segunda-feira, 30 de novembro de 2015

ALTOS E BAIXOS


EM ALTA

A permanência dramática, mas também heroica do Ceará Sporting Club na Série B do Campeonato Brasileiro. Um clube que, na 30.ª rodada, estava com 98% de risco de rebaixamento conseguir escapar nas oito últimas rodadas é uma clara demonstração de força e superação. 

EM BAIXA

A morte trágica do pequeno Francisco Lucas, no Município de Coreaú, num ônibus escolar, ao que tudo indica, eivado de irregularidades. Até quando a desídia dos Poderes Públicos continuará favorecendo absurdos como esse? Até quando? 

EM ALTA 

A excelente gestão, que se encerra nesta semana, de Andrea Coelho à frente da Defensoria Pública do Estado do Ceará. São quatro anos que ficarão na história da instituição. 

EM BAIXA

A crise crônica da saúde pública no Brasil. Há muito tempo muitos pacientes só têm acesso a medicamentos e cirurgias por intermédio da Justiça. Abrem-se novos presídios com alguma frequência, mas novos hospitais muito raramente...

domingo, 29 de novembro de 2015

CRIME INAFIANÇÁVEL?


Um dos grandes dramas do Direito são os malabarismos interpretativos volta e meia empregados para atender a conveniências incompatíveis com o espírito do sistema jurídico. A Constituição Federal estabelece que "Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável” (CF/88, art. 53, § 2º). A prisão em flagrante do senador Delcídio Amaral foi justificado pelo ministro Teori Zavascki como crime permanente, no caso, fazer parte de crime organizado (da Petrobras – Lei 12.850/13, art. 2º). O crime permanente (que dura no tempo) realmente permite a prisão em flagrante em qualquer momento (CPP, arts. 302 e 303), não havendo nesse aspecto qualquer problema. No entanto, de acordo com a mesma Constituição Federal, são inafiançáveis os crimes de "tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem" (art. 5.º, inciso XLIII), bem como "a prática do racismo" (art. 5.º, inciso XLII) e "a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático" (artigo 5.º, inciso XLIV). A partir da Lei nº 12.403/11 (que ampliou as hipóteses de fiança para praticamente todos os crimes, ressalvados aqueles com vedação constitucional), o "fazer parte de crime organizado" não é crime inafiançável, não autorizando, portanto, a prisão em flagrante de um senador no exercício do mandato. E não é a citação de três ministros do STF no caso motivo suficiente para tornar inafiançável o crime e autorizar a prisão... Malabarismos interpretativos para atender conveniências de plantão são sempre reprováveis e prejudiciais ao regime democrático, não importando se o alvo seja um corrupto inveterado ou uma pessoa inocente, algo que só pode ser esclarecido depois do contraditório e da ampla defesa. Que sejam presos todos os corruptos, mas com o devido processo legal, sempre.

