sábado, 1 de outubro de 2016

VÉSPERA DE ELEIÇÃO


Duas horas da madrugada, véspera de eleição, o candidato aparece no casebre no meio do nada.
– Ô, de casa!
Ninguém responde. O candidato insiste, bate palma, implora.
– Compadre, sou eu, o Vicente!
Depois de meia hora, finalmente um sinal de vida na casa.
– Apareceu, não é, compadre!? Depois de quatro anos é que apareceu! Não abro a porta para homem sem palavra.
– Que é isso, compadre?! Não me faça essa desfeita!
– Desfeita?! A desfeita quem fez foi o senhor!
– Ah, compadre, não diga isso! Não pense que esqueci a promessa da eleição passada!
– Não esqueceu? Pois o meu filho está aqui, quatro anos desempregado.
– Compadre, não é bem assim! Eu tinha um plano melhor para vocês.
– História de plano! Bastava o emprego do menino e pronto! Nosso voto o senhor não tem mais.
– Compadre, tenha calma, vou-lhe explicar o plano. Pensei assim, de que adiantaria um empreguinho de Prefeitura para o rapaz? A mixaria que ele ia ganhar não dava para pagar nem a caderneta da bodega e do bar. Depois de quatro anos, quando eu chegasse aqui, tenho certeza de que vocês não teriam guardado nem um conto de réis...
– Mesmo assim. O importante era cumprir a promessa!
– E cumpri. Cumpri de uma forma melhor do que o prometido.
– Não estou entendendo. O menino está aqui do meu lado, roncando, desempregado até hoje, e o senhor dizendo que cumpriu a promessa...
– Está desempregado, mas é como se estivesse empregado, compadre. O dinheiro do ordenado dele dos quatro anos, fui guardando, todo mês, sem precisar ele nem trabalhar, e está todo aqui, na minha mão; e eu vim hoje na sua casa não foi para pedir voto, mas só para entregar esse dinheiro todinho para o compadre e provar que eu sou é homem de palavra.
Dona Maria, que acompanhava atenta toda a conversa, tendo espiado pela brecha da janela e visto o maço de dinheiro na mão do candidato, quase deu uma agonia e repreendeu prontamente o marido ainda hesitante.
– Abre logo essa porta para o compadre, cabra sem-vergonha!

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