quinta-feira, 29 de novembro de 2012

AS LUZES DO ORIENTE



"Terra! Por mais distante. O errante navegante. Quem jamais te esqueceria?"
Na bela fotografia espacial do nosso planeta, pode-se divisar a noite que chega na Ásia, enquanto a tarde ainda alumia a África e a Europa, despertando particular atenção: a) a imensidão desértica do Saara; b) a dádiva do Nilo serpenteando as areias do Egito, com seu delta invadindo o Mediterrâneo; c) a também desértica península arábica com as luzes destacadas de Riad, ao centro, e as de Abu Dhabi e Dubai, no pórtico do Golfo Pérsico; d) o clarão de Moscou, Teerã, Karachi, além de "constelações" que percorrem o continente até a Sibéria; e) a miríade de "estrelas" da Índia, a revelar o enorme adensamento populacional (...)
Com um clique na imagem, pode-se vê-la ampliada.  

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

COREAÚ, A PALMA DO MEU CORAÇÃO!



Acredito que dentro de cada um de nós subsiste um pouco de Casimiro de Abreu (1839-1860), ultrarromântico brasileiro, autor do inesquecível poema ´Meus oito anos´, cujos versos iniciais transcrevo: ´Oh! Que saudades que eu tenho/ Da aurora da minha vida/ Da minha infância querida/ Que os anos não trazem mais! (...)´.

Evoco o poeta da ´aurora da vida´ porque as rememorações e as emoções da meninice me têm visitado frequentemente. Da última vez que permearam meu âmago, deixaram um rastro de nostalgia. Foi numa madrugada fria do ano em curso. A chuva intermitente testemunhava uma noite dilatada, atochada pelas mais variadas sensações, que se alternavam entre uma suprema felicidade e uma estonteante angústia. Vieram-me reminiscências de Coreaú, meu torrão natal, ainda chamado Palma, na década de 1970. Passou em minha mente um filme colorido pelos matizes da saudade. Palma, topônimo sobrecarregado de encantos. Ele sucumbe-me à doçura de uma infância ingênua. Naquela época, a Palma tinha nuances de uma terra idílica, impregnada de magia, eternamente próspera. Tudo era belo e fascinante. Os pontos de encontros, o ambiente escolar e suas atividades intercolegiais, o grupo de jovens, a iniciação religiosa, as brincadeiras de rua, os banhos na nossa famosa barragem e nos açudes aos arredores, eram uma constante. O comércio no ´Rabo da Gata´, a turma do Alto São José e da Rua do Cemitério; a Banda de Música com Chico Irineu, Cordeiro, Chico Amadeu, Canarinho. O cântico do hino de Nossa Senhora da Piedade era mavioso e inebriava-me. A coluna da hora. O sacristão Aldenor Irineu e o repique dos sinos da Igreja. Todo e qualquer tipo de novidade chegava com estima. Havia os tipos humanos indeléveis do nosso folclore, como Raimundo Estopa e Maria Samuel. Os parentes e amigos que vinham da capital, em tempo de férias, com as novidades, exultavam-me a alma. Quando os palmenses falavam da Palma, falavam com ufania. Hoje, Coreaú tem outra face, todavia ainda bela. Mesmo sabendo que a infância não significa o paraíso, deixo, pois: ´Que as lembranças da antiga Palma,/ mesmo sendo Coreaú, hoje em dia,/ Invadam, adentrem em minha alma,/Embora não passem, amiúde, de uma breve nostalgia´.

Fernando Machado Albuquerque
Professor e membro da APL

terça-feira, 27 de novembro de 2012

PAI É O QUE CRIA



Há 03 (três) critérios para o estabelecimento do vínculo de paternidade. O critério jurídico prevê um sistema de presunção na hipótese de casamento civil. Os filhos nascidos até 180 (cento e oitenta) dias depois de estabelecida a convivência conjugal e até 300 (trezentos) dias depois de dissolvida a sociedade conjugal, v.g., presumem-se concebidos na constância do casamento, atribuindo-se a paternidade ao marido, independentemente da verdade biológica: pater is est quem justae nuptiae demonstrant (art. 1.597, Código Civil). É a regra do pater est, não estendida, injustificadamente, para a união estável, cabendo ao intérprete colmatar a lacuna. O critério biológico indica a paternidade a partir do vínculo de consanguinidade. Com a descoberta dos marcadores genéticos e a popularização do exame de DNA, está havendo uma corrida em busca da "verdade real". O critério socioafetivo estabelece a paternidade com olhos postos no efetivo exercício da função de pai, independentemente do vínculo sanguíneo. Pai é aquele que cria o filho com afeto, dando-lhe amor e participando de sua vida; genitor é somente o que gera.     
A paternidade socioafetiva não é uma mera elucubração doutrinária, possuindo respaldo legal, visto que o art. 1.593 do Código Civil admite que o parentesco resulte da consanguinidade ou de outra origem, tendo-se tornado o critério prevalecente na jurisprudência dos Tribunais pátrios, de sorte que somente na ausência da filiação socioafetiva deverá ser prestigiada a paternidade biológica. 
Noutro passo, como o reconhecimento do estado de filiação é um direito personalíssimo, indisponível e imprescritível (art. 27 do Lei nº 8.069/90), nada obsta que o filho, com base no seu direito fundamental à identidade, procure descobrir, inclusive com o manejo de uma ação de investigação de paternidade, quem é seu pai biológico. No entanto, caso já haja a paternidade socioafetiva, a paternidade biológica não produzirá efeitos registrais, ou seja, mesmo descobrindo o seu pai biológico, suprida a necessidade psicológica de conhecê-lo, o filho continuará com o pai socioafetivo no convívio e na certidão de nascimento, para todos os fins legais, ressalvados somente os impedimentos matrimoniais, dada a vedação ao incesto. Nesse sentido: STJ, REsp 119.346/GO, 4.ª T., rel. Min. Barros Monteiro, DJU 23.06.2003.
É o direito prestigiando a realidade da vida, a posse do estado de filho, situação em que a paternidade é construída no dia a dia, para além de um solitário dado, consagrando a sabedoria popular, que, para o alívio de muitos pais desconfiados, sempre sentenciou: "Pai é o que cria!"

domingo, 25 de novembro de 2012

TENDÊNCIA PROVINCIANA



É interessante como a mesma imprensa que trata com insensibilidade e escárnio a criminalidade suburbana noticia com tanto subterfúgio e melindre um episódio criminal envolvendo o filho do político Ciro Gomes.
Há até jornalista que prefere não fornecer maiores informações sobre o caso, partindo às pressas para uma defesa devotada do irascível moçoilo casadoiro. A droga encontrada com o rapaz não é sequer mencionada no noticiário provinciano, que trata o episódio tendenciosamente como um corriqueiro acidente de trânsito.
Em tempos de concentração oligárquica absolutista, a imprensa tradicionalmente conservadora do Estado está deitada em "berço esplêndido"...
Já o povo... "Escreveu não leu, o cartão comeu! Do pescoço pra baixo é canela!" 

sábado, 24 de novembro de 2012

BELCHIOR: ENTRE O SONHO E AS DÍVIDAS



A dívida desse senhor é absolutamente sanável porque mensurável e finita. A grande notícia que poderia ser explorada seria nossa dívida para com o poeta, essa sim é extraordinária, posto que incomensuráveis as alegrias, possibilidades líricas e poéticas legadas por sua obra. Belchior, como Rimbaud, Baudelaire e Poe, sente a dimensão mágica e superior do sonho que a vida carrega silenciosamente, acalentada em nós. É como se cochichassem permanentemente em nossos ouvidos: o vil metal, o pão, o aluguel são como os tijolos e argamassa do grande farol, sustentando a luz que busca incessantemente no horizonte: Vida!