HOMENAGEM A FRANCISCO LUCAS


O pequeno estudante tinha um sonho, como qualquer criança de sua tenra idade. Brincar com os colegas e amigos, estudar, fazer os deveres de casa, ir à escola, etc... Para no futuro ser útil à sociedade, trabalhar e constituir sua própria família. Para a alegria e orgulho de seus pais e atendimento ao enunciado bíblico. Mas a insensatez humana lhe roubou o futuro. O presente não mais existe. Só restaram a saudade, a dor e as lembranças do passado tão curto, pois não lhe deram chance de ter o amanhã. Talvez o destino tenha a sua parcela de contribuição, por não se saberes os desígnios de Deus.
O fato é que naquele lindo dia de 19 de novembro (Dia da Bandeira) do ano de 2015, ao começo da bela manhã ensolarada na zona rural de Coreaú, sua mãe o embarcou no tal "ônibus escolar" para levá-lo à escola, como fazia todos os dias. O transporte estava sempre lotado de crianças, mas Lucas sequer chegou à escola, pois o caminho da escola foi tragicamente interrompido quando foi lançado para fora do veículo pelo para-brisa, jogado ao chão e com morte imediata, e tudo fruto do descaso e negligência do Poder Público. Lucas é mais um anjinho no Céu.
As Leis da Física (Lei da Quantidade de Movimento e a da Inércia) e o Diário do Nordeste não negam. Se o tal "ônibus escolar" tivesse os cintos de segurança nos bancos, certamente ele estaria vivo na casa dos seus pais. Mas não, é todo irregular: pneus carecas, ferrugem, extintor de incêndio ninguém sabe, sem identificação horizontal indicando transporte escolar, monitor responsável dentro do ônibus ninguém sabe, sem sinto de segurança nos bancos do velho e surrado veículo de mais de vinte anos de uso, além do motorista que não seria habilitado para dirigir o "Amarelão".
O pai de Lucas (Sr. José Francisco da Rocha) já havia reclamado e denunciado a gravidade do caso do veículo à diretora da Escola, mas nada foi feito e nenhuma providência foi tomada para amenizar ou resolver os graves problemas do transporte escolar daquela zona rural. E ninguém fez nada. E a tragédia anunciada, infelizmente, aconteceu.
E os órgãos fiscalizadores (Prefeitura Municipal de Coreaú/Secretaria Municipal de Educação, Ministério Público do Estado do Ceará, Defensoria Pública, Conselho Tutelar, TCM, TCE etc.), onde andavam e o que faziam, enquanto debaixo dos seus olhos e de suas narinas as Leis e as Normas pertinentes de transporte escolar eram permanente e diuturnamente afrontadas, violadas e desrespeitadas (CRFB/1988, CBT, ECA etc.), e nada era ou foi feito?! Pois se algo tivesse sido feito, não impediria de ocorrer o acidente (pois acidentes acontecem), mas a vida da criança não teria sido grotescamente sacrificada. E não foi por falta de aviso não. O pai de Lucas já havia reclamado e denunciado os graves problemas do ônibus à diretora da Escola e ao Jornal Diário do Nordeste fez e estampou uma extraordinária e completa reportagem especial com o título "(DES) CAMINHOS DA ESCOLA" nesse mesmo corrente ano de 2015, alertando e denunciando tudo e todas as irregularidades, e, mesmo assim, ninguém fez nada e nada foi feito para amenizar e/ou resolver os graves problemas, salvo uma operação policial noticiada naquele mesmo dia.
O desabado do pai de Lucas registrada na matéria do jornal, ao saber do trágico sinistro, é de sensibilizar e chocar qualquer pessoa, menos as insensíveis, e, ao que parece, de quem teria o dever de evitar que isso acontecesse, pois não há como não se indignar com a situação e com o ocorrido.
Se o Poder Público trata as crianças de hoje dessa maneira, como quererão que sejam os homens do amanhã?! 
Muito menos seremos uma "Pátria Educadora". 
Pêsames a família enlutada.

Cosmo Carvalho
Membro da APL

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

DESPEDIDA


Olha, não há mais luz à nossa volta!
A saudade se foi por uma porta;
De repente desfez-se a aliança.
O coração outrora em revolta
Era ilusão; agora, não se importa;
Quando desfeita está a confiança.
Alguém partiu mui triste sob escolta;
Um incêndio queimou a nossa horta,
Fazendo de um sonho só lembrança.
Não há mais entre nós reviravolta.
Errei ao caminhar por linha torta
E ao fazer de ti minha esperança.

Eliton Meneses

domingo, 22 de novembro de 2015

SARGENTO PINCEL


Sargento Pincel foi nomeado para comandar o destacamento militar da cidadezinha e, como se diz agora, tocou o terror entre a meninada. Com os adultos ele era um tanto condescendente, não costumava importunar arruaceiros, bêbados inoportunos, nem maridos violentos. O problema dele era com as crianças. Não podia flagrar um grupo delas, ou uma que fosse, se divertindo que apressava o passo enfurecido para estragar-lhes o prazer. Em regra, Pincel chegava abrupta e sorrateiramente, enxotava as crianças e tomava o brinquedo que julgava ilegal, normalmente bolas, bilas e tampas. 
– 'Bora todo mundo pra casa! 
Numa das celas da delegacia contaram-se para mais de seiscentas bolas. As bilas, tampas e demais apreensões ficavam no gabinete do próprio sargento. A maioria dos pais não se importava ou até aplaudia o rigor do Pincel; quem não concordava não ousava dizer nada. Alguns diziam que os meninos eram muito soltos, precisavam ter regras, como os pais eram frouxos, a polícia precisava controlar. Nessa época não havia direitos de criança, ou ao menos consciência deles.    
Sargento Pincel parecia onisciente, onipresente e onipotente. Onde quer que houvesse uma brincadeira de criança, logo chegava ele botando todo mundo pra correr.
– 'Bora todo mundo pra casa! 
Nos campinhos de futebol, levava as bolas e desfazia as traves; no jogo de bila, levava as bilas e tapava os buracos; no jogo de tampas, levava as tampas e apagava a marcação. Quando Pincel conseguia por a mão em algum menino, levava-o para casa pela orelha. Houve um que tentou se refugiar debaixo da cama de uma casa próxima e foi arrastado pelo pé... 
Na gata-da-turma da praça da Matriz, Pincel tentava, mas não conseguia intimidar a meninada. Logo que ia embora, reiniciavam a brincadeira, até o dia em que o sargento reuniu todos os policiais do destacamento e resolveu sitiar a praça.  
Depois de dois anos de atuação do sargento Pincel, a despeito de alguns focos de resistência, a vida da meninada, de modo geral, ficou bastante monótona, até os banhos de rio findaram proibidos. Quando se soube da transferência do sargento para outro destacamento, uma grande euforia tomou conta da cidade, até os pais respiraram aliviados. 
Dez anos depois, já mais velho e cansado, Pincel retornou à cidadezinha, mas não foi mais nem a sombra do que fora. A nova geração de meninos aplicava-lhe dribles desconcertantes, gritando: – Me pega, Pincel!; fazia-lhe caretas e até rebolava nele as bolas, bilas e tampas. A figura outrora monstruosa do sargento Pincel converteu-se ao final em algo folclórico. 
Quando, caminhando pela rua, o sargento percebeu que arrastava umas latas velhas por uma longa calda de barbante amarrada na alça traseira do seu uniforme, resolveu finalmente ir para a reserva.   

