Quando estava sóbrio, Jandaíra era tímido e acabrunhado. Andava calado, esquivo, um tanto sisudo. O difícil era encontrá-lo sóbrio... Seu último porre durou dois meses ininterruptos. Era torcedor do Botafogo, um dos únicos torcedores do alvinegro carioca na pacata vila da Palma; o Botafogo havia se sagrado campeão depois de vinte anos de jejum e não haveria pretexto melhor para cair na cachaça! Rodou então todos os bares da cidade numa euforia contagiante.
– Dá-lhe, dá-lhe, Fogão!! É Botafogo ou num é??
Com a mesma roupa, a camisa alvinegra desbotada, o calção rasgado, a chinela com um prego, seguia pelas ruas feito um louco para desespero de sua pobre mãe idosa. Dona Hilda procurava em vão acompanhá-lo. Pedia aos bodegueiros para não vender cachaça para o filho; nada obstante, nunca faltava cana no mercado.
Às vezes o alcançava e tentava convencê-lo a ir para casa, mas ele a cobria de ofensas.
– Sai daqui, Caninana! Vai-te embora, Satanás!
Dona Hilda voltava triste e preocupada para casa. O que faria com a pequena mercearia do filho? Fechada, as coisas vencendo, sem receber e sem pagar... O filho estava perdido no alcoolismo.
No final da segunda semana de embriaguez, Dona Hilda conseguiu finalmente levar o filho para casa. Ao chegar em casa, porém, Jandaíra foi recepcionado pela irmã na janela:
– Vai dormir, Papudim!!
Ferido nos seus brios etílicos, Jandaíra retrucou a ofensa:
– Vai-te embora, Santanás! Da fruta que eu gosto tu chupa até o caroço!!
A irmã não se conteve e bateu-lhe a porta na cara. Diante disso, Jandaíra deu meia volta e encontrou mais uma motivação para seguir sua cruzada etílica.
Jandaíra estava decrépito, magro, pálido, não dizia coisa com coisa. Dona Hilda continuava atrás dele, não desistia do filho, mesmo com as ofensas que sofria.
– Vai-te embora, Caninana! Tu quer é frescar!
Era tempo de eleição e um dos candidatos a prefeito viu em Jandaíra o entusiasmo que faltava ao seu eleitorado e fez dele um dos símbolos da sua campanha vitoriosa.
– Dá-lhe, dá-lhe Chico Bão!! É Chico Bão ou num é??
Passada a eleição, sem mais um tostão furado no bolso, Jandaíra começou a recobrar a sobriedade, não porque o quisesse, mas porque o político sumiu e os bares já não mais lhe vendiam fiado. Dona Hilda então o convenceu a voltar para casa e, como a irmã não estava, conseguiu entrar sem problema e deitar na rede já previamente armada para um sono profundo sem prazo determinado para despertar.
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