A tipicidade formal é a adequação de uma conduta à descrição abstrata de um crime, ao passo que a tipicidade material analisa a lesividade da ação praticada pelo agente em face do bem jurídico protegido pelo Direito Penal. Assim, para se reputar delituoso um comportamento humano, além de subsumir-se a uma norma incriminadora (estar expressamente previsto em lei como crime), deve ele ter provocado ofensa relevante ou significativa ameaça de lesão ao bem jurídico tutelado. Ora, a conduta, v.g., de comercializar DVDs e CDs diversos, reproduzidos com violação de direito autoral, embora formalmente típica, não é antijurídica, numa ideia material da tipicidade penal.
Deveras, a compra-e-venda de DVDs e CDs falsificados é conduta flagrantemente aceita pela sociedade e, por dito motivo, insuscetível de coerção pela gravosa imposição de reprimenda criminal. Basta circular pelos centros comerciais de qualquer cidade deste País para deparar com milhares de pessoas comprando CDs e DVDs falsificados, às escancaras, sem qualquer receio de serem presas em flagrante delito. Em verdade, pode-se dizer que dificilmente um lar brasileiro ou um porta luvas de um automóvel não dispõe de algum DVD ou CD "pirateado", tamanha a proliferação da cultura da cópia não autorizada – inclusive por meio de "download" da internet –, nalguns casos até mesmo incentivada pelo titular dos direitos autorais, como algumas bandas de forró, que chegam a promover o sucesso de suas músicas com o "estouro" das vendas a preço irrisório dos seus CDs e DVDs "piratas", interessadas em contratações para a execução ao vivo nos eventos.
O princípio da intervenção mínima propõe ao ordenamento jurídico uma redução dos mecanismos punitivos do Estado ao mínimo necessário, somente se justificando a intervenção penal quando for inquestionavelmente indispensável à proteção dos cidadãos. Assim, o Direito Penal somente deve apenar as condutas mais graves e perigosas que lesem os bens jurídicos de maior relevância.
No mesmo passo, o princípio da adequação social foi desenvolvido sob a premissa de que uma conduta socialmente aceita ou adequada não deve ser reputada uma conduta criminosa. Trata-se de uma regra de hermenêutica tendente a viabilizar a exclusão da tipicidade de condutas que, mesmo formalmente típicas, não são objeto de reprovação social relevante, porque nitidamente toleradas.
Nesse sentido é a lição dos mestres criminalistas Zaffaroni e Pierangeli:
"(...) a tipicidade conglobante consiste na averiguação da proibição através da indagação do alcance proibitivo da norma, não considerada isoladamente, e sim conglobada na ordem normativa. A tipicidade conglobante é um corretivo da tipicidade legal, posto que pode excluir do âmbito do típico aquelas condutas que apenas aparentemente estão proibidas". (in Manual de Direito Penal Brasileiro, 2ª ed, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 461-463).
O princípio da intervenção mínima propõe ao ordenamento jurídico uma redução dos mecanismos punitivos do Estado ao mínimo necessário, somente se justificando a intervenção penal quando for inquestionavelmente indispensável à proteção dos cidadãos. Assim, o Direito Penal somente deve apenar as condutas mais graves e perigosas que lesem os bens jurídicos de maior relevância.
No mesmo passo, o princípio da adequação social foi desenvolvido sob a premissa de que uma conduta socialmente aceita ou adequada não deve ser reputada uma conduta criminosa. Trata-se de uma regra de hermenêutica tendente a viabilizar a exclusão da tipicidade de condutas que, mesmo formalmente típicas, não são objeto de reprovação social relevante, porque nitidamente toleradas.
Nesse sentido é a lição dos mestres criminalistas Zaffaroni e Pierangeli:
"(...) a tipicidade conglobante consiste na averiguação da proibição através da indagação do alcance proibitivo da norma, não considerada isoladamente, e sim conglobada na ordem normativa. A tipicidade conglobante é um corretivo da tipicidade legal, posto que pode excluir do âmbito do típico aquelas condutas que apenas aparentemente estão proibidas". (in Manual de Direito Penal Brasileiro, 2ª ed, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 461-463).
