Portanto, o real é sempre fruto da mudança, ou seja, do combate entre os contrários." (Heráclito)

domingo, 7 de outubro de 2018

JOÃO CAVOQUEIRO


Sob o sol do meio dia, João Cavoqueiro aprontava a massa da obra. Era servente e ajudava na reforma da casa do vizinho. Na noite anterior havia participado da reunião da CEB's no Sumaré. João não fazia mal a uma mosca. Era querido em toda Sobral. Vivia num casebre humilde da Betânia, sem saber ler ou escrever. Os padres o haviam convencido a participar do movimento social da igreja. Naquele ano de 1971, João tinha 26 anos, uma mulher de 24 e dois filhos. 
Quem estava na rua estranhou quando o caminhão do Exército parou perto da casa do servente; estranhou mais ainda quando desceu um batalhão de soldados enfileirados como numa operação de guerra e o cercaram. Um oficial se dirigiu a João, apontou o dedo em riste em sua direção e gritou:
– Subversivo! 
Uma multidão de curiosos se aproximou perplexa para testemunhar a prisão do até então pacato e irrepreensível João Cavoqueiro. Sem mais nenhuma explicação, algemaram-no e levaram-no não se sabe para onde.
Oito meses depois, a mulher e os filhos já estavam sem esperança de reencontrá-lo. No entanto, novamente no mormaço do meio dia, um caminhão do Exército parou perto da casa de João e o soltou na rua para o espanto de poucos curiosos. 
João estava de pé, mas tremia dos pés à cabeça. Depois de um instante parado, dirigiu-se lento e trôpego à sua casa, apoiando com dificuldade no chão cada passo, até chegar à porta, sem ninguém atrever-se a socorrê-lo. Não conseguiu explicar o que lhe fizeram, não conseguiu mais falar, não conseguiu mais trabalhar, nunca mais voltou a sorrir. João Cavoqueiro morreu três anos depois. Devolveram-no apenas como prova de como o regime tratava as pessoas subversivas.

quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Pós-verdade


Soube de uma juíza que afirma estar em dúvida acerca da condição de torturador do Brilhante Ustra, apontado pela História como o maior torturador da Ditatura Militar de 64/85, uma vez que ela estaria investigando os fatos e, segunda ela, era preciso ouvir não apenas a versão dos guerrilheiros torturados, mas também a versão do torturador, no caso, contada num blog da mulher do Brilhante Ustra...
A juíza parece querer dar uma sentença sobre a condição do torturador a partir de um contraditório empírico extemporâneo, tentando reescrever a história sem qualquer preocupação com o método histórico-científico, mas com uma convicção típica do nosso tempo de pós-verdade, em que o senso comum busca a todo custo subverter a ciência.
A juíza parece esquecer que não foram apenas os guerrilheiros as vítimas da tortura praticada pela Ditadura Militar, eis que muita gente não-guerrilheira e inclusive muita gente sem qualquer envolvimento político foi parar nos porões do DOI/CODI.
A juíza parece esquecer que a oitiva da versão do torturador, por mais perfeita que fosse, jamais justificaria a barbárie que representa a tortura praticada pelo Estado.
A juíza parece esquecer que, embora, em regra, o Judiciário julgue, é a história o juiz final do Direito. Nas palavras do poeta alemão Schiller: "Die Weltgeschichte ist das Weltgericht."
É natural que essa juíza se julgue imparcial para julgar o passado e o presente, dos fatos mais prosaicos aos mais relevantes para o futuro do País; é natural também que ela repute mais certa a sua sentença do que a sentença da história e é natural, por fim, e nem precisaria dizer, que ela apoie para a Presidência da República um candidato cujo nome é melhor nem mencionar...