quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

ALGUMAS QUESTÕES (NOSSAS) DO DEBATE



1) Coreaú possui leis reconhecendo algum valor cultural do município?
2) Há algum trabalho de preservação do patrimônio histórico no município?
3) E os nossos remanescentes quilombolas da Timbaúba?! Como anda o processo de regularização fundiária da área deles?!
4) Existe uma literatura coreauense? Quem são nossos poetas, contistas, cronistas? Alguém sabe?!
5) Por que não se pensar num anedotário palmense?!
6) O que se deve fazer para que não morra o Leruá?!
7) E a cultura no aspecto da arte?! Quem vem produzindo arte em Coreaú?!
8) Vicente Chico é um mestre da cultura palmense! Quem seriam os outros?
9) Quem foram os maiores craques da história do futebol de Coreaú?!
10) Coreaú é conhecida por exportar muitos doutores. E o que os nossos doutores dão de retorno à sua pátria mãe gentil??!!

P.S.: Quem tiver algum resposta, favor enviá-la para fcoeliton@ibest.com.br

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

CULTURA PALMENSE EM DEBATE


A APL acaba de promover um debate sobre a cultura palmense no Facebook. Inicialmente previsto para ocorrer entre as 19 e 20 horas, foi inevitável prorrogar por mais uma hora o tempo, tamanho o envolvimento dos muitos participantes.
Convém ressaltar que cultura é "aquele todo complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e capacidades adquiridos pelo homem como membro da sociedade." (Edward B. Tylor). 
Falar de cultura é, portanto, além de mui agradável, algo sobremaneira necessário, notadamente da cultura da sua terra, da sua gente, de tudo aquilo que nos povoa o imaginário e nos constrói como pessoas. As duas horas passaram voando. 
Foram lembrados os mais diversos temas da cultura local, dos tempos idos e atuais, pelos muitos participantes que deram o ar da graça, coreauenses ou não. 
A APL agradece a participação de todos e, como ficou um gostinho de quero-mais, novos debates online decerto virão!   

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

O USUÁRIO E A LEI



Posse de drogas é ou não crime? Eis a questão! A descriminalização do porte de drogas para consumo próprio deverá ser um dos principais temas de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2013. Em 2006 a Lei 11.343/2006 foi sancionada e a partir daí o número de presos no Brasil dobrou e a maioria desses presos nunca cometeram outros crimes, além de usarem drogas para consumo próprio.
A população tem participado da discussão junto à Subcomissão de Crimes e Penas, que elaborou uma proposta em que se altera a Lei, diferenciando usuários e traficantes e considerando usuário quem for pego com tamanha quantidade de entorpecentes suficiente para até cinco dias de consumo próprio.
"A maioria dos presos por tráfico são indivíduos desarmados, réus primários e com quantidade pequena de drogas. Quem está sendo preso é quem não tem relação com o tráfico violento. As pessoas estão sendo enquadradas incorretamente como traficantes." Observa o defensor público Daniel Nicory.
Na câmara, diversos deputados são contra a alteração e propõem que, em vez de prever a descriminalização, seja estabelecido mais rigor no combate às drogas.
Deste modo, deverá entrar em pauta de julgamentos o seguinte tema que está repercutindo há muito tempo!

Marinara Albuquerque 
3.º Ano EM - Colégio Pedro II

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

ABANDONO AFETIVO




É bastante comum que alguns pais separados negligenciem afetivamente seus filhos – que ficam sob a guarda do ex-companheiro –, na crença de que o simples pagamento de uma pensão alimentícia represente o execício satisfatório do poder familiar. A paternidade e maternidade são funções, porém, que carregam consigo deveres que vão muito além do mero sustento material. Não se pode, decerto, obrigar ninguém a amar outra pessoa; assim, o amor não é um dever decorrente do poder familiar. No entanto, o afeto, abstraído do campo da subjetividade, no sentido de conduta voltada à segurança, à proteção, ao acolhimento, ao cuidado e à imposição de limites, é inerente ao poder familiar e o seu descumprimento pode resultar em sanções, inclusive a reparação de danos na esfera civil.
O afeto significa dedicação a alguém, não importando somente um sentimento, mas também uma ação voltada a instruir, educar, formar, dar feição... Daí a necessidade de se responsabilizarem os pais separados que porventura negarem afeto a seus filhos, acarretando-lhes amiúde sérias repercussões e consequências psíquicas.  
A responsabilidade civil decorrente do abandono afetivo paterno encontra guarida nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1.º, III, da CF/88), da solidariedade (art. 3.º, I, da CF/88), da paternidade responsável (art. 226, § 7.º, e 229, da CF/88) e do melhor interesse da criança e do adolescente (art. 227, da CF/88), bem como nas disposições específicas do novel Código Civil e do Estatuto da Criança e do Adolescente.  
Os Tribunais pátrios ainda não pacificaram a discussão acerca da reparação civil decorrente do abandono afetivo. Depois do primeiro julgamento em segundo grau favorável à reparação, proferido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, o Superior Tribunal de Justiça reformou dita decisão, sob o fundamento de que a "punição" para o pai que abandona o filho seria a destituição do pátrio poder e não a reparação civil (STJ, REsp n.º 757.411/MG, 4.ª T. rel. Fernando Gonçalves, DJU 27.03.2006) – o que configurava, na verdade, era um prêmio para o pai negligente.
Mais recentemente, no entanto, a 3.ª Turma do STJ, traduzindo melhor os novos valores e paradigmas do Direito de Família contemporâneo, resolveu acolher a reparação civil decorrente do abandono afetivo, aduzindo que: "(...) 3. Comprovar que a imposição legal de cuidar da prole foi descumprida implica em se reconhecer a ocorrência de ilicitude civil, sob a forma de omissão. Isso porque o non facere, que atinge um bem juridicamente tutelado, leia-se, o necessário dever de criação, educação e companhia – de cuidado – importa em vulneração da imposição legal, exsurgindo, daí, a possibilidade de se pleitear compensação por danos morais por abandono psicológico. 4. Apesar das inúmeras hipóteses que minimizam a possibilidade de pleno cuidado de um dos genitores em relação à sua prole, existe um número mínimo de cuidados parentais que, para além do mero cumprimento da lei, garantam aos filhos, ao menos quanto à afetividade, condições para uma adequada formação psicológica e inserção social." (STJ, REsp n.º  1.159.242/SP, 3.ª T., rel. Nancy Andrighi, DJe 10.05.2012)