Gilmar Paiva
Do Palavra Latina

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

ENTRE O RISOTO E A DAMURIDA


O chefe da repartição costumava dizer que, se alguém não tivesse feito nada de extraordinário até os 30 anos de idade, não o faria mais a partir daí. Como num golpe do destino, aos 30 anos fui nomeado para outro cargo público em Roraima. Não hesitei, arrumei as malas e, num misto de saudade e de expectativa, apanhei o voo. Na conexão em Brasília, na fila para o voo com destino a Boa Vista, chamou-me a atenção um acalorado debate acerca da demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em vias de ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal. 
Um empresário roraimense, nascido no Ceará, defendia a demarcação descontínua, sustentando a necessidade da produção de arroz para o progresso econômico do Estado, a contribuição do empresariado para a criação de emprego e renda, o interesse das ONGs internacionais nos minérios da reserva, o direito de permanência dos fazendeiros tradicionais da área, a preguiça dos índios... 
A confrontá-lo, um cantor roraimense, também nascido no Ceará, defendia a demarcação contínua da reserva, retrucando que a produção de arroz pertencia a meia dúzias de latifundiários que exploravam a mão-de-obra semi-escravizada de muitos índios, exportando praticamente toda a produção para outros Estados com isenção fiscal conferida pelo Governo do Estado de Roraima; que os missionários vinculados a ONGs com acesso à reserva nunca haviam demonstrado interesses outros para além da proteção dos índios e do meio ambiente (ao contrário dos rizicultores); que os fazendeiros tradicionais, indenizados para a desocupação, haviam se instalado em terras historicamente ocupadas por macuxis, wapichanas, taurepangs, ingaricós e patamonas e que os índios trabalham somente na medida de suas necessidades, sem preocupações com o acúmulo de capital, não por preguiça, mas por hábito sociocultural que não era da conta do "homem branco".
Na última chamada do voo, de repente o entusiasmo do cantor serenou e, tocando no punho e mirando nos olhos do empresário, lhe disse:
– Meu caro, você é empresário e, como tal, está defendendo os interesses da elite que domina o capital; eu sou um cantor de música regional e, como artista, defendo os interesses de prostitutas, homossexuais, negros, pobres e índios!  
Não contive minha queda quixotesca e, já no avião, parabenizei o artista pelo seu desempenho no debate, convicto de que Roraima me reservaria fortes emoções, além de muitas lições para aprender.   

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

HISTÓRIA SEM FIM: ISRAEL X PALESTINA



O conflito entre Israel e Palestina possui raízes muito mais complexas do que supõe nossa vã filosofia ocidental, envolvendo, num só cadinho, ingredientes étnicos, culturais, religiosos, políticos e territoriais. Não há encará-lo com maniqueísmos reducionistas.   
Em 1897, durante o 1.º Congresso Sionista, realizado na cidade suíça de Basileia, ficou decidido que os judeus retornariam a Jerusalém, de onde haviam sido expulsos pelos romanos no século III d.C. A partir daí, teve início a emigração para a Palestina, que, à época, estava incorporada ao Império Otomano. Os confrontos se tornaram mais violentos à medida que a imigração aumentava. Durante a 2.ª Guerra Mundial o fluxo migratório aumentou significativamente por conta da fuga dos judeus das perseguições nazistas na Europa. Em 1947, a ONU tentou solucionar o problema, propondo a divisão territorial da Palestina, em uma parte árabe e outra judia, ficando Jerusalém como enclave internacional. Os árabes não aceitaram a proposta. No dia 14 de maio de 1948, Israel declarou sua independência. Os exércitos do Egito, Jordânia, Síria e Líbano atacaram o nascente Estado judeu, mas foram derrotados. Em 1967, na "Guerra dos Seis Dias", Israel derrotou o Egito, a Síria e a Jordânia, conquistando a Cisjordânia, as Colinas de Golã, a parte oriental de Jerusalém e a Faixa de Gaza. Em 1973, o Egito e a Síria lançaram uma ofensiva contra Israel no feriado do "Yom Kippur", ou "Dia do Perdão", mas foram novamente derrotados. Em 1987, ocorreu a 1.ª Intifada, uma rebelião em que a população civil da Palestina atirou paus e pedras contra militares israelenses, em protesto contra a presença judia nos territórios ocupados durante a "Guerra dos Seis Dias". Os israelenses atiraram e mataram crianças que jogavam pedras nos tanques de guerra, provocando indignação na comunidade internacional. A 2.ª Intifada ocorreu em setembro de 2000, depois de o então primeiro-ministro israelense, Ariel Sharom, ter caminhado pela Esplanada das Mesquitas e pelo Monte do Templo, em Jerusalém, área considerada sagrada tanto pelos árabes quanto pelos judeus. A despeito das negociações, dos atentados e boicotes palestinos e da Resolução n.º 242 da ONU, Israel reluta em se retirar das áreas conquistadas durante a "Guerra dos Seis Dias", embora tenha retirado, em 2005, todos os seus colonos da Faixa de Gaza, cujo controle do espaço aéreo e do acesso marítimo ainda mantém. Em junho de 2007, a autoridade nacional palestina se dividiu, depois de violentos confrontos, entre os partidos Hamas, que passou a controlar a Faixa de Gaza, e o Fatah, que manteve o controle da Cisjordânia.  
A Palestina é uma estreita faixa de terra, desértica, sem petróleo e sem recursos minerais estratégicos. Os hebreus, povo do qual descendem os judeus, foram os seus primeiros habitantes, estando na região desde 2000 anos a.C. Os judeus, mesmo dispersos pelo mundo, sempre preservaram, além de suas tradições e costumes, uma profunda consciência nacional. Os povos árabes habitam a região desde o surgimento do Islamismo, no século VII, mesmo não tendo instituído um Estado palestino independente.
Jerusalém é considerada uma cidade sagrada para os judeus desde que o Rei Davi a proclamou como capital do seu reino no século X a.C. É também a 3.ª cidade mais sagrada do Islamismo, atrás somente de Meca e Medina. Os muçulmanos acreditam que Maomé teria sido transportado numa noite de Meca para o Monte do Templo em Jerusalém, tendo daí ascendido ao Paraíso.
Em Israel, atualmente, vivem cerca de 7 milhões de judeus e 1,4 milhão de árabes palestinos, que também desfrutam de cidadania israelense, mas reclamam amiúde de discriminação política e de receberem menos subsídios do Estado para financiar, por exemplo, educação e moradia.
A maioria dos países árabes, simpáticos à causa palestina, não reconhecem a independência do Estado judeu. Israel sobrevive, no cerco de hostilidade regional, mercê da "superioridade militar" patrocinada pelos Estados Unidos. No sangrento conflito, há abusos de ambos os lados, a afligir particularmente a população civil.
Na disputa por uma "terra santa" entre dois povos tão ricos culturalmente, com histórico comum de sofrimento, talvez nenhum deles tenha razão, porque ambos insuflam e perpetuam o conflito com o sopro da intolerância e da intransigência. Assim, a região que originou as três principais religiões monoteístas do mundo, e ensinou tantos valores à humanidade, ainda não aprendeu a respeitar as diferenças e a viver em paz. A convivência harmônica entre judeus e palestinos é uma estrela que ainda não despontou no horizonte do Oriente Médio.
O abraço sincero e fraterno de dois meninos amigos, um judeu e outro palestino, relembra a lição de Jesus Cristo de que é preciso ser como as crianças para se alcançar o "Reino dos Céus".
Eli, Eli, lama sabachthani?

