Marcus conheceu Verônica pouco antes de anunciarem a apresentação dela no palco. Antes de começar ela pediu ao cliente para observar algo de diferente no seu corpo.
Marcus atentou em cada detalhe no corpo da artista, mas a iluminação precária e a vista embaçada pelos tragos não lhe permitiram notar nada de diferente em Verônica.
Verônica marejou os olhos, apertou as mãos de Marcus e, soluçando, lhe deu um forte abraço.
– Você é um cliente muito incomum. Tome o meu celular. Ligue quando desejar.
Uma semana depois Marcus e Verônica caminhavam na areia da praia da Barra. Ela confidenciou-lhe a decisão de abortar. Era a regra da casa; se engravidar, rua. Não tinha como morar fora da boate. O namorado Júlio lhe dissera que não ia assumir um filho de duzentos pais. O patrão ficara de comprar o remédio no dia seguinte e a vida voltaria ao normal.
– Você não levaria a gravidez adiante, contra tudo e contra todos?
– Aquilo era sentimentalismo de uma personagem bêbada. Na vida real não uso máscara. Sou eu mesma, realista e decidida.
– Então, quem tomou a decisão de não abortar foi a personagem?
– E, então, percebeu?
– O quê?
– Que eu estou grávida!
– Grávida?
– Isso.
– Não!
Verônica pareceu ter uma vertigem e sentou ao lado do cliente. Depois de algum tempo de silêncio, Marcus perguntou-lhe:
– Por que você não sai dessa vida?
– Talvez porque goste. Talvez porque não consiga ser fiel. Talvez porque seja a minha sina. Não sei.
– Infidelidade não é motivo para ser puta.
– Para mim é um bom pretexto.
– Você sabe de quem é o filho?
– Do meu namorado. Um safado que não dá notícias desde que lhe falei da gravidez, mas vou levá-la adiante, contra tudo e contra todos.Verônica marejou os olhos, apertou as mãos de Marcus e, soluçando, lhe deu um forte abraço.
– Você é um cliente muito incomum. Tome o meu celular. Ligue quando desejar.
Uma semana depois Marcus e Verônica caminhavam na areia da praia da Barra. Ela confidenciou-lhe a decisão de abortar. Era a regra da casa; se engravidar, rua. Não tinha como morar fora da boate. O namorado Júlio lhe dissera que não ia assumir um filho de duzentos pais. O patrão ficara de comprar o remédio no dia seguinte e a vida voltaria ao normal.
– Você não levaria a gravidez adiante, contra tudo e contra todos?
– Aquilo era sentimentalismo de uma personagem bêbada. Na vida real não uso máscara. Sou eu mesma, realista e decidida.
– Então, quem tomou a decisão de não abortar foi a personagem?
– Foi.
– A personagem também se chama Verônica?
– A personagem é a Verônica; eu me chamo Maria Clara.
– O aborto vai ser de dia?
– Que diferença faz?
– Se for de noite garanto que a Verônica não irá permiti-lo.
– A Verônica só se manifesta enquanto estou trabalhando. Se for abortar à noite, estarei de folga.
– Você não vai conseguir se livrar tão facilmente da Verônica. Sinto isso no seu olhar.
– Você é um romântico; um religioso, talvez. O que eu tenho na barriga ainda é um girino. Sou dona do meu corpo!
– O que você tem na barriga é uma pessoa em formação, que depende, por enquanto, do seu corpo, mas não se confunde com ele. A Verônica sabe disso.
– A Verônica não sabe nada da vida!
– Acho que ela sabe mais do que a Maria Clara.
– Verônica é uma puta!
– Uma puta com sentimentos.
– Prefiro ser Maria Clara, realista e decidida.
– Verônica e Maria Clara são uma só pessoa. Se a Maria Clara fosse tão realista e decidida não teria dito ao namorado que estava grávida. Teria abortado sem que o dono da boate soubesse; não correria o risco de ser demitida.
– Não sei o que fazer. Estou desesperada. Ou tomo o remédio amanhã ou arrumo as malas. Não tenho para onde ir. Mamãe morreu há dois meses, depois de muitos anos de maus-tratos do meu pai, alcoólatra. Nem pude ir ao enterro, em Sobral.
– Quanto você precisa para largar a boate?
– Muito pouco. Algo para o aluguel de uma quitinete e um pouco mais para o sustento. Mas de onde vou tirar essa grana?
– Primeiro me responda: Com essa grana garantida, você arrumaria as malas?
– Arrumaria.
– Quem está falando é a Maria Clara ou a Verônica?
– Ambas carregam uma criança na barriga.
Terminada a relação, Maria Clara não aceitou o pagamento do encontro, mas dobrou, com cuidado, e pôs na bolsa o cheque de quinze mil reais para as despesas que teria em um ano fora da boate.
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