domingo, 24 de fevereiro de 2013

OS MUJIQUES MANTIVERAM-SE FIRMES



"Eu sou é eu mesmo. Diverjo de todo o mundo… Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa. (...) O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem." (Riobaldo)

"As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação."

(Drummond)

sábado, 23 de fevereiro de 2013

ANTENA LIGADA


YOANI SÁNCHEZ

É inegável que o "calcanhar de Aquiles" do socialismo sempre foi a liberdade. Em Cuba decerto há restrições intoleráveis. De todo modo, adotar como mártir da opressão do regime cubano uma jornalista que publica tudo o que pensa e que viaja o mundo todo, financiada por dinheiro de origem nebulosa, promovendo os ideais do imperialismo americano, num momento de abertura da ilha caribenha, é uma atitude que cheira a desespero dos herdeiros do nosso velho udenismo.          

HABEMUS PAPAM

Tirante as razões imediatas da renúncia do Papa Bento XVI, especialmente a forte resistência da Cúria romana em relação às medidas de transparência exigidas por ele, louve-se a hombridade de um sujeito que, reconhecendo-se incapaz de reverter um quadro dramático, renuncia a um posto vitalício de tamanha relevância. Num mundo ainda tão afeito a formalidades, titulações e símbolos de poder, o líder da Igreja Católica, decidindo renunciar ao invés de simplesmente fechar os olhos e seguir em meio às intempéries, nos dá uma surpreendente lição de desprendimento.

INDISPONIBILIDADE DOS BENS 

O juiz da Comarca de Coreaú decretou a indisponibilidade de bens do ex-gestor de Coreaú, Carlos Roner, até o valor de R$ 2.649.846,57 (dois milhões, seiscentos e quarenta e nove mil, oitocentos e quarenta e seis reais e cinquenta e sete centavos). A medida acolhe os pedidos liminares de duas ações de improbidade administrativa propostas pelo Município de Coreaú contra o ex-prefeito. Um problema é saber se a Justiça encontrará, no patrimônio de Carlos Roner, bens e valores tão vultosos; outro, se os servidores públicos, até o deslinde final das ações, receberão – ainda que parceladamente – os seus vencimentos não-pagos do seu empregador, que é o Município de Coreaú, mesmo sendo a dívida oriunda da desastrosa gestão passada.  