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

UMA NOVA VANGUARDA



Há países em que a tolerância é uma tradição legalizada. Na Holanda, há mais de 10 (dez) anos o casamento de pessoas do mesmo sexo e a adoção de criança por casal homoafetivo são permitidos legalmente. No mesmo passo liberal, caminham países como Suécia, Noruega, Islândia e Canadá, com afinidades histórico-culturais.  
Há ainda outros países em que a tolerância não é propriamente uma tradição, mas o resultado da luta recente pela reconquista da democracia. É o caso da Argentina pós-ditadura militar, da Espanha pós-Franco, da África do Sul pós-apartheid e de Portugal depois da "Revolução dos Cravos". Todos esses países aprovaram leis progressistas no tocante aos direitos dos casais homoafetivos. Ou seja, onde a democracia foi oprimida, a liberdade ressurge com particular vigor.   
Noutros países, porém, inclusive nalguns historicamente vanguardistas, como a França, uma onda conservadora se insurge contra o reconhecimento do direito à igualdade das pessoas. No país da Revolução de 1789 e do Maio de 1968, no último sábado, mais de 100.000 (cem mil) manifestantes foram às ruas, pela primeira vez maciçamente, protestar contra os direitos dos casais homoafetivos. "(...) plus de 100 000 opposants au mariage et à l'adoption pour les homosexuels ont pour la première fois massivement fait entendre leur voix samedi 17 novembre, avec des manifestations dans plusieurs villes." (Le Monde) 
Na vanguarda do reconhecimento dos direitos humanos está quem possui tradição de tolerância e quem herdou a tolerância da luta recente pela redemocratização. Muitos países que reivindicam a condição de avançados socialmente, ao negarem a igualdade entre as pessoas, parecem ter esquecido que a humanidade não parou de inventar novas formas de casamento e de descendência e que tolerar as diferenças não é somente uma virtude, mas também um dever individual e social.

domingo, 18 de novembro de 2012

ROYALTIES DO PETRÓLEO. VETAR OU NÃO VETAR?



A Câmara aprovou, no dia 06.11.2012, o Projeto de Lei do Senado Federal que cria novas regras de distribuição dos royalties do petróleo. Com a nova lei, os Estados produtores, que mais sofrem com os danos ambientais, podem perder até R$ 77 bilhões até 2020. Nas contas do Governo do Estado do Rio de Janeiro, 92 municípios teriam no total perdas de R$ 38 bilhões e o Estado R$ 39 bilhões. Alguns desses 92 municípios do Rio de Janeiro dependem mais de 50% da receita dos royalties. Ou seja, a aprovação do projeto criaria um cenário de caos absoluto nas finanças dos municípios fluminenses.
As bancadas do Rio de Janeiro e do Espírito Santo na Câmara Federal entraram com pedido de liminar no STF (Supremo Tribunal Federal) para suspender a tramitação do projeto que reduz a receita dos dois Estados, maiores produtores de petróleo do país, porém sem sucesso, pois o projeto foi aprovado e segue para sanção presidencial.
Como já passou pelo Senado e não sofreu alteração, o projeto, para se converter em lei, precisa passar pela sanção presidencial, o que deverá acontecer em até 15 dias após a presidente receber o projeto. O Governo do Estado do Rio de Janeiro espera que Dilma Rousseff vete esse projeto. Se isso não ocorrer, o Estado deve ingressar com uma ação no STF.
Os Governos dos Estados não têm em mente nenhum "plano B" caso saiam derrotados na distribuição dos royalties do petróleo.
Sob pressão dos governadores dos Estados produtores, Dilma disse no Palácio do Planalto: "Eu não tenho a lei, eu vou avaliar a lei. Eu nunca nem vi ela ainda. Eu seria uma pessoa leviana se, sem recebê-la, eu falasse sobre ela.".
Anthony Garotinho (PR-RJ) afirma que, ou a presidente Dilma veta, ou está decretada a falência do Rio de Janeiro.

Marinara Albuquerque
Rio de Janeiro/RJ

TEORIA DO DOMÍNIO DO FATO


Nos crimes cometidos mediante concurso de pessoas (mais de um agente), o Código Penal distingue duas figuras: a autoria e a participação. O art. 29 do Código Penal dispõe que: "Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade". Noutro passo, o art. 62, inciso IV, determina a majoração da pena em relação ao agente que executa o crime, ou nele participa, mediante paga ou promessa de recompensa. A pena deve ser maior para o autor e menor para o partícipe.
Há 03 (três) teorias, basicamente, sobre a distinção entre autoria e participação.
A teoria restritiva adota o critério formal-objetivo e considera que é autor do crime somente aquele que realiza a conduta principal descrita no tipo penal, ou seja, somente quem pratica a ação descrita no núcleo verbal do tipo. No homicídio, quem mata; no furto, quem subtrai; no estelionato, quem obtém vantagem ilícita etc. O partícipe é aquele que, sem praticar a ação descrita no núcleo do tipo, concorre de qualquer modo para a sua realização, mediante ação diversa daquela descrita no núcleo verbal do tipo.
A teoria extensiva adota o critério material-subjetivo e considera autor não somente aquele que pratica a ação descrita no núcleo do tipo, mas também quem concorre de qualquer modo para a realização do crime, não fazendo qualquer distinção entre autor e partícipe.
A teoria do domínio do fato parte da teoria restritiva e adota um critério objetivo-subjetivo, considerando autor aquele que dirige a ação, com o completo domínio sobre a produção do resultado, e partícipe aquele que, sem possuir o controle final da ação, concorre, como "figura paralela", para o resultado do crime. Assim, pela teoria do domínio do fato, o "autor intelectual" seria, de fato, o seu autor, haja vista que, mesmo sem praticar a conduta descrita no núcleo verbal do tipo, o agente planeja toda a ação delituosa, coordena e dirige a atuação dos demais agentes.
O Código Penal brasileiro adotou a teoria restritiva. No concurso de pessoas, autor do crime é somente aquele que realiza a conduta principal descrita no tipo penal e partícipe aquele que concorre de qualquer outro modo para a sua realização.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do "mensalão", ainda assim, adotou a teoria do domínio do fato para majorar a pena do ex-ministro José Dirceu, ao arrepio do disposto no Código Penal.
O alemão Claus Roxin, autor da teoria do domínio do fato, de passagem pelo Rio de Janeiro, afirmou que: "Quem ocupa posição de comando tem que ter, de fato, emitido a ordem. E isso deve ser provado", não bastando, portanto, meros indícios.
Num julgamento histórico em que se acusam determinados setores da imprensa de promover, de modo tendencioso, um clamor público por condenações severas, a adoção da teoria do domínio do fato pelo STF no "mensalão" causa, no mínimo, estranheza, conquanto convenha ressaltar que a adoção de teoria diferente não importaria a absolvição do ex-ministro José Dirceu, mas possivelmente apenas a diminuição da pena pela condição de partícipe.