Olhos postos na tipicidade conglobante, o Estado não pode considerar típica uma conduta que é fomentada ou tolerada socialmente e inclusive pelo próprio Estado, de modo que o juízo de tipicidade deve ser concretizado de acordo com o sistema normativo considerado em sua globalidade. A tipicidade formal (descrição legal do fato típico) e tipicidade material (ofensividade da conduta ao bem juridicamente tutelado) devem sempre estar reunidas – tipicidade conglobante – para movimentar a reprimenda criminar. Na hipótese da venda de DVDs e CDs grosseiramente falsificados, conduta socialmente tolerada às escancaras, há mera tipicidade formal, insuscetível de movimentar, inclusive pelo princípio da intervenção mínima, o Direito Criminal, ultima ratio do ordenamento jurídico.
Tal entendimento encontra guarida na jurisprudência dos Tribunais pátrios, do que posam de precedentes os arestos a seguir transcritos:
EMENTA: VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORIA - VENDA DE CD E DVD PIRATAS - ABSOLVIÇÃO - ERRO DE TIPO - SENTENÇA MANTIDA. - Mantém-se a decisão do MM. Juiz que absolveu a ré que foi flagrada vendendo em seu estabelecimento comercial diversos CDs e DVDs reproduzidos com violação de direito autoral, cuja conduta, apesar de formalmente típica, não é antijurídica, numa idéia material da tipicidade penal. (TJMG, Ap. Crim. nº 1.0685.07.003798-9/001, 1ª Câmara Criminal, rel. Fernando Starling, DJ 10.06.2009)
"APELAÇÃO CRIMINAL - VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL - MODELO PENAL CONSTITUCIONAL - TAXATIVIDADE. A tutela penal dos direitos patrimoniais de autor fere o princípio constitucional da taxatividade e afronta a vedação à prisão por dívida. Absolvição dos acusados como solução da interpretação conforme a Constituição da República de 1988". (TJMG, Ap. Crim. nº 1.0080.05.001505-8/001, 5ª Câmara Criminal, rel. Alexandre Victor de Carvalho, DJ 30/08/2008).
No último precedente transcrito, o relator ressaltou em seu voto, a respeito da violação de direito autoral na venda de CDs e DVDs pirateados, que "a referida conduta é aceita e aprovada consensualmente pela sociedade e, portanto, despida de lesividade ao bem jurídico tutelado, constituindo-se num indiferente penal alcançado pelo princípio constitucional da Adequação Social", sublinhando, ainda, que "é preciso que o Judiciário Brasileiro esteja atento e contenha a sanha desatinada das políticas neoliberais, em que o Estado delega ao mercado a regulação social e este, mostrando a sua face mais obscura, se socorre do direito penal para legitimar a nova realidade".
Tal entendimento encontra guarida na jurisprudência dos Tribunais pátrios, do que posam de precedentes os arestos a seguir transcritos:
EMENTA: VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORIA - VENDA DE CD E DVD PIRATAS - ABSOLVIÇÃO - ERRO DE TIPO - SENTENÇA MANTIDA. - Mantém-se a decisão do MM. Juiz que absolveu a ré que foi flagrada vendendo em seu estabelecimento comercial diversos CDs e DVDs reproduzidos com violação de direito autoral, cuja conduta, apesar de formalmente típica, não é antijurídica, numa idéia material da tipicidade penal. (TJMG, Ap. Crim. nº 1.0685.07.003798-9/001, 1ª Câmara Criminal, rel. Fernando Starling, DJ 10.06.2009)
"APELAÇÃO CRIMINAL - VIOLAÇÃO DE DIREITO AUTORAL - MODELO PENAL CONSTITUCIONAL - TAXATIVIDADE. A tutela penal dos direitos patrimoniais de autor fere o princípio constitucional da taxatividade e afronta a vedação à prisão por dívida. Absolvição dos acusados como solução da interpretação conforme a Constituição da República de 1988". (TJMG, Ap. Crim. nº 1.0080.05.001505-8/001, 5ª Câmara Criminal, rel. Alexandre Victor de Carvalho, DJ 30/08/2008).
No último precedente transcrito, o relator ressaltou em seu voto, a respeito da violação de direito autoral na venda de CDs e DVDs pirateados, que "a referida conduta é aceita e aprovada consensualmente pela sociedade e, portanto, despida de lesividade ao bem jurídico tutelado, constituindo-se num indiferente penal alcançado pelo princípio constitucional da Adequação Social", sublinhando, ainda, que "é preciso que o Judiciário Brasileiro esteja atento e contenha a sanha desatinada das políticas neoliberais, em que o Estado delega ao mercado a regulação social e este, mostrando a sua face mais obscura, se socorre do direito penal para legitimar a nova realidade".
Francisco Eliton A Meneses
Defensor Público
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