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

EDUCAÇÃO DOMICILIAR



Domingo passado, no Programa Fantástico, da TV Globo, uma reportagem assaz intrigante chamou-me a atenção: a demanda de pais brasileiros que decidem por si mesmos assumir a responsabilidade de educar seus filhos sem recorrer à escola, na chamada homeschooling ou educação domiciliar. Esse modelo educacional é bastante comum nos Estados Unidos, como também em outros países. No Brasil há algum tempo vem ganhando adeptos. No Fantástico, os pais esclarecem a tomada de decisão, alegando que com tal método seus filhos aprendem com mais eficiência, ou seja, assimilam melhor os conteúdos, dado que os filhos escolhem seus próprios horários de estudo, dispõem de mais tempo e conforto para estudar, além de não serem interrompidos pelos colegas na hora da explanação das matérias. Como consequência, taxam as instituições escolares de ditadoras do conhecimento, reservatórios de alunos submetidos a regras estabelecidas, aos horários, ao calendário letivo, disciplinas desnecessárias, além de acreditarem que seus filhos, estudando em casa, estarão mais protegidos da violência e do preconceito, incluindo o bullying.
Com todo respeito aos pais adeptos desse modelo educacional, penso, como profissional da educação, que se deveria, a priori, procurar entender melhor e reconhecer o papel da escola, como instituição que transcende a mera transmissão de conhecimentos. Ora, é no ambiente escolar que a criança dá início ao seu processo de desenvolvimento social, aprende a conviver com o diferente, compreende e assimila regras de conduta para viver em sociedade etc. Um pouco distante dos olhos paternos e maternos, a criança aprende a lidar com conflitos, adquire independência, supera os medos, enfim, quanto mais a criança conviver com o pluralismo, com estímulos externos, mais se socializará, convivendo, assim, em harmonia com o diferente. A eficácia dessa análise já fora comprovada há anos pelo filósofo e psicólogo da educação Vigostki.
Noutra reportagem postada no página de vídeos Youtube, uma mãe que pratica a educação domiciliar com seus filhos afirma, com muito entusiasmo, que o motivo da retirada do filho de 08 anos da escola foi o fato de o menino não gostar de português, especialmente das aulas de pronome de tratamento. Segundo o menino, todos nós devemos ter o mesmo tratamento, pois somos iguais uns aos outros. Assim, não precisaríamos chamar um papa de Vossa Santidade, nem um médico ou advogado de doutor. É importante frisar que, para os adeptos da homeschooling, as disciplinas utilizadas pelos professores em sala restringem-se a mero acúmulo desnecessário de informações, que nada contribuem na vida prática. No entanto, os currículos escolares são elaborados por profissionais capacitados, neles se incluem disciplinas utilizadas não somente para transmitir informações e contribuir para o ingresso na faculdade, como também para os educandos absorverem uma visão do outro, podendo, desse modo, interagir e também contestar. Logo, os pais adeptos da homeschooling parecem contradizer-se, pois utilizam, em regra, as mesmas disciplinas escolares para ensinar seus filhos. Concernente ao uso dos pronomes de tratamento, é necessário sim atribuirmos tratamento diferencial para determinadas pessoas, pois não vivemos em guetos e sim numa sociedade em que há regras de conduta social, de comportamento, educação perante os demais. Também temos que ter humildade de reconhecer o valor profissional do outro, como também respeitá-lo. Além do mais, a maioria desses pais (professores) não tem formação teórica e técnica para suprir todas as disciplinas repassadas aos filhos, diferentemente da escola, onde há profissionais capacitados, com anos de estudo para esse propósito.
Diante das informações expostas, pode-se afirmar que precisamos sim melhorar a educação, e não simplesmente tentar abolir a escola. Temos algumas escolas públicas e privadas ruins, como também algumas outras de qualidade. É necessário rever e refletir, sobre os currículos escolares, procurar sempre aperfeiçoá-los, reduzindo umas disciplinas, acrescentando outras. Os PPPs (Projetos Políticos Pedagógicos) identificadores das instituições de ensino precisam ser realmente postos em prática, o profissional em educação também precisa ser valorizado, tanto pelo Estado, como pela comunidade. Agora, é preciso deixar claro que a construção de uma nação necessita da participação de toda a sociedade – a família é muito restrita para tanto. Acredito que, se for legalizada e adotada a educação familiar no Brasil, o desenvolvimento de muitas crianças inocentes correrá sério risco, em virtude do individualismo extremo de alguns pais e, como sociedade, ao invés de seguirmos em frente, entraremos num retrocesso.

Auricélia Fontenele
Prof.ª de Português

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

A MATEMÁTICA CEARENSE DO NORDESTÃO 2013



Dizem por aqui que um "Diário" bem escrito tem a missão de comentar! Olhar os fatos da vida dos navegantes, sem deixar de anotar! Dessa forma, meus amigos, essa eu me sinto com o dever de registrar!
E hoje vai ser assim, deixando o coração de lado, e brincando mais com as palavras, que eu vou dar o meu recado!
Não... Não vou fazer deste espaço um "cordel", mas, quem sabe, com relances de um "repente", falando um pouco de futebol, eu consiga homenagear esta parte genuína.... da Literatura Nordestina!
Cá entre nós, acho que hoje eu posso tentar inovar! Afinal, não é toda semana que Ceará e Fortaleza contrariam a "sempre lógica matemática", invertem a "ordem dos fatores" e constroem, juntos, "um novo produto"!
Sim, invertemos os fatores! Surpreendemos os "favoritos"! Colocamos em "prova real" aquela velha frase de um comentarista acolá que costuma sempre frisar: "Se o futebol cearense não existisse, precisaria ser inventado"!
O Ceará foi a Salvador levando consigo um "retrospecto invejável"... Nunca havia derrotado o Vitória/BA pela Copa do Nordeste! Ou seja, não era apenas o "desplacar" de 2x0 que incomodava, a "lógica histórica" precisaria ser totalmente... contrariada!
O Fortaleza, por sua vez, enfrentava um Arrudão lotado, um Santa Cruz embalado e que entrava em campo "classificado"!
Meu saudoso e velho pai, que costumava chamar o Ceará de "Robin Hood do Nordeste" (pois ganhava dos grandes pra perder dos pequenos), certamente iria ria à toa com mais este feito do seu "Glorioso Alvinegro"!
O Ceará simplesmente esqueceu a história, contrariou a "lógica" (que lógica?), "multiplicou" os gols, fez 4x1 no Vitória/BA e extraiu a "raiz quadrada" das cinzas do carnaval baiano!
O Fortaleza, então, expliquem-me aquilo, por favor! Elevou as emoções e exponenciou as coronárias do seu torcedor! O gol no último minuto pulverizou o percentual das chances de eliminação e tornou nula qualquer "santa chance" de reação!
Ceará e Fortaleza brincaram com as operações, contrariaram a matemática, inverteram os fatores e conseguiram... um novo produto! Um produto genuinamente alencarino! Produto que, temporariamente, inverteu a ordem... do futebol nordestino!
Pelo menos por hora, reescreve-se agora... aquela "certa lógica"! O futebol do Nordeste tem que "tirar os nove" dos pernambucanos, "eliminar" os baianos e, em novos tempos de Arena Castelão, reconhecer os cearenses como favoritos ao título do Nordestão!