MESTRE LUCAS EVANGELISTA



Lucas Evangelista, poeta cordelista e repentista, nasceu em 06 de maio de 1937, em Crateús/CE. O poeta, ainda na infância, teve contato com a literatura de cordel por intermédio de seus pais, que costumavam cantar e recitar histórias tradicionais. Residindo em Fortaleza, iniciou a vida de vendedor de folheto de cordel e violeiro, fazendo a sua primeira apresentação na Praça dos Leões. Depois, na companhia do irmão, Pedro Evangelista, também poeta e repentista, passou a cantar em outras praças da capital, partindo daí para o interior e outros estados. Publicou centenas de "romances", folhetos e gravou centenas de canções e poemas de cordel. A origem popular de suas canções levaram cantores como Frank Aguiar e grupos como Mastruz com Leite a gravarem suas músicas e poemas. Lucas Evangelista, que possui o título de mestre da cultura tradicional popular, outorgado pelo Governo do Estado, percorre as praças e feiras do interior cearense (inclusive as de Coreaú), divulgando sua arte, contando atualmente com a companhia da violeira Luzia Dias (foto), com quem gravou alguns CD's.
Na X Bienal Internacional do Livro do Ceará, na companhia de Fernando Deda e João Teles, cumprimentamos, com reverência, esse ícone da literatura de cordel do Estado do Ceará. 

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

BIENAL INTERNACIONAL DO LIVRO DO CEARÁ



Num recém-inaugurado Centro de Eventos do Ceará que retrata a megalomania e a insensibilidade social, especialmente com a acessibilidade, do atual Governo do Estado, transcorre até domingo a 10.ª Bienal Internacional do Livro do Ceará. Aliás, de internacional o evento só tem praticamente o nome, eis que não conta com uma única editora ou livraria do exterior comercializando seus livros.
Ainda assim, há aspectos positivos a serem ressaltados. O mais relevante é a justa homenagem à Padaria Espiritual, movimento literário cearense que, de fato, deflagou o Modernismo no Brasil, antecipando-se à Semana de Arte Moderna.
Rendeu-se ainda uma louvável ênfase à literatura de cordel, fazendo-se presente ao evento mestres da cultura popular, como Lucas Evangelista e outros tantos, que vendem seus romances ao mesmo tempo em que se apresentam para o público declamando suas poesias.
Autores cearenses também mereceram destaque, seja com novos lançamentos, seja com a divulgação de livros já consagrados, como a História do Ceará de Aírton de Farias, que está no evento distribuindo simpatia e autografando sua obra.
O enorme volume de obras voltadas para o público infantil também surpreende e merece aplauso, inclusive pelo preço relativamente acessível.  
De modo geral, o evento é extremamente recomendável, para crianças e adultos, preferencialmente com tempo e paciência para uma boa "garimpagem" e, óbvio, algum crédito no cartão...   

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

FORTALEZA X OESTE. ENTRE A DOR E A VIOLÊNCIA



Senhores, me permitam deixar os trocadilhos de lado. Pelo sentimento em preto e branco, tinha tudo pra dizer que acompanhei o jogo de domingo de maneira quase "imparcial"! Seria tão mais fácil chegar e dizer que fui simplesmente trabalhar e "cumprir o meu mister". Entretanto, o verdadeiro torcedor tricolor mexeu comigo! No último domingo, confesso, as cores se confundiram. O sentimento bateu mais forte e a imparcialidade, que nunca foi meu forte, ficou pra trás!
Começo o relato agradecendo a honra de ser escalado pelo companheiro, Dr. José Vagner de Farias, para atuar no Juizado do Torcedor durante a partida Fortaleza x Oeste. "Bohemias" de sábado a noite temporariamente deixadas de lado, sempre tive a consciência de que domingo seria dia de chegar cedo pra sair tarde, procurando observar cada detalhe de um jogo... "que entraria para a história"!
Chego no estádio 14:15 da tarde! Quase duas horas antes da partida! Em meio a cumprimentos, encontros e conversas sobre o futebol da minha terra, sou informado de que o trabalho está por começar! Entre usuários de droga e cambistas, as primeiras ocorrências aparecem! É, amigo... o jogo promete! Não só em campo, como fora dele!
Em meio a isso, arrumo um espaço e vou aos camarotes! De lá observo a multidão que se acomoda! São 15:00 horas e não é exagero dizer que, se você não saiu de casa, é melhor nem mais sair! Faltam poucos lugares a serem preenchidos no PV! Nas cadeiras especiais, já lotadas e sem qualquer senão de espaço, uma cena curiosa chama a atenção: uma família joga cartas enquanto o tempo passa! Que festa da família tricolor!!!
Retornando ao ofício, o "kit Juizado" já está preparado! Tem fruta, esfirra do Habbib’s e refrigerante! Mas, desta feita, o item essencial é o velho... "radinho de pilha"! Não tem mesmo como ver o jogo!
Dou um pulo no espaço... e passo! O Oeste já vence! E vence por 2 x 1! São passados cerca de 27 minutos do 2.º tempo quando, finalmente, retorno aos camarotes do estádio! De lá, vendo um placar quase definido, observo, então, o movimento dos torcedores.
No estádio, poucos se levantam! Mas os que ainda acreditam, surpreendentemente, não estão nas organizadas! Estão à minha frente! Estão nas cadeiras, nas arquibancadas, estão trajados, estão sozinhos! São os tidos "torcedores comuns" do Fortaleza que, em meio a uma desilusão iminente, dão uma verdadeira lição de amor ao clube! Eles gritam o que podem por fora, enquanto sentem a dor chegar mais forte por dentro!
Desorganizados ou não, uns gritam uma coisa, outros outra, mas todos, juntos, têm um único objetivo: O Fortaleza Esporte Clube! Ali eu vi quem fazia parte da chamada "Força Tarefa Tricolor" tão bem descrita pelo narrador Carlos Fred da Radio FM 92!
Perguntinha: Onde estão as organizadas? Atrás de cada gol, certamente! Mas confesso que eu nem as tinha percebido até... o terceiro gol do Oeste! Ali elas entram em cena! Aparecem pela violência! Eram cadeiras voando, batendo ou atravessando o vidro de proteção! Juro que, mesmo de longe, vi um "TUF" – Torcedor Uniformizadamente Falso – arremessar uma cadeira contra um Policial Militar
A você, Torcedor Uniformizadamente Falso, eu posso dizer: O teu comportamento desonra uma tradição de 94 anos! E, enquanto tiver um comportamento assim, você não é digno de vestir a festiva camisa vermelha, azul e branca!
O saldo, contabilizado ao final de domingo, somava 263 cadeiras quebradas! Dessas, 209 estavam do lado da TUF e 33 na JGT! Juntas, as Torcidas Organizadas respondem por 92% da "baderna" que ocorreu no Estádio Presidente Vargas. A TUF, "sozinha", mesmo proibida de ir ao estádio, responde por cerca de 80% do prejuízo! O "torcedor comum", aquele que eu vi "gritar doloridamente apaixonado" na hora que o time mais precisou, quebrou apenas 21 cadeiras!
O jogo termina! Mas a emoção ainda não acabara! E eu me volto, então, para o setor das cadeiras especiais. Passeando rapidamente meus olhos, deparo com um pai de família. Uniformizado, ele tem um garoto de 08 ou 09 anos, nada mais do que isso! Não sei porque meus olhos ali fincaram! E ele olha pro menino... E olha pro campo! E olha pro menino de novo.... Ele quer falar.... Ele balbucia alguma coisa... Sinceramente, creio que não saiu nada! Ele havia levado o filho para uma festa! Mas, devagarinho, eu o vi pegar o menino pelo braço e, silenciosamente, descer cada degrau daquela escada! Não existe o que descreva o sentimento de ver aquela cena!
Ao final, olhando pela última vez pro campo de jogo, eu ainda o vi puxar um tímido aplauso quando da saída do Oeste! Meu Deus, que cena era aquela! Doloridamente... Aquele torcedor ainda encontrava forças para reconhecer o adversário! E que lição aquele filho recebia! O respeito em meio à derrota e à dor! Esse é o verdadeiro torcedor do Fortaleza que eu conheço! Que eu conheço! Digno e respeitável! Você, sim, merece o meu sentimento!
Intuitivamente concentrado, quando dou por mim, me vi fazendo a mesma coisa... Aplaudindo o time do Oeste enquanto o coração se trancava, timidamente, sentindo um pouco de dor! Certamente, posso dizer, era a dor daquele pai que eu sentia um pouco comigo!
Mas é pra você, pai de família, amigo que eu não conheço e nunca vi, um verdadeiro exemplo de torcedor do Fortaleza, que eu posso dizer: "Outros outubros virão!"... Outros jogos do acesso acontecerão e, quando finalmente esse time retornar e o grito, hoje preso, começar a ecoar, tenha certeza... Você será a primeira pessoa de quem eu vou me lembrar!

