domingo, 15 de junho de 2014

CHICA DO MOTA



Segundo os indícios mais convincentes transmitidos por quem viveu naquela região, pessoas idosas que souberam pela oralidade e pelas características físicas de sua descendência, somos levados a crer que Chica do Mota não era indígena, mas negra. Os relatos dos antigos fazem menção às festas religiosas e pagãs existentes na região do vale do Coreaú. Era costume que os coronéis das proximidades se juntassem com suas famílias em uma determinada fazenda de um colega e lá fizessem suas devoções ao passo que os negros que os acompanhavam festejavam as suas próprias divindades. 
Ora, sabemos de nossa origem e uma das cortes mais carolas era a de Portugal. Então nos períodos festivos os coronéis da região mandavam vir padres com frequência e aproveitavam as missas e novenas para se reunirem fazendo uma só festa na casa do "coronel da vez".
Certa feita, o "coronel da vez" anfitrião da festa foi Gabriel Anttunnes de Aguiar Aroeiras. Um homem solteiro e de meia idade que tinha deixado a morada do velho pai, José Rodrigues de Aguiar, nas margens do Itaquatiara, para tentar caminhar sozinho na região do Mota, onde estabeleceu sua feitoria. Lá se estabeleceu como negociante, muito provavelmente de escravos, e produtor rural.
Quando todos os proprietários das redondezas se reuniam, sempre traziam consigo seus servos para guiá-los pelos caminhos, cuidar dos mantimentos, e tratar das vestimentas da família. Nessas ocasiões sempre andavam com o comboio as neguinhas de casa que cuidavam das filhas das sinhás. Uma delas era Francisca, neta de um coronel da Serra da Meruoca, sendo filha do varão da família, que havia morrido em disputas de terra, e de uma escrava. O velho coronel serrano a pôs dentro de casa para zelar pelas suas outras netas.
Gabriel Anttunnes já se encontrava estabilizado financeiramente e era referência política e militar da região. Muitos dos outros senhores gostariam de ver suas filhas casadas com esse homem. Porém, Gabriel já havia feito uma jura de não se casar com moças ricas. Se um dia casasse iria escolher alguém sem posses para deixar suas riquezas.
Numa festa no Mota, Gabriel se engraçou de Chica e insistiu com a jovem até convencê-la a ficarem juntos. Ela de inicio não aceitou a proposta, por ser muito bem tratada na serra, mas com tantas promessas e tantas vantagens acabou se rendendo. O coronel serrano teve que se ausentar antes do fim das festividades. Uma parte dos negros do coronel ficaram para ajuntar todos os objetos e os negros que ainda festejavam, e depois seguirem o comboio. Quando tudo estava pronto para a partida do grupo remanescente, Chica disse que iria ficar. Foi aquele reboliço! Os escravos da serra não aceitaram e quiseram arrastá-la por medo do que iria acontecer se chegassem sem ela. Os escravos de Gabriel se armaram e de inicio ia-se montando uma confusão, mas como estavam em menor número desistiram. 
Quando subiram a serra foram recebidos por um coronel enfurecido. Ele ainda disse que ia descer até o Mota e trazê-la de volta para a serra, mas os escravos disseram que ela estava lá por sua própria vontade e, sabendo que seus homens não eram o bastante para enfrentar os do Mota, desistiu da ideia, embora nunca mais tenha pisado no sertão do Mota, tamanha a raiva que ficou.
Gabriel Anttunnes, então, casou-se com Chica, que agora era do Mota, e tiveram muito provavelmente três filhas, uma que se casou com Antônio Félix da Cunha; outra com um homem da família Dourado e outra com Tito Alves de Lima.

Xaxandre Pinto de Queiroz
Estudante de Direito

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