Raphael Esmeraldo Nogueira
Cronista/Defensor Público

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

DEMOCRACIA X SOCIALISMO



"Pode-se definir a democracia como um método de obter decisões coletivas que permite que todos, direta ou indiretamente, tomem parte na decisão e que as decisões sejam adotadas por maioria, depois de uma livre discussão. (...) Se não a compreendermos por esse específico ponto de vista formal, a democracia atual seria a mera continuação do liberalismo, sem qualquer diferença. (...) A democracia substancial é um dos grandes temas do socialismo. Pode-se definir o socialismo como aquela corrente de pensamento e ideia que procura preencher a democracia de certos conteúdos, como igualdade, não somente jurídica mas também de fato, social e econômica. (...) Acredito que um dos critérios para a distribuição da riqueza deve ser o mérito, mas nem sempre unicamente o mérito. Há situações em que não se pode empregar somente o mérito, como, por exemplo, no acesso à educação. (...) Nessas situações, não se deve esquecer de promover a distribuição também segundo a necessidade (...)" (Norberto Bobbio)

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

GATA DA TURMA



Na Gata da Turma, espécie de esconde-esconde coletivo muito comum no Coreaú dos meus tempos de menino, um grupo se escondia do outro até que um dos integrantes fosse encontrado, invertendo-se a ordem da procura. A turma que iria procurar se concentrava na Coluna da Hora e contava até cem, enquanto a turma a ser procurada embrenhava em diferentes esconderijos da cidades e dos arredores. Alguns ficavam por perto da Praça da Matriz, na copa dos benjamins e flamboyants do centro da cidade. Outros, mais afoitos, chegavam a se esconder na outra margem do rio, atravessando-o a nado; nos terrenos baldios do Alto, nas moitas do Poço do Carro ou nas do Socavão. Cada grupo contava com dez a vinte meninos, formando-se subgrupos de três a quatro, cada qual tomando paradeiro diferente.
Quase sempre sugeria aos camaradas o esconderijo do Socavão; não precisamente pela admirável beleza do lugar, mas pela vizinhança simultânea de um casarão inacabado e de um cemitério antigo e abandonado, ambos sombrios e com fama de mal-assombrados, suficientes quase sempre para resguardar aqueles que tivessem a coragem de se esconder por aquelas bandas.
Uma única vez fomos surpreendidos no Socavão. Quando ouvimos o barulho dos meninos dobrando a curva do casarão, pulamos a cerca do cemitério e ficamos detrás de uma catacumba. No céu havia algumas nuvens que por alguns momentos encobriam a lua clara. A turma se aproximava. Correr não adiantava. Pela regra, bastava dizer, com o adversário em vista: "– Peguei!" O jeito era se esconder. As moitas em volta estavam ressequidas, esgueiramo-nos por detrás dos túmulos. Haviam escutado nosso sussurro, só não sabiam precisamente onde estávamos. Ou, se soubessem, não reuniam coragem bastante para penetrar no cemitério. Ficaram hesitantes na manga de cerca durante muito tempo, falando baixo.
Depois de algum tempo – com uma hora e meia a ordem da procura era automaticamente invertida, caso um grupo  não encontrasse o outro  –, resolvemos atrair a atenção dos meninos à nossa espreita. Um camarada prevenido havia trazido no bolso uma máscara carnavalesca em forma de caveira. Seguramos o riso. Combinamos silenciosamente o plano terrível.
Balançamos detrás do túmulo uma moita seca. Balançamos novamente, mais forte. Ouvimos um deles dizer: "– Acolá!" Pularam a cerca. Aproximaram-se sorrateiros. Com a máscara na cara e uns molambos brancos penduradas nos braços, nosso camarada preparou-se para a recepção medonha. A lua abria-se lentamente, atravessando uma nuvem escura. Quando avistamos a sombra dos meninos, a uns dois metros de nós, nossa assombração apareceu-lhes repentina e pavorosamente, com as vestes tremulando ao vento e com gritos cavernosos de:
– Uhhhhh!
Tamanho foi o desespero que um dos meninos saltou a cerca do cemitério num único pulo e partiu em disparada para a rua aos gritos de: "– Meu Deus!", sem nem olhar para trás para dar conta de que o outro companheiro havia se enganchado na cerca de arame e depois caído no chão, aos berros, sem poder levantar-se com as pernas bambas.     