Raphael Esmeraldo Nogueira
Cronista

terça-feira, 13 de novembro de 2012

PARABÓLICA



LE MONDE
O jornal francês Le Monde anuncia, com uma foto no mínimo tendenciosa, que: "Au Brésil, la peine infligée à l'ex-bras droit de Lula provoque un séisme politique". (No Brasil, a pena imposta ao ex-braço direito de Lula causa um terremoto político). Sem dar conta da magnitude, na escala Richter, do abalo sísmico, a matéria tem alvo certo, que não é José Dirceu. Mas não seria mais técnico e honesto o jornal tratar o caso simplesmente como uma marola?

ACUSADOR X DEFENSOR
Na sessão do STF que estabeleceu a dosimetria da pena dos condenados pelo "Mensalão", notou-se o quão difícil é se desvencilhar das tendenciais ideológicas inerentes às carreiras jurídicas de origem dos ministros. Joaquim Barbosa é, originariamente, procurador da República, uma espécie de promotor federal, que tem o mister, via de regra, de acusar. Ricardo Lewandowski foi advogado militante durante longos anos de sua vida profissional, com função, em regra, de defender. A postura garantista do ministro Lewandowski possui fundamento na Constituição Federal, que consagra o devido processo legal, com as garantias do contraditório e da ampla defesa, especialmente em matéria criminal, respaldando a figura do juiz garantista, até bastante comum na prática forense. A postura persecutória do ministro Joaquim Barbosa, no entanto, embora normal para um órgão acusador, é absolutamente incompossível com a função de julgador, cujo desafio precípuo é o de manter-se imparcial, sem cair nas tentações do sectarismo político-ideológico, da opinião pública forjada pela imprensa tendenciosa e do estrelismo pessoal.       

ARAPONGA VIRTUAL
Percorre o Facebook um "amigo virtual" no mínimo intrigante. Chama-se "Coreau Deolhoemvoce", cujo principal propósito, aparentemente, seria registrar flagrantes fotográficos de eleitores do candidato a prefeito derrotado nas urnas em Coreaú. Caso se trate de uma pilhéria, o viés humorístico é de um arrematado mau gosto. Caso seja um simples desatino de algum correligionário ainda envolto na quizila eleitoral, convém recordar que a eleição já faz parte do passado e que uma administração pública se faz para todos, "vencedores" e "vencidos". Caso não se trate nem de uma coisa nem de outra, é bom relembrar que vivemos livres num Estado democrático, ansiosos pela evolução das práticas do "ancien régime" e por dias melhores, para todos.        

domingo, 11 de novembro de 2012

A MÚSICA CONTEMPORÂNEA DO NORDESTE



Acuado pelos defensores ortodoxos do tango argentino tradicional, Astor Piazzolla respondia que sua música, inovadora no ritmo, no timbre e na harmonia, era música contemporânea de Buenos Aires. Atualmente, o tango inovador de Piazzolla é aclamado em todo o mundo, sendo considerado o marco da  nova era do tango.     
Entre nós, a crítica é praticamente uníssona ao acusar o forró eletrônico de uma completa degradação do forró tradicional. Decerto, o forró eletrônico não possui nenhum talento que sequer recorde a silhueta do genial maestro Piazzolla. Também é inegável que houve, grosso modo, uma perda de qualidade musical. Ainda assim, há alguns aspectos do forró eletrônico que a crítica severa simplesmente ignora. Um deles diz com a criação de oportunidades de trabalho para muitos músicos, outro diz com a possibilidade de divertimento para as camadas mais pobres da população. Demais disso, embora "pasteurizado", como apelo de massificação, o forró eletrônico ainda preserva alguns elementos do forró tradicional suficientes para afastar a tese de que seria um outro ritmo completamente diferente. Aliás, nem mesmo Luiz Gonzaga se mostrou intransigente à incorporação de elementos novos ao trio clássico zabumba, triângulo e sanfona...
O forró eletrônico é fruto de uma realidade eminentemente urbana, ao passo que o forró tradicional retrata um Nordeste ainda predominantemente rural. Há espaço para ambos. Fortaleza, berço do forró eletrônico, por exemplo, estava invadida, antes do seu advento, por inúmeros ritmos importados, reservando-se ao forró tradicional uma fatia exígua do mercado musical. Depois, com a massificação do forró eletrônico, o forró tradicional também caiu nas graças do grande público da capital cearense, havendo bandas, como Brasas do Forró, que dividem seus shows entre o forró tradicional e o eletrônico, com bastante sucesso nos dois segmentos.
A proliferação de bandas de forró por todo o Nordeste, com forte apelo comercial, tornou a qualidade musical, de um modo quase generalizado, algo desastroso, muito embora não se possa negar aplausos aos momentos de inspiração de bandas como Mastruz com Leite, quando emplacou sucessos de Rita de Cássia, Luiz Fidélis e Lucas Evangelista; Aviões do Forró, com repertório baseado em composições de Dorgival Dantas; Limão com Mel, em sua primeira fase, e algumas outras.  
O forró eletrônico, além de padecer de certa crise crônica de qualidade, padece também de um enorme preconceito que lhe tenta ofuscar as qualidades que possui. Ao invés de simplesmente criticá-lo, seria preferível conhecê-lo, reconhecê-lo como produto popular da realidade nordestina urbana e procurar aperfeiçoá-lo.
Na contramão da ojeriza acadêmica e intelectual, o pesquisador Felipe Trotta, da Universidade Federal Fluminenses (UFF), defende a tese de que o forró eletrônico renova a tradição do forró, constituindo-se na música contemporânea do Nordeste.
O jornal Diário do Nordeste deste domingo traz, a respeito, uma reportagem que deve ser lida com atenção e sem preconceito.
Confira: http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1202298

