O sol acabava de raiar por detrás dos edifícios quando saíram como se não tivessem destino. Era a primeira viagem juntos. Não propriamente uma viagem, mas um bate-volta numa cidade próxima, com a sensação de uma viagem longa. Ela ia na direção, linda como nunca. Trouxera no veículo chocolate com recheio de cupuaçu e água. Andaram inebriados por caminhos sinuosos cruzando bosques, vilas e riachos, além de um sítio com ares de infância distante. Perderam-se, encontraram-se. Quase não havia nuvens no céu da linda manhã de dezembro. Pareciam numa outra dimensão, fora do tempo e do espaço. Um simples toque na mão deflagrava toda uma ebulição de bem-estar. Bastava um olhar para o mundo se encher de cores. Tudo entre eles se tornava superlativo. As cores pulsavam, a natureza cantava, o mundo se cobria de flores. Havia entre eles um mistério, um encanto, uma sensação de plenitude. Embora não acreditassem em alma gêmea, concordavam que eram o que havia de mais próximo ao mito criado por Platão. Enquanto o carro andava lento, entreolhavam-se com a impressão de que todo o universo estava em pleno equilíbrio. Pena que chegaram ao destino e foi necessária a separação. Contrariada, ela o deixou próximo a um ponto de táxi. Ele apanhou um mototáxi, pôs o capacete e se dirigiu à estação mais próxima do metrô. Os pensamentos de ambos continuaram um no outro. Ela tentou ligar para ele, mas o telefone estava no silencioso enquanto a moto seguia veloz. Logo que ele chegou na estação, atendeu a ligação. Ficaram questionando por que haviam se separado. Por que não almoçaram juntos? Coisas que acontecem, ruído de comunicação, poderiam almoçar agora, bastava voltar, pegar um mototáxi de volta. Não. Já não dava mais, o metrô acabara de sair da estação. Pararia na estação seguinte. Não. No meio da tarde se encontrariam. Matariam a saudade nem que fosse por uns quinze minutos. Passaria no seu bairro. Continuaram se falando até a estação de destino. Desde que se despediu dela, ficou meio perdido. Havia um gosto de quero mais. Subiu no Shopping para almoçar e, enquanto olhava os enfeites de Natal, recebeu uma mensagem dela dizendo que ele pegasse novamente o metrô e voltasse oito estações que ela passaria em uma hora para apanhá-lo. Assim, ganhariam tempo. Almoçou rápido, sem largar a lembrança de Natal que ela lhe havia dado, e correu para a estação do metrô. Chegou na oitava estação no preciso momento em que ela ligou e avisou que estava próxima. Encontraram-se novamente com um sorriso largo e lembraram dos filmes de véspera de Natal que passavam na televisão. Seguiram inebriados, como se o mundo fosse só deles, como se não houvesse mais nada, como se àqueles momentos juntos se resumisse toda a eternidade. Trocaram carícias, olhares encantados e abraços apertados. Ela viajaria naquele dia. Passariam alguns dias sem poderem se ver. Felizmente se reencontraram. O encontro da manhã não seria suficiente. Deixaria um vazio bastante incômodo. O reencontro da tarde saciou o desejo de se verem. Estavam felizes, mesmo não podendo passar o Natal juntos. Era o que tinha para hoje, para a véspera de Natal. Ela foi para o seu lado da cidade. Ele voltou a pé para casa. No caminho, de tão feliz, foi distribuindo o que tinha no bolso. Cinco reais para um moço na praça, dez reais para um garoto que vendia slime na porta de casa... Era véspera de Natal e caminhava radiante, pois o melhor que poderia acontecer naquele dia acabava de acontecer. Havia encontrado ela, encontrado e reencontrado, viajado e sido resgatado... Estava radiante. Aquela era a véspera de Natal mais marcante da sua vida.
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