sábado, 16 de fevereiro de 2013

POBREZA EM COREAÚ



Perguntaram a um médico voluntário, num campo de refugiados da África, qual sua especialidade, e ele respondeu:
 Sou especialista em pobreza.
O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) mede o progresso de um país, de um estado-membro ou de um município, a partir de três dimensões: renda, saúde e educação. O último IDH medido de Coreaú corresponde a 0,591 (PNUD/2000), refletindo uma pobreza acentuada do município.  
O Prof. João Teles propõe dez questões cujas respostas – ou tentativas de respostas – deveriam figurar num livro de História de Coreaú. A sexta questão indaga onde estariam os bolsões de miséria do município. Ora, não somente por acreditar na frieza dos números do IDH, mas sobretudo por conhecer a realidade coreauense, imagino que a questão seria mais facilmente respondida se realizada de maneira invertida, ou seja, se pedisse a indicação dos bolsões de riqueza da Palma. 
Os bolsões de pobreza permeiam praticamente todo o município, particularmente as áreas periféricas da cidade de Coreaú e das sedes dos três distritos – Araquém, Aroeiras e Ubaúna –, as diversas vilas e localidades, desprovidas de quase tudo, os casebres isolados da caatinga; enfim, a pobreza se alastra pelos quatro cantos do município. Sendo honesto, poder-se-ia lamentavelmente caracterizar o município inteiro como um grande bolsão de pobreza. De toda sorte, como a questão pretende identificar especificamente aqueles que vivem na miséria – condição mais severa, típica de pobreza extrema –, haveria de ser realizado um levantamento específico, seguindo os rastros da pobreza que serpenteia todo o território municipal.      

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

CURIOSIDADE EMANCIPATÓRIA



O povoado de Várzea Grande, à época subordinado à Vila de Granja, adquiriu a condição de Distrito de Paz, com a edição da Lei n.º 955, de 29.08.1860. Dez anos mais tarde, o distrito foi elevado à categoria de vila, emancipando-se politicamente de Granja, por força da Resolução n.º 1316, de 24.09.1870, sob a denominação de Vila da Palma. Convém ressaltar que, à época do Império, as vilas eram divisões político-administrativas correspondentes, grosso modo, aos municípios hodiernos. Cinquenta anos depois, com a publicação da Lei n.º 1794, de 09.10.1920, na Primeira República, o Município da Palma foi extinto, sendo incorporado ao Município de Granja. Um ano depois, a Palma ressurge como ente autônomo, mercê da Lei estadual n.º 1887, de 15.10.1921. Cerca de dez anos depois, a Palma perdeu mais uma vez a condição de ente político, com o advento do Decreto n.º 193, de 20.05.1931, sendo incorporada ao Município de Massapê, do qual foi desmembrada, reassumindo a condição de município, graças ao Decreto n.º 192, de 20.09.1935. Desde então, a Palma mantém ininterrupta sua autonomia político-administrativa, assumindo a denominação de Coreaú, a partir do Decreto n.º 1114, de 30.12.1943.* 
Em face do exposto, dadas as idas e vindas da autonomia político-administrativa de Coreaú, é um equívoco imaginar que o município possui 142 anos de emancipação. Em verdade, Coreaú está emancipado, de forma contínua, somente há 77 anos, desde 20.09.1935, data que, como marco inicial da autonomia que é preservada até os dias atuais, deveria ser reputada a mais relevante do município. De todo modo, para os que preferem fiar-se na primeira data – 24.09.1870 –, no resultado do período de emancipação, ao menos haveriam de ser descontados os anos em que o município quedou sem autonomia.

* Fonte: História de Coreaú. Leonardo Pildas. Fortaleza. 2003. pp. 235 e ss.  

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

FURTO X VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO



Na lição de Fernando Capez, se, após entrar na residência, o sujeito é surpreendido quando está começando a pegar algum objeto da casa, há furto tentado; no entanto, se ainda estava andando pela casa, antes de se apoderar de qualquer coisa, o fato ainda não se enquadra no furto, pois não houve ainda início de subtração, só respondendo o agente pela violação de domicílio (cf. Curso de Direito Penal, Parte Especial, vol. 2, Saraiva, 3ª Edição, p. 357).
Pelo princípio da culpabilidade, não tendo havido o início da execução do crime contra o patrimônio, ao menos com a individualização de uma coisa a ser subtraída, não há falar em furto, mas em violação de domicílio – simples ou qualificada –, haja vista que o mero ingresso na casa da vítima, mesmo durante a madrugada, pode até representar uma predisposição, mas não o início de execução – ataque à coisa alheia móvel – tendente a caracterizar o crime de furto.
Nesse sentido é a orientação dos Tribunais pátrios, do que posa de precedente o aresto a seguir transcrito:
APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO. ESCALADA. ATOS PREPARATÓRIOS.
O rompimento de obstáculo, a penetração, o ingresso do acusado na casa da vítima não são, por si sós, atos que se possam definir como de subtração, mas revelam, se tanto, "uma predisposição e não um efetivo ataque ao bem jurídico, razão pela qual não há falar em início de execução, impondo-se seja afastada a tentativa" (TACRIM-SP - AC 321.717 - Rel. Jarbas Mazzoni). DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE INVASÃO DE DOMICÍLIO. CONDENAÇÃO MANTIDA. "Para a caracterização do delito previsto no art. 150 do Código Penal, basta a intenção genérica do agente de entrar em habitação alheia, sabendo que procede ilegitimamente" (RT 474/340), subsistindo como crime autônomo "sempre que tal violação seja um fim em si, ou quando houver dúvida quanto ao verdadeiro propósito do agente" (RT 419/284). RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO.
(TJSC, Apelação Criminal n.º 98.014089-7, 2.ª Câmara Criminal, rel. Alvaro Wandelli, Itajaí, Julg. 15.12.1998)