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

ANIVERSARIANTE DO DIA



O aniversariante do dia é o irmão "Karamazov" mais intenso, mais passional, mais cativante, mais despojado e mais humano. Meu irmão Raimundo Albuquerque completa hoje 30 (trinta) anos, qual um balzaquiano calejado pelo "carpe diem".
A primeira lembrança marcante que guardo da minha infância – ainda aos 04 (quatro) anos de idade – foi a ida com meu pai a Sobral para visitar mamãe recém-operada do parto do Raimundo. Na portaria da Santa Casa fui barrado; criança não poderia entrar, mas, instantes depois, valendo-me de um descuido do guarda, corri ansioso até o quarto n.º 11. Era manhã de um dia de novembro de 1982. 
Dias depois, Raimundo chegou em Coreaú, muito magro e miúdo. De tão miúdo, papai ainda conta que a nossa vizinha Dona Milce Bréu o teria trazido numa caixa de sapato. Fiquei muito feliz por ter ganhado um irmão, nem me importando com as provocações do amigo Pitica, que a toda hora dizia que eu havia ficado "no canto".
Nas voltas que a vida dá, reencontrei Raimundo em Boa Vista, Estado de Roraima, tendo ele se tornado o meu grande companheiro de andanças em terras macuxis. Fomos juntos a Manaus, a Santa Elena de Uairén (Venezuela), a Lethem (Guiana), a Uiramutã e a tantas outras paragens inesquecíveis.
Regressei ao Ceará com uma saudade enorme, lamentando bastante a distância que novamente iria nos separar. Hoje espero mais um giro da vida para reencontrá-lo.
Meu irmão, parabéns pelos 30 (trinta) anos de vida! Saúde e paz!      

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

A SAGA DO DIVÓRCIO NO BRASIL



O autoritarismo estatal e a moral religiosa ainda estão muito impregnados no ordenamento jurídico pátrio, tendo no Direito das Famílias um de seus principais alvos. Até o advento da Emenda Constitucional n.º 09, de 28 de junho de 1977, regulamentada pela Lei n.º 6.515/77, vingava o princípio da indissolubilidade do casamento civil, calcado em postulados cristãos que imaginavam o casamento como a única via para a constituição da família, elemento nuclear da sociedade. 
Antes da emenda, havia o desquite, instituto que determinava o rompimento da sociedade conjugal, pondo fim aos deveres de coabitação e de fidelidade recíproca e ao regime de bens, mas mantinha incólume o vínculo matrimonial.  
Não foi fácil romper a resistência conservadora, especialmente da Igreja Católica, para a introdução do divórcio no Brasil. Foi necessária inclusive a redução do quórum de dois terços para o de maioria simples para a aprovação da EC n.º 09/77, com a contribuição de Ernesto Geisel, que, não sendo católico, não simpatizava com as forças contrárias ao divórcio. Ainda assim, o divórcio veio acompanhado do instituto da separação judicial, semelhante ao desquite; afinal, os católicos não deveriam se divorciar... Era o que orientava, e ainda orienta, a Igreja Católica.    
Ora, mas se as pessoas são livres para casar, não há como obrigá-las a manterem-se casadas. O casamento  mantém-se graças ao afeto entre os cônjuges e ao desejo de uma comunhão de vida, jamais por pura e simples obrigação legal ou religiosa. Não há motivo convincente para o Estado intervir na liberdade e nos sentimentos das pessoas cujo casamento não é mais do que mera hipocrisia.   
A adoção do divórcio no Brasil representou um enorme avanço legislativo, ainda que tenha sofrido inicialmente severas limitações, como a impossibilidade de se divorciar por mais de uma vez, o prazo de 05 (cinco) anos de separação de fato para o divórcio direto e o de 03 (três) anos para o indireto (ou por conversão). 
A Constituição Federal de 1988 promoveu um avanço acanhado na sistemática do divórcio, apenas reduzindo os prazos para 02 (dois) anos no divórcio direto e para 01 (um) ano na conversão da separação judicial em divórcio.  
A Lei n.º 7.841/89 autorizou a realização de divórcios sucessivos. A Lei n.º 11.441/2007 estabeleceu que o divórcio e a separação consensuais, caso não existam filhos menores ou incapazes, podem ser realizados administrativamente, sem necessidade de ação judicial, bastando que as partes compareçam ao Cartório de Notas acompanhadas por advogado ou defensor público, nos passos do movimento de desjudicialização dos conflitos, tendente a desafogar o Judiciário.
Finalmente, com a promulgação da Emenda Constitucional n.º 66, de 13.07.2010, conferindo nova redação ao art. 226, § 6.º, da Constituição Federal, foi abolido o anacrônico instituto da separação judicial, que suscitava uma descabida discussão em torno da culpa pelo fim do relacionamento. Doravante, o Estado deixa os cônjuges livres para por fim ao casamento, tal como o são para casar. 
Caso não haja mais afeto nem desejo de uma comunhão de vida, propõe-se o divórcio, até mesmo no dia seguinte ao casamento. Havendo acordo entre os cônjuges, o divórcio é consensual, podendo ser realizado perante o próprio Cartório; caso não haja acordo, o divórcio será litigioso, mediante uma ação judicial, mas sem espaço para qualquer discussão acerca de supostas culpas. O desejo de somente um dos cônjuges não é suficiente para manter o vínculo matrimonial. Quando um não quer, dois não casam, nem se mantêm casados.         
O divórcio não destruiu a família, tampouco desestruturou as relações sociais, como outrora propalaram  alguns moralistas. O divórcio simplesmente deixou as pessoas mais livres, permitindo que um casamento que de fato não mais existe seja dissolvido sem empecilhos legais, para que novos vínculos surjam naturalmente, com olhos postos na dignidade da pessoa humana, no afeto e no amor.     