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

GENTILÂNDIA


Normalmente vivo por cá, espremido nesse canto de praça, como Deus tem permitido. Fui despejado do quarto onde morava quando as coisas pioraram e deixei atrasar o aluguel. A mulher não aguentou essa minha vida. Ganhou o mundo com os meninos. Nunca mais tive notícias deles. Não sinto mais saudade. Nessa vida a gente se acostuma com tudo. Essa minha vida é difícil de seguir. Arrumei um carrinho de reciclagem, um colchão velho, umas caixas de papelão, um cobertor, um prato e uma colher e me estabeleci nesta praça. A polícia às vezes aparece, faz uma vistoria, mas quando encontra alguma coisa digo que é para o consumo próprio e acaba me deixando em paz. A venda é muito pouca, a moçada da universidade não tem grana. Na sexta à noite, a galera entendida se reúne na praça e melhora um pouco o movimento. Afora isso, tenho que complementar o lucro escasso com a reciclagem e um tempo pastorando carros. 
A senhora idosa às vezes me traz um prato de comida, uns estudantes me dão um chocolate, um pessoal me traz uma camisa de partido...; vou assim tocando a vida, observando o movimento da praça. De manhã cedo chega a turma da caminhada, no fim de tarde a turma da academia da praça, no sábado os africanos jogam na quadra. Terça e quinta, sempre antes das seis, o pai e o menino de uns sete anos chegam para jogar. Penso em como andarão os meus. Admito que cometi muitos erros nessa vida. Quando quis me corrigir já era tarde. Não sei se tenho o que mereço. O certo é que as penas nunca correspondem às culpas.  
Vejo o olhar indiferente dos caminhantes, a cara de nojo de um jovem gordo, o desdém do dono da banca de revista. Quando Amanda aparece à noite, negocio meia hora com ela. Alguém disse que este país não pode dar certo porque, dentre outras coisas, puta se apaixona e traficante se vicia. Amanda, coitada, de tão viciada, mal se sustenta em pé. Também nunca me deu sequer um desconto pelos muitos galanteios que lhe faço. Quanto aos traficantes, ao menos os da praça, de fato, não apuram nem para sustentar o vício.  
Ando decrépito, sujo, maltrapilho e com poucos dentes. Os dois únicos amigos que me visitam são doidos varridos. Roberto, doido de nascença, e Nélson, endoidecido pela pedra. Roberto há poucos dias tentou afugentar, com um porrete, um casal lésbico que se beijava na praça, mas acabou no hospital depois de uma pedrada nas costas. Nélson fugiu de um abrigo ainda criança e resolveu morar nos arredores da praça. Diz que ficou perturbado depois de uma surra da polícia. Tem alguns intervalos de lucidez, vive da caridade alheia, dorme no jardim da casa do Roberto e não furta nada de ninguém.
O dono da banca não tem vida. Fica de domingo a domingo no batente. Abre cedo e fecha tarde. Dizem que possui várias casas alugadas. Nunca me deu um cigarro. Não queria a vida do dono da barraca. A turma que dorme na praça consegue ser mais feliz. Não precisamos de muita coisa para viver. O passado não se muda. No futuro talvez reúna forças para uma mudança. O dono da barraca me recrimina porque não sou igual a ele. Roberto diz sempre que há tempo de plantar e há tempo de colher. Nelson costuma dizer que não preciso mudar, porque em time que está ganhando não se mexe. 

