domingo, 6 de dezembro de 2015

BRASIL: ESTADO SOCIAL DE DIREITO


"Disse Engels que onde o poder do Estado num determinado país entra em contradição com o desenvolvimento econômico, a luta termina sempre com a derrocada do poder político. Eu diria que no caso específico do Brasil o axioma do colaborador de Marx – substituída a expressão desenvolvimento econômico por desenvolvimento social – cobrará um sentido de dramaticidade e advertência para definir com toda a clareza o momento histórico que o País atravessa.
Poderosas forças coligadas numa conspiração política contra o regime constitucional de 1988 intentam apoderar-se do aparelho estatal para introduzir retrocessos na lei maior e revogar importantes avanços sociais, fazendo assim inevitável um antagonismo fatal entre o Estado e a Sociedade.
Não resta dúvida que em determinados círculos das elites vinculadas a lideranças reacionárias está sendo programada a destruição do Estado social brasileiro.
Se isso acontecer será a perda de mais de cinquenta anos de esforços constitucionais para mitigar o quadro de injustiça provocado por uma desigualdade social que assombra o mundo e humilha a consciência desta Nação. Mas não acontecerá, se o Estado social for a própria Sociedade brasileira concentrada num pensamento de união e apoio a valores igualitários e humanistas que legitimam a presente Constituição do Brasil.
A Constituição de 1988 é basicamente em muitas de suas dimensões essenciais uma Constituição do Estado social. Portanto, os problemas constitucionais referentes a relações de poderes e exercício de direitos subjetivos têm que ser examinados e resolvidos à luz dos conceitos derivados daquela modalidade de ordenamento. Uma coisa é a Constituição do Estado liberal, outra a Constituição do Estado social. A primeira é uma Constituição antigoverno e anti-Estado; a segunda uma Constituição de valores refratários ao individualismo no Direito e ao absolutismo no Poder. (...)
Em se tratando de Estado social, concordamos, por inteiro, com Tomand e Franz Horner quando dizem que um dos mais graves problemas do Direito Constitucional decorre de que ele realiza os fins do Estado social de hoje com a técnica do Estado de Direito de ontem.
Mas o verdadeiro problema do Direito Constitucional de nossa época está, ao nosso ver, em como juridicizar o Estado social, como estabelecer e inaugurar novas técnicas ou institutos processuais para garantir os direitos sociais básicos, a fim de fazê-los efetivos.
Por esse aspecto muito avançou o Estado social da Carta de 1988, com o mandado de injunção, o mandado de segurança coletivo e a inconstitucionalidade por omissão. O Estado social brasileiro é portanto de terceira geração, em face desses aperfeiçoamentos: um Estado que não concede apenas direitos sociais básicos, mas os garante.
Até onde irá contudo na prática essa garantia, até onde haverá condições materiais propícias para traduzir em realidade o programa de direitos básicos formalmente postos na Constituição, não se pode dizer com certeza. É muito cedo para antecipar conclusões, mas não é tarde para asseverar que, pela latitude daqueles direitos e pela precariedade dos recursos estatais disponíveis, sobremodo limitados, já se armam os pressupostos de uma procelosa crise. Crise constitucional, que não é senão a própria crise constituinte do Estado e da Sociedade brasileira, na sua versão mais arrasadora e culminante desde que implantamos nesta País a república há cem anos."
(Paulo Bonavides. Curso de Direito Constitucional. Malheiros. 5.ª edição. 1994. São Paulo. pp. 336/338)

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