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

HOMENAGEM À SERRA DA MERUOCA



I
Eu hoje volto a ti
Oh! Serra abençoada
Onde trinta anos atrás
Deixei as minhas pegadas.
II
Andando pelas veredas
Em que tanto pisei,
Sentindo o cheiro do mato
Que aqui deixei.
III
Reencontro os amigos
Que aqui ficaram
Ouço o som do vento
batendo na floragem.
IV
Que da mata faz ecoar
Trazendo uma sonoridade
Que me faz relembrar
As noites de luar.
V
Ouço o canto dos pássaros,
Que muito cedo começam a cantar,
Anunciando um novo dia
Que vai começar.
VI
Retorno aos riachos
De água cristalina
Vindo lá da mata
Desta serra divina.
VII
Da fonte que nunca secou,
Pois foi Deus a criou,
Passo a observar
Que aqui nada mudou.
VIII
Tudo continua lindo,
Até parece que o tempo não passou.
Fui eu quem me ausentou
Deste paraíso que aqui ficou.
IX
Observa-se a natureza
Com toda sua beleza
Feita pelo Criador
Que tudo conserva e tudo conservou.

FIM

Raimundo Ferrer Marques

terça-feira, 6 de novembro de 2012

A MISÉRIA NO CEARÁ



A pobreza econômica é o atributo daquele que reúne não mais do que as condições materiais mínimas para uma sobrevivência digna. Quem recebe uma remuneração que satisfaz tão somente as despesas decorrentes do sustento próprio e da família pode ser considerado pobre. No entanto, quem vive com menos de R$ 70,00 (setenta reais) por mês não pode ser considerado simplesmente pobre, mas extremamente pobre, em verdade, miserável economicamente. 
O Estado do Ceará, a despeito da inventiva propaganda oficial, continua com uma população de um milhão e meio de miseráveis, sem muitas perspectivas para além das drogas, do álcool e do crime... Ao passo que, com uma absurda concentração de renda, uma parcela ínfima da população enriquecida desfruta uma vida nababesca.
Nesse cenário caótico, ainda há quem seja contrário aos programas de distribuição de renda do Governo Federal, cujo propósito é preservar o mínimo existencial, sob o pretexto de que eles viciariam o cidadão, tornando-o mais propenso ao ócio, reduzindo e encarecendo a mão-de-obra disponível...  
Há ainda quem sustente que a luta de classes sociais pauta-se por um singelo reducionismo maniqueísta absolutamente démodé, num esforço cínico de alto-preservação da mesma burguesia conservadora que há mais de um século atrás fora denunciada em tom hilário pela Padaria Espiritual como aquela que "arrota carne cozida, enquanto palita os dentes falando mal da vida alheia." 

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

UMA EXEGESE CANHESTRA DO STJ


PROCESSO CIVIL. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. PROVA DE PARTE DO DANO. INEXISTÊNCIA. PERDA SEM CULPA DAS PARTES. LIQUIDAÇÃO IGUAL A ZERO. EXTINÇÃO DO PROCESSO, QUANTO A ESTA PARCELA, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. POSSIBILIDADE DE REPROPOSITURA.
1. Na hipótese em que a sentença fixa a obrigatoriedade de indenização de determinado dano, mas nenhuma das partes está em condições de demonstrar a existência e extensão desse dano, não é possível ao juízo promover a liquidação da sentença valendo-se, de maneira arbitrária, de meras estimativas.
2. Impossibilitada a demonstração do dano sem culpa de parte a parte, deve-se, por analogia, aplicar a norma do art. 915 do CPC/39, extinguindo-se a liquidação sem resolução de mérito quanto ao dano cuja extensão não foi comprovada, facultando-se à parte interessada o reinício dessa fase processual, caso reúna, no futuro, as provas cuja inexistência se constatou.
3. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 1280949/SP, 3ª Turma, rel.ª Min.ª Nancy Andrighi, DJe 03.10.2012)

Um dos maiores absurdos que já vi, aplicar, por analogia, norma revogada, ou seja, norma inexistente em nosso ordenamento jurídico. Levando em conta que é possível pagamento de honorários em procedimento de liquidação e que não houve culpa de nenhuma das partes por não ter finalizado o procedimento, dever-se-ia condenar o liquidante por aplicação do princípio da causalidade, ou seja, como a parte liquidanda não impôs resistência à liquidação, não há que se falar em condenação de custas e honorários contra ela, mas a favor dela. O entendimento é o mesmo do julgado, mas a fundamentação bem diversa. Outra questão que fica em aberto é saber quando inicia o prazo prescricional para iniciar a nova liquidação, se desde essa decisão ou desde quando haja condições de se iniciar tal procedimento; e também saber qual o prazo aplicado. Entendo que o início do prazo acontecerá quando o vencedor tenha condições de iniciar o procedimento, aplicando-se o princípio da actio nata, em que a prescrição inicia com o nascimento da ação ou pretensão. Quanto ao prazo, deve-se utilizar o subsidiário de 10 anos do art. 205 do Código Civil.
Alexandre Saldanha
Defensor Público

domingo, 4 de novembro de 2012

HALLOWEEN



Sempre relutei em participar da festa do dia das bruxas, em sinal de protesto ao imperialismo cultural em nossa terra, que desprestigia tanto o seu próprio folclore. Ainda na faculdade, quando pela primeira vez fui convidado para um Halloween numa residência universitária feminina, recusei peremptoriamente a proposta, em que pese tenha-me arrependido amargamente depois, não necessariamente por não ter prestigiado a tradição anglo-saxã...
Mas a vida sempre nos oferece novas oportunidades. Em Aracati, resolveram realizar o "Halloween da Justiça", para confraternizar toda a gente que trabalha no Fórum da cidade. Todos confirmaram presença, não tive como recusar!
Com a fantasia da rotina de trabalho, em manga de camisa, compareci animado simplesmente pela confraternização em si, não dando a mínima para a história de dia das bruxas. Também, não fora o negrume de um ou outro traje e alguns chapéus de bruxa, não teria sequer suspeitado que estava num Halloween. 
No quintal de um simpático restaurante da cidade, o grupo musical do nosso dia das bruxas tocava MPB, pagode e forró. Depois, numa pista de dança iluminada a caráter, alguns clássicos da música eletrônica e, no final, ainda mais forró.
Como o evento encerrou relativamente cedo, não recusei a proposta de ir até Canoa Quebrada para um tradicional Halloween de uma pousada de um gringo.
Na área de lazer da pousada, por um instante, senti-me finalmente num Halloween. Um magote de gringo trajado em fantasias medonhas, uma música sinistra tocando e, no céu, uma estranha lua cheia. Consegui identificar, pelo vozerio, um grupo de italianos e outro de alemães, alguns ainda em pé claudicantes e outros já sentados na relva na beira da piscina. 
O cenário era efetivamente sombrio, digno de um dia das bruxas. Um lusco-fusco percorrido por fumaça, teias de aranha e morcegos artificiais trazia consigo odores desagradáveis naturais. Nosso grupo acuado não teve como suportar muito tempo. Pouco mais de uma hora depois batíamos em retirada. Mas antes de sairmos, atraiu-me particularmente a atenção um gringo enrolado numa bandeira da Grã-Bretanha percorrendo dançando todo o pátio, ostentando com orgulho a tradição britânica. Aos saltos, requebros e gatimanhos, o sujeito, num certo momento, parou no meio do pátio, abriu os braços empunhando a bandeira aberta e, olhando firme para a lua cheia, com um sotaque fortemente londrino, bradou:
– Arre égua, macho! Diabo é isso?!            

