Era o início dos idos dos anos da década de setenta do século XX, em que um menino, garoto que ajudava o pai na mercearia da família, o pequeno comerciante, teve a ideia de realizar minucioso levantamento nas cadernetas (do fiado), pois, apesar da tenra idade, já dominava com facilidade a leitura, a escrita e as quatro operações fundamentais da aritmética. Feito o apanhado nos livros, ficou bastante preocupado e pensou, vendo-se obrigado por dever de ofício e em defesa do próprio patrimônio, em alertar o seu genitor sobre a quantidade e os valores dos fiados registrados nas cadernetas, e alguns poucos relutantes clientes-credores que pagavam adiantamento, visando abater as dívidas ou mesmo renovar (zerar) o fornecimento. Mas tinha um, em especial, que chamou a sua atenção – o mau pagador –, pois fazia meses que só se fornecia sem nada pagar ou adiantar. E a conta do fiado só aumentando no caderno. Tomou, então, o menino, uma decisão: isso não podia continuar, precisava contar ao seu pai. Assim o fez.
Na primeira oportunidade em que se encontrara no comércio com o seu genitor, fez o levantamento e o relatório das cadernetas, coisa que não foi bem recebida pelo pai, que se admirou com tais preocupações e conclusões, pois, segundo ele, o fiado era necessário, fazia parte da cultura do comércio e que até ajudava na manutenção e sobrevivência do negócio.
O pequeno comerciante até entendeu as ponderações do seu pai, mas diante da realidade desfavorável ao empreendimento e o risco considerável de iminente prejuízo para a empresa familiar, tomou uma decisão drástica ali mesmo, na lata, na hora, e comunicou ao chefe da família: "Que a partir daquele instante, estando ele na mercearia, não seria fornecida qualquer mercadoria ou produto ao responsável pela dívida ou à sua família, cortando-se o fornecimento do mau pagador, salvo se dessem um bom adiantamento ou o pai o tirasse do comércio."
Mesmo o pai ficando meio contrariado, o pequeno comerciante cumpriu fielmente a sua decisão, e não mais recebera pedidos de fornecimento fiado da família do mau pagador, pelo menos no turno em que ficava tomando conta do estabelecimento.
Mesmo o pai ficando meio contrariado, o pequeno comerciante cumpriu fielmente a sua decisão, e não mais recebera pedidos de fornecimento fiado da família do mau pagador, pelo menos no turno em que ficava tomando conta do estabelecimento.
Não se tem conhecimento se o mau pagador honrou os seus compromissos financeiros e muito menos se ele passou a se fornecer em horário diverso em que o pequeno comerciante estava no batente da bodega, vez que logo ganhou o mundo para realizar seus sonhos..., que não o de ser comerciante, e conseguiu.
Moral da história: não brinque e não tente enganar uma criança letrada. Afinal, é o olho do dono que engorda a boiada, não é mesmo?!
Cosmo Carvalho
Engenheiro e Advogado
Um comentário:
Texto muito bom do conterrâneo Cosmo Carvalho!
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