O SERMÃO DO BOM LADRÃO



Padre Antônio Vieira (1608-1697), grande orador sacro e um dos ícones das Literaturas Brasileira e Portuguesa, com estilo Barroco, era inimigo dos corruptos. Apresentou-se, certa vez, diante de D. João IV e, com severas críticas, escancarou com a corrupção, através do "Sermão do bom ladrão", do qual esta passagem, a seguir transcrita, é memorável: "Não são só ladrões – diz o Santo – os que cortam bolsas ou espreitam os que vão banhar, para lhe colher a roupa; os ladrões que mais própria e dignamente merecem este título são aqueles a quem os reis encomendam os exércitos e legiões, ou o governo das províncias, ou a administração das cidades, os quais já com manha, já com força, roubam e despojam os pobres. Os outros ladrões roubam um homem; estes roubam cidades e reinos; os outros furtam debaixo de seu risco; estes, sem temor, nem perigo; os outros, se furtam, são enforcados; estes, furtam e enforcam (...)."
É incrível como, depois de passados estes séculos, o conteúdo do Sermão em comento encontra-se tão atualizado, tão próximo de nossa realidade, sobretudo na passagem "a administração das cidades", porquanto vemos, quase todo dia na imprensa cearense e nacional, notícias escandalosas de gestores municipais que, sem um pingo de escrúpulo, surrupiam o dinheiro destinado à população, roubando cidades, "despojando", destarte, os pobres.
Vale salientar, em tom de redundância, visto que todos sabem disso, que o prefeito de uma cidade é um ente público, exclusivamente público, para servir a todos indistintamente. Afinal, muito bem disse o Dr. Roberto Rosas, ex-ministro do TSE: "O mandato não pertence ao candidato, ao eleito, e sim ao partido, e este, à comunidade, à sociedade devidamente representada" (Revista In Verbis, IMB, n.º 16, ano 03, p. 36).
O político deve vestir a camisa da transparência, da dignidade moral. Será tão saudável para a alma de um ex-prefeito, quando estiver no fim da vida e, ao olhar para trás, ser capaz de dizer: "Vejam, caros amigos, aquelas obras, aquela escola, aquele hospital, praças, ruas, avenidas, creches, pontos de diversões, etc. etc., quem fez fui eu, na época em que eu era prefeito. Naquela época o povo era alfabetizado, o povo era educado, o povo era sadio, o povo vivia bem, porque eu tratava meu povo bem, tão bem que às vezes assim agia até em detrimento do meu próprio bem".
Os agentes políticos carecem de seriedade e de hombridade. Se os homens públicos que estão no poder, e que se acham o máximo, pensassem diferente, ou seja, pensassem a vida no seu lado humano, solidário, gente com fome, gente desempregada, gente sofrendo, gente chorando, gente morrendo, e pusessem em suas cabeças que ninguém leva nada materialmente para o túmulo, a não ser a carne, e que, aquilo conquistado por meios ilícitos nesta vida, é efêmero, com certeza teríamos uma visão mais nobre acerca de certos políticos.
Ninguém é dono do mundo, ao contrário, somos inquilinos. Nunca ouvimos falar de um ex-prefeito que agiu corruptamente e esteja bem hoje. Isso porque a indigestão do que eles comeram indevidamente (diga-se o fruto do roubo) foi tão grande, tão grande mesmo, que eles foram acometidos de uma "diarreia aguda", levando-os aos braços da "morte social". Caíram em ruínas, sozinhos, no ostracismo, amaldiçoados.
Roubar é um crime. Contudo quem rouba um povo, o galinheiro todo, sem dúvida, paga mais caro que aquele que rouba somente um homem, uma galinha.