COLUNA SOCIAL



Presenciei o nascimento desse namoro, duas semanas depois de ter aportado em Boa Vista/RR, no início de setembro de 2008. Há dois anos casados nos termos da lei civil, hoje se casaram perante a Igreja Católica, na Terra de Macunaima.
Eis Camila Menezes (minha sobrinha) e Marcelo Tadano (ex-colega de PGE/RR, paulistano descendente de japoneses), os mais novos casados da "Macuxiland".  
Muita sorte, felicidade e dois filhos nipo-coreauenses ao belo casal!

sábado, 3 de novembro de 2012

BELCHIOR - OS PROFISSIONAIS


Os Profissionais by Belchior on Grooveshark

Onde anda o tipo afoito
Que em 1-9-6-8
Queria tomar o poder?
Hoje, rei da vaselina,
Correu de carrão pra China,
Só toma mesmo aspirina
E já não quer nem saber.

Flower power! Que conquista!
Mas eis que chegou o florista
Cobrou a conta e sumiu
Amor, coisa de amadores
Vou seguir-te aonde f(l)ores!
Vamos lá, ex-sonhadores,
À mamãe que nos pariu!

Oh! L'age d'or de ma jeunesse!
Rimbaud, "par delicatesse
J'ai perdu (também!) ma vie!"
(Se há vida neste buraco
Tropical, que enche o saco
Ao ser tão vil, tão servil!)

E então? Vencemos o crime?
Já ninguém mais nos oprime
Pastores, pais, lei e algoz?
Que bom voltar pra família!
Viver a vidinha à pilha!
Yuppies sabor baunilha
Era uma vez todos nós!

Dancei no pó dessa estrada...
Mas viva a rapaziada
Que berrava: "Amor e Paz!"
Perdão, que perdi o pique...
Mas se a vida é um piquenique
Basta o herói de butique
Dos chiques profissionais.

I have a dream... My dream is over!
(Guerrilla de latin lover!)
Mire-se o dólar que faz sol
Esplim, susexo e poder,
Vim de banda e podes crer:
"Muito jovem pra morrer
E velho pro rock 'n' roll!

"Os Profissionais" é uma das mais inspiradas composições do Belchior. A música é uma crítica acerba contra os jovens idealistas que findam se rendendo à sedução do sistema. Recordando os ventos revolucionários soprados, em maio de 1968, da França para todo o resto do mundo, Belchior clama pelos adeptos do movimento que, com o tempo, fascinados pelo vil metal, largaram a ideia de mudar o mundo para cuidar unicamente dos seus próprios interesses. 
Flower Power (Força das Flores) foi um lema utilizado pelos hippies entre os anos 60 e 70 como símbolo da ideologia da não-violência e do repúdio à Guerra do Vietnã. A revolução, portanto, idealisticamente, tinha como projeto instalar um governo sensível às causas sociais, de viés fortemente poético. No entanto, de repente chegou o florista, o dono da floricultura, e cobrou a conta das flores que os manifestantes carregavam, lembrando que, no sistema capitalista, até flores e sonhos se comercializam, não havendo ensanchas para muita utopia, porque a sensibilidade seria coisa de gente imatura, irresponsável e descompassada com a lógica pragmática do sistema de acúmulo de capital, em que uns seguem os outros aonde forem, de modo autômato, largando pelo caminho as flores dos ideais, quadro que revolta o poeta a ponto de mandá-los para a "mamãe" que os pariu! 
Oh! L'age d'or de ma jeunesse! Numa tradução livre do francês: Oh! Tempos dourados da minha juventude! Rimbaud, "par delicatesse; J'ai perdu (também!) ma vie! Numa tradução literal: Rimbaud, por gentileza, eu perdi também minha vida! Rimbaud (pronuncia-se: Rambô) foi um genial poeta simbolista francês, cuja adolescência foi uma profusão de inspiração criadora, que influenciou a literatura, a música e a arte modernas, tendo, aos 20 (vinte) anos, simplesmente desistido de escrever. Belchior insurge-se, ainda na mesma estrofe, contra os rebeldes decaídos que se dizem aborrecidos com a monotonia da vida no País Tropical, envoltos nas últimas tendências americanas e europeias, taxando-os de vis e servis. 
Com o abandono dos ideais coletivos e a opção pela busca da felicidade unicamente particular, o ex-sonhador não somente larga a sua ideologia original, mas adquire uma nova toda diferente, carregada de  conservadorismo, na qual a única opressão vem dos crimes tradicionais, praticados pelos ladrões clássicos que ameaçam o seu patrimônio burguês. A opressão política, religiosa e familiar desaparecem, porque o novo burguês conservador de vítima converte-se em algoz (opressor), fechando-se na vida privada, controlado pelas idiossincrasias do sistema, como os Yuppies (derivado de YUP: Young Urban Professional), jovens de classe média ou alta, que trabalham em suas profissões de formação universitária e que seguem as últimas tendências da moda, tendo-se convertido, de forma pejorativa, no esteriótipo do jovem burguês conservador.   
Belchior diz que também sonhou em 1968 (Dancei no pó dessa estrada...) e ironiza o grupo que brandia o lema hippie de "Paz e Amor", mas que acabou se rendendo aos apelos do consumo, ressaltando que, se a ideia fosse a mera ascensão econômica pessoal, já bastariam os despropósitos dos janotas filhos da aristocracia tradicional, arautos profissionais dos modismos e da ostentação.     
O poeta invoca o discurso clássico de Martin Luther King, Jr.: I have a dream (Eu tenho um sonho), contra as desigualdades raciais, e diz ironicamente que: O sonho acabou! (My dream is over!), ao menos para os ex-sonhadores, outrora inspirados nas guerrilhas que vicejavam nos quatro cantos da América Latina e em mártires como Chê Guevara; atualmente hipnotizados pelo vil metal (dólar), que subjuga avassaladoramente o novo burguês, entediado (esplim), mas com sucesso e sexo (susexo) garantidos pela autonomia financeira  conquistada. Assim, o conformismo se abate e a verve contestadora arrefece com a meia-idade do cidadão cordato, já muito velho para as rebeldias juvenis, mas muito jovem ainda para desfrutar o sabor baunilha que a estabilidade econômica confere, como na velha provocação punk: "Too Old To Rock 'n' Roll: Too Young To Die", a sugerir que a afoiteza política do rebelde decaído era mero arroubo atribuível aos hormônios e aos enlevos da juventude e não reflexo de uma autêntica sensibilidade social.     

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

FLOR DO MANDACARU



No horizonte largo,
Somente um sol vermelho
E ao longe um cacto em flor.
No copiar cismando,
O chão escavacando,
Na campina nem único rumor.
Há muitas léguas de tempo,
Há existir se retendo,
Há nesse peito uma dor.
Saudade dos que se foram,
Nos passos da tirana sina,
Partindo do interior.
Espiando assustado a terra seca,
Se persigna e pragueja o verão opressor.
Não resistiu a novilha
Que o mormaço desenha
Numa vertigem de horror. 
A esperança tange o pássaro negro
Nas alturas seguindo seu mísero odor.
Até que o inverno desperte
A vida que se renova na confluência do amor.

Eliton Meneses