quarta-feira, 14 de novembro de 2012

FORTALEZA X OESTE. ENTRE A DOR E A VIOLÊNCIA



Senhores, me permitam deixar os trocadilhos de lado. Pelo sentimento em preto e branco, tinha tudo pra dizer que acompanhei o jogo de domingo de maneira quase "imparcial"! Seria tão mais fácil chegar e dizer que fui simplesmente trabalhar e "cumprir o meu mister". Entretanto, o verdadeiro torcedor tricolor mexeu comigo! No último domingo, confesso, as cores se confundiram. O sentimento bateu mais forte e a imparcialidade, que nunca foi meu forte, ficou pra trás!
Começo o relato agradecendo a honra de ser escalado pelo companheiro, Dr. José Vagner de Farias, para atuar no Juizado do Torcedor durante a partida Fortaleza x Oeste. "Bohemias" de sábado a noite temporariamente deixadas de lado, sempre tive a consciência de que domingo seria dia de chegar cedo pra sair tarde, procurando observar cada detalhe de um jogo... "que entraria para a história"!
Chego no estádio 14:15 da tarde! Quase duas horas antes da partida! Em meio a cumprimentos, encontros e conversas sobre o futebol da minha terra, sou informado de que o trabalho está por começar! Entre usuários de droga e cambistas, as primeiras ocorrências aparecem! É, amigo... o jogo promete! Não só em campo, como fora dele!
Em meio a isso, arrumo um espaço e vou aos camarotes! De lá observo a multidão que se acomoda! São 15:00 horas e não é exagero dizer que, se você não saiu de casa, é melhor nem mais sair! Faltam poucos lugares a serem preenchidos no PV! Nas cadeiras especiais, já lotadas e sem qualquer senão de espaço, uma cena curiosa chama a atenção: uma família joga cartas enquanto o tempo passa! Que festa da família tricolor!!!
Retornando ao ofício, o "kit Juizado" já está preparado! Tem fruta, esfirra do Habbib’s e refrigerante! Mas, desta feita, o item essencial é o velho... "radinho de pilha"! Não tem mesmo como ver o jogo!
Dou um pulo no espaço... e passo! O Oeste já vence! E vence por 2 x 1! São passados cerca de 27 minutos do 2.º tempo quando, finalmente, retorno aos camarotes do estádio! De lá, vendo um placar quase definido, observo, então, o movimento dos torcedores.
No estádio, poucos se levantam! Mas os que ainda acreditam, surpreendentemente, não estão nas organizadas! Estão à minha frente! Estão nas cadeiras, nas arquibancadas, estão trajados, estão sozinhos! São os tidos "torcedores comuns" do Fortaleza que, em meio a uma desilusão iminente, dão uma verdadeira lição de amor ao clube! Eles gritam o que podem por fora, enquanto sentem a dor chegar mais forte por dentro!
Desorganizados ou não, uns gritam uma coisa, outros outra, mas todos, juntos, têm um único objetivo: O Fortaleza Esporte Clube! Ali eu vi quem fazia parte da chamada "Força Tarefa Tricolor" tão bem descrita pelo narrador Carlos Fred da Radio FM 92!
Perguntinha: Onde estão as organizadas? Atrás de cada gol, certamente! Mas confesso que eu nem as tinha percebido até... o terceiro gol do Oeste! Ali elas entram em cena! Aparecem pela violência! Eram cadeiras voando, batendo ou atravessando o vidro de proteção! Juro que, mesmo de longe, vi um "TUF" – Torcedor Uniformizadamente Falso – arremessar uma cadeira contra um Policial Militar
A você, Torcedor Uniformizadamente Falso, eu posso dizer: O teu comportamento desonra uma tradição de 94 anos! E, enquanto tiver um comportamento assim, você não é digno de vestir a festiva camisa vermelha, azul e branca!
O saldo, contabilizado ao final de domingo, somava 263 cadeiras quebradas! Dessas, 209 estavam do lado da TUF e 33 na JGT! Juntas, as Torcidas Organizadas respondem por 92% da "baderna" que ocorreu no Estádio Presidente Vargas. A TUF, "sozinha", mesmo proibida de ir ao estádio, responde por cerca de 80% do prejuízo! O "torcedor comum", aquele que eu vi "gritar doloridamente apaixonado" na hora que o time mais precisou, quebrou apenas 21 cadeiras!
O jogo termina! Mas a emoção ainda não acabara! E eu me volto, então, para o setor das cadeiras especiais. Passeando rapidamente meus olhos, deparo com um pai de família. Uniformizado, ele tem um garoto de 08 ou 09 anos, nada mais do que isso! Não sei porque meus olhos ali fincaram! E ele olha pro menino... E olha pro campo! E olha pro menino de novo.... Ele quer falar.... Ele balbucia alguma coisa... Sinceramente, creio que não saiu nada! Ele havia levado o filho para uma festa! Mas, devagarinho, eu o vi pegar o menino pelo braço e, silenciosamente, descer cada degrau daquela escada! Não existe o que descreva o sentimento de ver aquela cena!
Ao final, olhando pela última vez pro campo de jogo, eu ainda o vi puxar um tímido aplauso quando da saída do Oeste! Meu Deus, que cena era aquela! Doloridamente... Aquele torcedor ainda encontrava forças para reconhecer o adversário! E que lição aquele filho recebia! O respeito em meio à derrota e à dor! Esse é o verdadeiro torcedor do Fortaleza que eu conheço! Que eu conheço! Digno e respeitável! Você, sim, merece o meu sentimento!
Intuitivamente concentrado, quando dou por mim, me vi fazendo a mesma coisa... Aplaudindo o time do Oeste enquanto o coração se trancava, timidamente, sentindo um pouco de dor! Certamente, posso dizer, era a dor daquele pai que eu sentia um pouco comigo!
Mas é pra você, pai de família, amigo que eu não conheço e nunca vi, um verdadeiro exemplo de torcedor do Fortaleza, que eu posso dizer: "Outros outubros virão!"... Outros jogos do acesso acontecerão e, quando finalmente esse time retornar e o grito, hoje preso, começar a ecoar, tenha certeza... Você será a primeira pessoa de quem eu vou me lembrar!

Raphael Esmeraldo Nogueira
Cronista

Um comentário:

Eliton Meneses disse...

Mais uma peça antológica de um amigo cronista que escreve com o pulsar do coração - quase sempre alvinegro!