sexta-feira, 31 de março de 2017

SONETO XVII


Da estação lentamente parte o trem;
Hesitante procura outro destino,
Sob os olhos chorosos do menino, 
Que do amor proibido foi refém.

Da janela espia um certo alguém;
Um soluço despede um desatino;
 Um amor que brotara de inopino, 
Que ardia por ele, mais ninguém.

A semente de trigo está na terra;
Muito embora regada, infecunda,
Pela força das coisas que convêm. 

Não ousaram subir aquela serra;
Preferiram provar a dor profunda
A perder tudo aquilo que já têm. 

Eliton Meneses

NÃO IMPORTA ONDE, QUANDO OU O QUE... ESTUDE!


sábado, 25 de março de 2017

SONETO XVI


Descerás à cova de Montesinos;
Verás o cerne da maldade humana;
O badalo sombrio de uma campana;
Ficarás frente a frente de assassinos.

Ouvirás o cantar de peregrinos,
O profeta que guia a caravana,
 O destino nas cartas da cigana,
 O ocaso de errantes paladinos.

 Sentirás um bafejo congelante,
 O sussurro de um verso florentino,
Com esmero talhado em pedra bruta.

 Saberás nesta noite alucinante,
Através de um sábio clandestino,
A verdade que está fora da gruta. 
 
Eliton Meneses

quinta-feira, 23 de março de 2017

RIO COREAÚ




Rio Coreaú como nos velhos tempos. O meu quintal da infância. O meu eterno Ganges!

"(...) o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia." (Pessoa)

terça-feira, 21 de março de 2017

MORO


Moro é um juiz inquisidor. Um juiz medieval, que dispensa acusação e defesa. Um juiz autoritário que acha que o devido processo legal é o que lhe dá na cabeça. Um juiz com predisposição condenatória. Um juiz que esquece que a função de julgar, num Estado Democrático de Direito, nada tem a ver com a promoção da vingança estatal. Um juiz em que, como acusado, ninguém confiaria, ninguém, mesmo aqueles que ora, por conveniência, o idolatram.

domingo, 19 de março de 2017

REFLEXÃO


A vida é cheia de idas e vindas, camarada. Lembras-te de que ainda há pouco não te faltavas nada, até que o novo deu de aparecer, ocupar um espaço e, de repente, partir; agora estás aí pelos cantos inapetente, ruminando a falta, mas, logo, logo, despertarás com ânimo sereno e essa falta não passará de um filme recôndito na tua memória.
Foi a saudade do meio-irmão ao final daquelas férias; foi a saudade do passarinho que voou da gaiola; foi a saudade dela, que foi embora sem se despedir... A primeira vez passou; a segunda vez passou; a terceira vez passou; (...); sempre haverá de passar. O que é essencial não passa.

PETRARCA E LAURA










Soneto XXII

S'amor non è, che dunque è quel ch' io sento?
Ma s'egli è amor, per Dio, che cosa et quale?
Se bona, ond'è l'effectto aspro mortale?
Se ria, ond'è sì dolce ogni tormento?

S'a mia voglia ardo, ond'è 'l pianto e lamento?
S'a mal mio grado, il lamentar che vale?
O viva morte, o dilectoso male,
come puoi tanto in me, s'io no 'l consento?

Et s'io 'l consento, a gran torto mi doglio.
Fra sì contrari venti in frale barca
mi trovo in alto mar, senza governo,

sì lieve di saver, d'error sì carca,
ch'i' medesmo non so quel ch'io mi voglio;
e tremo a mezza state, ardendo il verno.

Francesco Petrarca

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Soneto XXII

Se amor não é, qual é este sentimento?
Mas se é amor, por Deus, que coisa e qual?
Se boa, por que tem ação mortal?
Se má, por que é tão doce o seu tormento?

Se eu ardo por querer, por que o lamento?
Se sem querer, o lamentar que val?
Ó viva morte, ó deleitoso mal,
Tanto podes sem meu consentimento.

E se eu consito sem razão pranteio.
A tão contrário vento em frágil barca,
Eu vou para o alto mar e sem governo.

É tão grave de erro, de ciência é parca,
Que eu mesmo não sei bem o que eu anseio
E tremo no verão e ardo no inverno.

Francesco Petrarca

sábado, 18 de março de 2017

BELLA


Chegarás na hora tarda
E dirás: Não estou pronto.
Sem saber baixaste a guarda;
Mesmo velho, ainda tonto.

Um correr na noite parda;
Uma história, meio conto;
Um querer que não aguarda;
Uma frase sem um ponto.

Tu soubeste do segredo,
Do afeto proibido,
Através dos lábios dela.

Desde então ficaste quedo,
Pelos cantos entretido,
Com os pensamentos nela.

Eliton Meneses

quinta-feira, 16 de março de 2017

O UNO, O BELO, O AMOR E A VIDA


"Sem ser o Belo, o Uno, pelo esplendor que irradia, dá forma de Belo às coisas que ilumina." (Plotino)

"Was aus Liebe getan wird, geschieht immer jenseits von Gut und Böse". (Nietzsche)

"Aquilo que se faz por amor está sempre além do bem e do mal." (Nietzsche)

"Life's but a walking shadow, a poor player
That struts and frets his hour upon the stage
And then is heard no more: (...)" (Shakespeare)

"A vida é uma sombra errante; um pobre comediante
Que se pavoneia no breve instante que lhe reserva a cena
E depois não é mais ouvido: (...)" (Shakespeare)

sábado, 11 de março de 2017

BRIGA


Teresa se foi 
Consuelo se foi
Na rua vazia
Ninguém mais briga
Ninguém mais para
Para ver a briga
Ambas se foram
Estão no jazigo
Os que ficaram
Não saem do abrigo
Ninguém aplaude
Ninguém instiga
O espetáculo 
Daquela briga
Na rua deserta
Fecharam uma casa
Na outra, aberta,
Não mora ninguém.

Eliton Meneses