Fernando Machado Albuquerque
Professor/Membro da APL

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

MANIA BESTA


"Pode-se atribuir à influência israelita muito do mercantilismo no caráter e nas tendências do português: mas também é justo que lhe atribuamos o excesso oposto: o bacharelismo. O legalismo. O misticismo jurídico. O próprio anel no dedo, com rubi ou esmeralda, do bacharel ou do doutor brasileiro, parece-nos reminiscência oriental, de sabor israelita. Outra reminiscência sefardínica: a mania dos óculos e do pincenê – usados também como sinal de sabedoria ou de requinte intelectual e científico. O abade de la Caille, que esteve no Rio de Janeiro em 1751, diz ter visto tudo o que era doutor ou bacharel em teologia, direito ou medicina de óculos no nariz 'pour se faire respecter des passants'. E a mania de sermos todos doutores em Portugal e sobretudo no Brasil – até os guarda-livros bacharéis em comércio, os agrônomos, os engenheiros, os veterinários – não será outra reminiscência sefardínica?" (Gilberto Freyre. Casa-Grande & Senzala)

A mania de sermos todos doutores ainda grassa entre nós como um mau vezo aristocrático absolutamente antiquado. Somos herdeiros do costume bacharelesco e formalístico de tratar por doutores os formados em Direito e em Medicina. É bem de ver, porém, que, em nossos dias, via de regra, o termo doutor não configura forma de tratamento, mas título acadêmico atribuído àqueles que alcançam o grau de doutorado. Numa época em que o ensino jurídico padece de notória banalização, urge que o tratamento de doutor aos bacharéis, para os que insistem em se agarrar à obsoleta tradição, ao menos seja empregado com comedimento, reservado a situação pertinente ao exercício profissional. No mais, especialmente no cotidiano, basta o tratamento de você ou senhor.
O anel de formatura é outra tradição já bastante esmaecida. Na lida jurídica, o anel não é mais praticamente observado, ressalvados casos raros de apego à ostentação.
A mania dos óculos – o pincenê se converteu em artigo de museu – como sinal de sabedoria ou de requinte intelectual e científico foi absolutamente ultrapassada pelo emprego dos óculos como artigo de saúde, de uso generalizado da população.
No Brasil moderno, ainda repleto de injustas contradições, mas assumidamente democrático, não deve haver brecha para vaidades discriminatórias, pessoais ou sociais. É preciso que deixemos de coisas – vanitas vanitatum, et omnia vanitas – e cuidemos da vida, granjeando respeito não pela ostentação cavilosa de títulos, anéis e óculos, mas pela efetiva valia do exercício dos nossos misteres.     

sábado, 9 de fevereiro de 2013

RÁPIDAS


FESTIVAL DE GUARAMIRANGA

Nada contra o Festival de Jazz e Blues de Guaramiranga, inegavelmente uma excelente alternativa à superficialidade musical do carnaval convencional dos últimos tempos. No entanto, não compreendemos a opção especificamente por jazz e blues, ritmos americanos, quando poderíamos priorizar estilos musicais dos nossos irmãos latinos, como a sofisticada havanera cubana e o mavioso tango argentino. Aliás, há tempos o poeta Belchior ensina que: "Um tango argentino me cai bem melhor que um blues (...)".  

DEFENSORIA DO TORCEDOR

O Juizado do Torcedor, previsto no art. 41-A, da Lei n.º 10.671/2003, é um plantão judiciário que está funcionando durante as partidas locais do Ceará e do Fortaleza – e funcionará nos jogos das Copas das Confederações e do Mundo – para a resolução de feitos criminais relativos a infrações de menor potencial ofensivo e delitos previstos no próprio Estatuto do Torcedor, além de causas cíveis de menor complexidade. O plantão conta com um juiz, um promotor e um defensor público, para a resolução célere, quase sempre imediata, das ocorrências cíveis e criminais.  

SECA NO MAR

A enorme seca que aflige o nordeste brasileiro não se limita ao território semiárido. O mar, paradoxalmente, também padece os efeitos da estiagem. Toda a fauna e a flora marinha da zona costeira depende dos nutrientes trazidos pelas águas que escorrem do continente para sobreviver. Com o gado morrendo no sertão e o peixe desaparecendo do mar, as evidências de mais um ano de seca anunciam uma perspectiva perturbadora para um povo já tão carente de tudo.    

IMAGENS DO CEARÁ - JERI



"Jeri is one of the 10 nicest beaches in the world..."


quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

SEGURO-DEFESO DA LAGOSTA



No período de defeso da lagosta, entre 1.º de dezembro e 31 de maio, com o afã de conciliar os interesses sociais, ambientais e econômicos, a Lei n.º 10.779/2003 assegura aos pescadores artesanais do crustáceo o seguro-desemprego. 
Por conta de um termo de cooperação técnica firmado entre a Defensoria Pública do Estado e o Ministério Público do Trabalho, perguntaram se eu poderia ficar encarregado pelo controle jurídico das habilitações no Município de Aracati. Ora, como neto, filho e irmão de pescador artesanal – não de lagosta, mas de cará, piaba e "suvela", nos açudes miúdos do Coreaú –, não pude resistir ao desafio.    
Com a solidariedade do competente estagiário Carlúcio Germano, na segunda-feira passada, das 8 horas da manhã às 8 horas da noite, recolhemos praticamente todas as habilitações dos cerca de 500 (quinhentos) pescadores artesanais de lagosta de Aracati, ressalvando-se algumas pendências a serem solucionadas paulatinamente. Nunca havia trabalhado tanto num único dia. Depois de intermináveis entrevistas e conferências documentais, saí exausto, mas sobremaneira gratificado pelo enorme alcance socioambiental do seguro-defeso, que garante, a um só tempo, a comida na mesa de centenas de famílias humildes e a reprodução da lagosta já tão escassa nos nossos verdes mares bravios. 
Pena que no semblante trigueiro daqueles lagosteiros sorridentes, marcados pela pesada lida, haja o testemunho de mais um gritante paradoxo do mundo capitalista. A lagosta, iguaria bastante apreciada mundo afora, deixa na sua origem um rastro de pobreza. É triste saber que o saboroso crustáceo, base de alguns dos principais pratos da alta culinária internacional, enriquece os donos de muitos restaurantes famosos; porém, continua deixando aqueles que arduamente o retiram do mar na dependência de um benefício social para sobreviver...  
De toda sorte, a despeito do paradoxo social, em matéria de lagosta, a mão calejada que pesca é mais sublime do que a boca refinada que come!

