"O diabo na rua, no meio do redemoinho..." (Guimarães Rosa)
Quando era menino em Coreaú, diziam que, se a gente ficasse de cabeça para baixo na frente de um redemoinho, via o cão dentro. Um dia resolvi fazer a experiência. Vi um redemoinho no campo de futebol do lado da barragem e plantei bananeira equilibrado num pilar. No começo não vi nada de estranho, apenas um redemoinho virado. Depois de um instante, bem no centro do redemoinho, consegui divisar uma silhueta disforme que um menino de dez anos acreditou ser o cão...
Muitos anos depois, um enorme redemoinho percorre o mundo. Um redemoinho que traga pessoas e não as devolve mais. Aos milhares, aos milhões. Inicialmente, números frios e distantes; aos poucos pessoas conhecidas, da sua rua, seus amigos, seus parentes... O artista, o militante, o médico... Tantos velhinhos morrendo antes do tempo, tantos jovens ainda tão cheios de vida! Falta ar nos pulmões, sobram lágrimas nos olhos. O que dizer para aquele menino de doze anos que perdeu o pai, o tio e o avô? Quem agora vai com ele no estádio?
O que dizer para aqueles que desdenham do cataclisma? O que dizer para aqueles que não se comovem diante da tragédia? O que dizer para aqueles que ainda não entenderam? Façam o seguinte: Fiquem de cabeça para baixo e encarem o redemoinho, o meio dele, lá vocês verão a silhueta estranha...
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