A PRESCRIÇÃO DA AÇÃO DE REPARAÇÃO CIVIL EM FACE DA FAZENDA PÚBLICA
A pretensão da reparação civil em face da Fazenda Pública submetia-se, como qualquer outra demanda condenatória, ao prazo prescricional de 05 (cinco) anos. No entanto, o novel Código Civil, em seu art. 206, § 3º, V, dispôs que prescreve em 03 (três) anos a pretensão da reparação civil. Ora, como, nos termos do art. 10 do Decreto nº. 20.910/32, a prescrição das pretensões formuladas contra a Fazenda Pública é quinquenal, ressalvados os casos em que a lei estabeleça prazos menores, os prazos prescricionais inferiores a 05 (cinco) anos beneficiam a Fazenda Pública.
Leonardo da Cunha sustenta que se aplica, na espécie, o disposto no art. 206, § 3º, V, do CC/2002, não apenas por conta do que estabelece o art. 10 do Decreto nº. 20.910/32, mas também por se tratar de norma ulterior, que revoga a anterior (lex posterior derogat lex prior), verbis:
"A legislação geral atual (Código Civil de 2002) passou a prever um prazo de prescrição de 3 (três) anos para as pretensões de reparação civil. Ora, se a finalidade das normas contidas no ordenamento jurídico é conferir um prazo menor à Fazenda Pública, não há razão para o prazo geral – aplicável a todos, indistintamente – ser inferior àquele outorgado às pessoas jurídicas de direito público. A estas deve ser aplicado, ao menos, o mesmo prazo, e não um superior, até mesmo em observância ao disposto no art. 10 do Decreto nº. 20.910/32". (Leonardo José Carneiro da Cunha. A Fazenda Pública em Juízo. 6ª edição. São Paulo: Dialética. 2008, p. 85)
Tal entendimento vinha encontrando guarida na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, com a ressalva somente dos casos de reparação de dano que envolvia relação de consumo em face de concessionária, cujo prazo continuava sendo de 05 (cinco) anos. Eis nesse sentido os precedentes a seguir transcritos:
"RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRISÃO INJUSTA. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. PRAZO PRESCRICIONAL. CONTAGEM. NOVO CÓDIGO CIVIL.
I. Trata-se de ação de indenização por danos morais, ajuizada contra a União, pelo fato de a autora haver sofrido prisão injusta decretada pela Justiça Federal. II. A teor do art. 2.028 do novo Codex, a lei anterior continuará a reger os prazos, quando se conjugarem os seguintes requisitos: houve redução pela nova lei e, na data de vigência do novo Código, já se houver esgotado mais da metade fixado pela nova lei revogada (Decreto nº 20.910/32, no caso). III – In casu, não foi observado o segundo requisito, porquanto entre a data do evento danoso (09.04.2002) e a vigência do novo Código Civil (janeiro/2003), transcorreu menos de 1 (um) ano, não chegando à metade do prazo anterior, ou seja, pelo menos dois anos e meio. Dessa forma, a contagem do prazo prescricional é a de 3 (três) anos, fixada pelo artigo 206, § 3º, V, do Codex, e deve ser contada a partir da vigência dele. Precedente citado: REsp nº 982.811/RR. Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 02.10.2008. IV – Recurso especial improvido."
(STJ, REsp 1.066.063/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe 17.11.2008)
"ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESCRIÇÃO. DECRETO Nº 20.910/32. ADVENTO DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. REDUÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL PARA TRÊS ANOS.
1. O legislador estatuiu a prescrição de cinco anos em benefício do Fisco e, com o manifesto objetivo de favorecer ainda mais os entes públicos, estipulou que, no caso da eventual existência de prazo prescricional menor a incidir em situações específicas, o prazo quinquenal seria afastado nesse particular. Inteligência do do art. 10 do Decreto nº 20.910/32.
2. O prazo prescricional de três anos relativo à pretensão de reparação civil – art. 206, § 3º, V, do Código Civil de 2002 – prevalece sobre o quinquênio previsto no art. 1º do Decreto nº 20.910/32.
3. Recurso especial provido."
(STJ, REsp 1.137.354/RJ, 2ª Turma, rel. Min. Castro Meira, DJe 18.09.2009)
No entanto, houve ulteriormente uma virada jurisprudencial no Superior Tribunal de Justiça, consolidando-se a orientação no sentido de que, em qualquer caso de reparação civil em face do Estado, o prazo prescricional a ser aplicado será de 5 anos, conforme prescreve o art. 1º do Decreto nº 20.910/32, afastando a aplicação do prazo prescricional do Código Civil.
"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. REINTEGRAÇÃO. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA. PRESCRIÇÃO. APLICABILIDADE DO DECRETO N. 20.910/32. PRECEDENTES.
1. A Primeira Seção, recentemente, dirimiu a controvérsia existente acerca do tema, firmando o entendimento de que as ações por responsabilidade civil contra o Estado prescrevem em cinco anos, nos termos do art. 1º do Decreto n. 20.910/32, "eis que o Código Civil disciplina o prazo prescricional para a pretensão de reparação civil, tratando-se, contudo, de diploma legislativo destinado a regular as relações entre particulares, não tendo invocação nas relações do Estado com o particular". Precedente: EREsp 1.081.885/RR, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Primeira Seção, DJe 01/02/2011.
2. Agravo regimental não provido."
(STJ, AgRg no AgRg no REsp 1233034/PR, 1ª Turma, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 31/05/2011)
"ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO NO ACÓRDÃO. DANOS MORAIS. PRAZO PRESCRICIONAL. ART. 1º DO DECRETO N. 20.910/1932. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA.
1. Conforme consignado na análise monocrática, inexistente a alegada violação do art. 535 do CPC pois a prestação jurisdicional foi dada na medida da pretensão deduzida.
2. A prescrição contra a Fazenda Pública é quinquenal, mesmo em ações indenizatórias, uma vez que é regida pelo Decreto n. 20.910/32. Portanto, não se aplica ao caso o art. 206, § 2º, do Código Civil. Precedentes.
3. "É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que a prescrição contra a Fazenda Pública, mesmo em ações indenizatórias, rege-se pelo Decreto 20.910/1932, que disciplina que o direito à reparação econômica prescreve em cinco anos da data da lesão ao patrimônio material ou imaterial." (AgRg no REsp 1106715/PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 3.5.2011, DJe 10.5.2011.
Agravo regimental improvido."
(STJ, AgRg no AREsp 32149/RJ, 2ª Turma, rel. Min. Humberto Martins, DJe 14/10/2011)
Assim, malgrado o entendimento doutrinário de que o novo Código Civil teria reduzido o prazo prescricional da ação de reparação civil em face da Fazenda Pública de 05 (cinco) para 03 (três) anos, que tecnicamente parece mais consoante com a hermenêutica jurídica, o Superior Tribunal de Justiça, órgão encarregado de uniformizar a jurisprudência acerca da matéria, findou pacificando a orientação de que, em qualquer caso, o prazo prescricional da ação de reparação de danos em face da Fazenda Pública opera em 05 (cinco) anos, nos termos do art. 10 do Decreto nº. 20.910/32.
Francisco Eliton A Meneses
Defensor Público