domingo, 3 de fevereiro de 2013

A ESCRITA SEM MITOS



Nas sociedades modernas, nas quais estamos inseridos, a escrita é imprescindível. A todo momento deparamos com textos escritos, tais como contos, crônicas, romances, poemas, nomes de ruas, jornais impressos, receitas médicas, nome de estabelecimentos comerciais, e-mails, nomes e dedicatórias em sepulturas etc.
Desde tempos imemoriais, a escrita tem alimentado a crença da superioridade cultural do povo que a emprega, sendo responsável pelo seu desenvolvimento político, social e também humano. Partindo dessa premissa, a "superioridade da escrita" adquiriu, especialmente na Grécia, outros enfoques: órgão responsável pela transcrição da fala; a superioridade do alfabeto, instrumento primordial do desenvolvimento cultural e científico; instrumento de desenvolvimento cognitivo, dentre outros.
No século XVIII, Gibbon afirmava que o: "uso de letras é a principal circunstância que distingue um povo civilizado de uma horda de selvagens, incapaz de conhecer e refletir". No entanto, a linguística moderna vem trazendo esclarecimentos acerca dessa suposta "supremacia da escrita", questionando se tudo não passaria de mitologia, na crença dessa superioridade, que passou ou passa a dominar nossa consciência comum.
Segundo os estudiosos, a escrita não constitui transcrição da fala, mas modelo para a própria fala, visto que os sistemas de escrita captam somente a forma verbal, deixando alguns outros elementos da comunicação subentendidos na fala. Ex: Na mensagem: "Estou tão feliz hoje!", dependendo da maneira, da entonação e da expressão facial de quem fala, haverá divergentes significados; tanto pode a pessoa estar literalmente feliz ou o contrário. A superioridade do alfabeto também tem sido questionada, por conta da sua utilidade limitada para representar uma língua monossilábica, como é o caso do chinês. Também foi reconhecido que as crianças orientais, em especial as japonesas, embora inseridas em culturas não alfabéticas, apresentam melhor desempenho na escrita do que as crianças ocidentais.
Nas últimas décadas, os antropólogos e historiadores forneceram informações concretas de que a cultura clássica grega era primordialmente dialética, ou seja, a linguagem e a argumentação orais eram utilizadas amplamente como instrumentos do conhecimento. Na era de Platão a escrita era muito limitada, não mais de dez por cento dos gregos sabiam ler e escrever. O desenvolvimento cognitivo, da mesma forma, não está limitado à escrita, pois se reconhece a alfabetização funcional, ou, mais precisamente, as formas de competência utilizadas para as atividades diárias que dependem tão somente das práticas particulares do indivíduo, em que não há utilização da escrita, como, p. ex., as habilidades de um operário de fábrica, da construção civil, de uma boa cozinheira, dentre outros.
Não obstante as informações e esclarecimentos em torno da problemática da escrita, é de fundamental importância o reconhecimento de que sua invenção foi e é por demais útil para a formação das sociedades clássicas e modernas. Graças à escrita, temos guardados tesouros em textos que repercutiram e repercutem no modo como vivemos hoje. Além disso, ela possibilita uma série de procedimentos para agir sobre a linguagem, como também pensar sobre ela, fato esse que contribui para podermos refletir e inclusive desmistificar a crença de sua superioridade.

Auricélia Fontenele
Da Pós-graduação em Português/Literatura

sábado, 2 de fevereiro de 2013

BEIJO DA MORTE



Sorve a quimera no escuro da noite;
Vagueia nas asas da efêmera ilusão;
Montado na fera, vibrando o açoite;
Tal qual o arauto de infernal legião.

Refém do desejo da pedra grotesca;
Delira no vício de ardente atração;
Esquivo saúda a paragem dantesca;
Na turva memória, ignóbil intensão.

 Rodeia o nirvana, envolto no fumo;
Enerva-se afoito em febril sensação;
Pragueja visagens, bodeja sem rumo;
Pervaga o universo deitado no chão.

 Fora tragado pelo beijo da morte;
Inerme cativo da doentia tentação;
Caíra no abismo da vida sem norte;
Mais um suicida com a vela na mão.

Eliton Meneses