domingo, 15 de novembro de 2015

CANTO PRA AVE DO NORTE


Uma ave nasceu entre Sobral e Coreaú.
Entre Coreaú e Sobral nasceu um canto…
Nem cotovia nem rouxinol.
Entre Sobral e Coreaú um conto se fez:
Poesia-canção,
Cantar pra contar que a estrela é diferente e fez o trigo aparecer.
Entre latino-americanos desse norte a melodia é estrela guia
Do Bel canto…
Belchior.

Gilmar Paiva
Sócio-correspondente da APL

MATERIALISMO


"Ao denunciarem a religião e a especulação metafísica, os materialistas desejavam mostrar à humanidade o caminho da ciência e da razão, que conduziria a uma espécie de paraíso terrestre. (...) Nesse aspecto, no entanto, todos eles estavam sujeitos a uma ilusão romântica. Embora seja verdade que uma atitude esclarecida perante a vida e seus problemas representa uma imensa ajuda para descobrir as medidas adequadas com que enfrentar as nossas dificuldades, é óbvio que não são deste mundo as soluções últimas e permanentes da totalidade dos nossos problemas." (História do Pensamento Ocidental. Bertrand Russell. Nova Fronteira. 2013. p. 363) 

sábado, 14 de novembro de 2015

GUERRA E PAZ



O sangue dos inocentes escorre num vale que nasce em Mariana, passa por Kobani, Baga e Paris e deságua no Curió
Nossa solidariedade a todos!

sábado, 7 de novembro de 2015

A POESIA

I.

A poesia é liberdade
Paz, justiça e união
A busca por igualdade
E um mundo em comunhão.

É a criatividade
Uma forma de oração
Que atravessa a finidade
Da terrena condição.

II.

Ó, senhora da beleza
E maestra das paixões
Insistente poesia
Que desarma a calmaria
E atropela os corações.

Ó, deusa da natureza
Vertedouro de emoções
Burilar de fantasia
Muito grata companhia
Presente em quatro estações.

III.

Aurora da inconsciência
Sem-sentido e alusão
À loucura e à transcendência
Do momento e da ilusão
Que persegue a existência
De um filho de Adão.

Mais sublime experiência
Água viva em profusão
O encontro na ausência
Cura da desilusão
A resposta da ciência
Quando falta a conclusão.

IV.

O templo dos pensadores
O refúgio dos amantes
A fuga dos sonhadores
O destino dos errantes
A bússola sem um norte
A vida chutando a morte
O sentindo dos instantes.

A musa dos trovadores
Duas violas cantantes
Três mecenas pagadores
Quatro rimas retumbantes
No balcão bela consorte
Coração batendo forte
Em desejos lancinantes.

V.

Ritual de assunção
Para a pura abstração
Fantasia e ilusão
O retrato mais fiel
Da alma dos desvairados
Dos loucos apaixonados
Teus contornos encantados
Aprisionam o menestrel.

Reduto de inspiração
Terna rima da canção
Protesto e libertação
Voz roufenha do cordel
Dois amigos embalados
Noite e dia enluarados
Ambos tão atribulados
Pondo oitavas no papel.

VI.

É a lente sobre o mundo
Que o homem utiliza
Pela qual visualiza
O acaso e o profundo
Do que não sabe entender
Do mistério que há de ser
Ao fazer de cada ato
Marca sua, autorretrato
No que a vida lhe ceder.

Redenção do moribundo
Que a beleza sintetiza
Em seu veio profetiza
O ocaso e o fecundo
Nos liberta sem querer
Das aparências do ter
Nesse tempo tão ingrato
Desfazendo vezo inato
De um tosco proceder.

VII.

O furor do sentimento
Um buraco na razão
Atropelo de paixão
Que atesta o movimento
De comum alumbramento
Frente ao Desconhecido
Intervalo indefinido
Entre a dor e o prazer
Entre a morte e o viver
Tradução do sem sentido.

Um ardor mui virulento
Que corrói o coração
Há quem julgue ilusão
Do maior contentamento
Um sutil deslumbramento
Num rompante traduzido
Um padecer esquecido
Ao lembrar do bem-querer
Faz a noite alvorecer
Um poeta entristecido.

Benedito Gomes Rodrigues e Eliton Meneses